quinta-feira, abril 27, 2006

Aqui fica, tirem as vossas conclusões

O arquivamento de parte do processo vulgarmente conhecido como "Apito Dourado" relativo ao jogo entre o FC Porto e o Estrela da Amadora, de 24 de Janeiro de 2004, foi um triunfo pessoal de Pinto da Costa, mas também de Adelino Caldeira, dirigente do FC Porto, membro do departamento jurídico do clube e responsável pela organização do processo.
Os factos apurados, em síntese, são os seguintes:
No dia do jogo, às 12 horas, 58 minutos e 27 segundos, o árbitro Jacinto Paixão telefonou para o empresário de futebol António Araújo e terão conversado (possivelmente na sequência de outras conversas) acerca da diversão projectada para a próxima noite e que passava pelos "serviços" de três prostitutas (...).
E isto porque em conversa telefónica (escutada e transcrita) iniciada imediatamente a seguir por António Araújo, às 13 horas, 0 minutos e 43 segundos, estabelecida com o arguido Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do FC Porto, António Araújo informa-o que tinham pedido "fruta para logo à noite", "fruta de dormir". (...)
Foi ainda possível apurar que terminada a partida, a equipa de arbitragem foi jantar a uma marisqueira em Matosinhos. A refeição ter-se-á prolongado até depois da meia-noite.
No mesmo restaurante também jantou a equipa de arbitragem do jogo Taipas-FC Porto B (realizado a 25-01-2004). Esta equipa de arbitragem da 2ª categoria (liderada pelo árbitro Paulo Silva, da Associação de Futebol do Algarve) estava acompanhada de António Garrido, assessor de árbitros da FPF.
Ouvidos os árbitros assistentes, Vítor Andrade e Filipe Pereira referiram que foram assistir ao FC Porto-Estrela da Amadora, juntamente com o árbitro Paulo Silva. Terminado o jogo, dirigiram-se para um restaurante em Matosinhos, na companhia do assessor António Garrido e da sua esposa, onde jantaram. Durante esse jantar, apareceu o dirigente Reinaldo Teles, que os cumprimentou. Segundo as declarações destes árbitros, Reinaldo Teles estaria a jantar com o trio de arbitragem do jogo FC Porto-Estrela da Amadora.
Afirmaram ainda ter visto o arguido Jorge Nuno Pinto da Costa junto à mesa onde estava a jantar Reinaldo Teles e a equipa de arbitragem liderada por Jacinto Paixão.
Encontra-se apreendido um documento relativo a movimentos/pagamentos com o cartão visa distribuído pelo FC Porto a Jorge Nuno Pinto da Costa.
No dia 25/01/2004 encontra-se registada uma despesa no valor de apenas 56, 95 euros, no restaurante A Marisqueira de Matosinhos.
(...) Por indicação de Cláudia Gomes, cerca da meia-noite, na boite "Golden" o António Araújo abordou três raparigas que aceitaram ir a uma "festa de amigos".
(...) O António Araújo e as três raparigas acabaram por esperar cerca de uma hora pela chegada de Jacinto Paixão, José Chilrito e Manuel Quadrado. Durante esse espaço de tempo o António Araújo pagou a cada uma das raparigas a quantia de 150 euros.
(...) Os três elementos da equipa de arbitragem (Jacinto Paixão, José Chilrito e Manuel Quadrado) dispuseram-se a prestar declarações nos respectivos interrogatórios judiciais.
No âmbito dessas diligências, assumiram determinados factos de entre os que lhe vinham imputados e negaram peremptoriamente outros.
Reconheceram ter estado com prostitutas a seguir ao jogo do FC Porto com o Estrela da Amadora, refutando ao invés todos os factos relacionados com a prática de concretos actos de favorecimento do FC Porto a pedido do seu presidente Pinto da Costa e ainda contrapartidas recebidas e/ou a receber, incapazes de relacionar os serviços sexuais prestados por prostitutas e eventuais favorecimentos ao FC Porto no decorrer do jogo.
O arguido António Araújo ouvido em interrogatório judicial, declarou ser sócio do FC porto e ter negócios de jogadores com este clube.
Mais declarou que foi a pedido do árbitro Luís Lameira para arranjar aquelas companhias aos árbitros arguidos. Nega a participação em actos de favor de arbitragem ao FC Porto.
Luís Lameira confirmou ter sido ele quem sugeriu/ofereceu a Jacinto Paixão os "bons serviços" de António Araújo (com vista a arranjar três raparigas), dentro da amizade que existe entre si e o empresário António Araújo.
Quanto ao arguido Jorge Nuno Pinto da Costa pode dizer-se que as suas declarações foram no sentido de apresentar outro contexto para a conversa telefónica que manteve com António Araújo.
As siglas JP são as iniciais de Joaquim Pinheiro, um amigo de Araújo que ia ter consigo ao estádio nesse dia para ver o jogo e para quem julgou ser a companhia feminina.
A expressão "fruta" é utilizada pelo Araújo quando fala de dinheiro e entendeu inicialmente que insistia (uma vez mais) pelo pagamento de transferências de jogadores que o FC Porto lhe devia.
A prestação da equipa de arbitragem no jogo merece-lhe críticas por entender que o FC Porto foi prejudicado. Na sequência de visionamento de uma gravação do jogo FC Porto-Estrela da Amadora, fez-se constar dos autos que a equipa de arbitragem cometeu vários erros, fundamentalmente em benefício do FCP, mas a tal "perícia" sobrepõe-se obviamente aquela que consta do Relatório de Peritagem dos conceituados ex-árbitros Vítor Manuel Melo Pereira, Jorge Emanuel Monteiro Coroado e Adelino Freitas Antunes, a saber:
Primeira parte
1. O jogador nº 8 do Porto entra em tackle frontal sobre o seu adversário nº 4. O jogador devia ter sido punido com advertência por "entrada perigosa pondo em risco a integridade física de um adversário" e a sua equipa punida com um pontapé livre directo.
2. Bola lançada em profundidade para o jogador nº 18 do Amadora, que corre na direcção da baliza do Porto, em ataque que se afigura prometedor. Ao passar por um jogador do Porto, cai, ficando a dúvida se foi ou não tocado pelo adversário. Já a repetição do lance, registo de cassete 00.19.09.17, as dúvidas foram dissipadas, pois apercebe-se que o jogador do Porto utiliza a perna esquerda para tocar o adversário. Falta enquadrada na Lei 12, sendo punida com um pontapé livre directo e consequente advertência por "comportamento antidesportivo", ao ter cortado em falta "um ataque prometedor da equipa adversária".
3. Decisão correcta ao considerar que a falta praticada por um jogador do Amadora foi fora da sua área de grande penalidade. Faltou a exibição do cartão amarelo a Jordão por ter agarrado ostensivamente a camisola do adversário "cortando um ataque prometedor". Na marcação do livre directo, o jogador do Amadora adianta-se antes de a bola ter sido posta em jogo e intercepta-a. O árbitro deveria ter interrompido o jogo, ter advertido o jogador de acordo com a Lei 12, sanções disciplinares, faltas passíveis de advertência: árbitro no mesmo lance cometeu dois erros, um de índole técnica e outro disciplinar.
Segunda parte
4. o jogador nº 26 do Amadora agarrou ostensivamente um adversário pelo pescoço. O árbitro (e bem!) puniu a equipa do infractor com pontapé livre directo. Faltou advertir (com cartão amarelo) o nº 26 do Amadora por "comportamento antidesportivo".
5. O árbitro assistente nº 1 assinala erradamente fora-de-jogo ao jogador nº 77 do Porto.
Mais tarde, ouvidos em declarações, os senhores peritos admitem, depois de revisionar o jogo, que ao minuto 14 o jogador Paulo Ferreira, do FC Porto, terá feito falta sobre Semedo.
(...) Os ofertados momentos de convívio íntimo não podem nem se conseguem relacionar com a actuação do árbitro e árbitros auxiliares no jogo FC Porto-Estrela da Amadora.
Estamos em crer que os árbitros arguidos queriam apenas que António Araújo, conhecido nos meandros do futebol pelas animadas noitadas, lhes arranjasse companhia.
Em momento algum se conclui que tenham mercadejado a sua função de árbitro ou que tal lhes foi solicitado por António Araújo ou pelo FC Porto.
Não se estabelece, assim, o necessário nexo de causalidade entre os proporcionados momentos de prazer ao trio de arbitragem, cujo pagamento é feito por António Araújo (e não se prova que qualquer dirigente do FC Porto tenha solicitado favores), e qualquer contrapartida de desvirtuamento da verdade desportiva, antes, durante ou depois da data do jogo.
(...) Quanto ao possível pagamento de um jantar à equipa de arbitragem do FC Porto-Estrela da Amadora, depois de disputado o jogo, inexistem provas testemunhais e/ou documentais quanto à identidade do ofertante ou ofertantes, para além da mera dedução, sendo facto que essa situação não nos merece outros comentários para além do que já dissemos a propósito do grau de certeza e segurança das provas que julgamos necessárias à propalação de acusação.

1 comentário:

Vermelho disse...

caro Vicente:
Como ontem, aqui deixei expresso, por razões éticas e deontológicas, não me pronunciarei sobre o despacho de arquivamento proferido.
Em todo o caso, procurando satisfazer as suas dúvidas, dir-lhe-ei que o processo foi arquivado pelo Magistrado do Ministério Público titular do inquérito, por não terem sido recolhido indicios suficientes da alegada corrupção sobre a equipa de arbitragem do jogo de futebol em análise.
Assim, Pinto da Costa não será sujeito a julgamento.
Abraço.