terça-feira, novembro 29, 2005

As mulheres e os Tribunais

E pensar que o Salazar as proibiu de aceder á Magistratura por serem demasiado sensíveis
Segue cópia da notícia do DN-

Elas são o grupo social que após o 25 de Abril melhor aproveitou a escola enquanto veículo de mobilidade social", afirma Boaventura Sousa Santos.
O número de mulheres na magistratura portuguesa está a aumentar de forma imparável. São, desde 2004, maioritárias nos tribunais de primeira instância e aproximam- -se já da meia centena nos tribunais da Relação (ver infografia). Mas é na escola que selecciona e prepara os licenciados em Direito para o exercício da magistratura - o Centro de Estudos Judiciais (CEJ) - que nos últimos dez anos esta tendência tem vindo a acentuar-se para este ano lectivo 2005- -2006 entraram quase 80% de auditoras, para apenas 20% de auditores. Uma relação de quatro mulheres para cada homem - sendo que a história do CEJ mostra que elas têm uma taxa de sucesso ligeiramente superior à dos homens.
"A feminilização da judicatura é um dado adquirido e incontornável", constata Paulo Guerra, juiz- -secretário do Conselho Superior da Magistratura. Para ele, este aumento do número de mulheres "não tem qualquer outra consequência natural senão aquela que decorre do exclusivo dom de gerar vida por parte das senhoras juízas, o que acarreta, como é óbvio, uma pausa no serviço forense (...) por licença de maternidade".
Rogério Alves, bastonário da Ordem dos Advogados, afirma que ninguém se deve preocupar com esta evolução "Já vivemos com uma magistratura exclusivamente masculina; funcionamos agora com uma magistratura em que o número de homens e de mulheres é equilibrado; a seguir teremos uma magistratura predominantemente feminina: não creio que isso seja relevante para a forma como a justiça vai ser feita." Outra Sensibilidade.
Segundo o jurista e sociólogo Boaventura de Sousa Santos, responsável do Observatório de Justiça, a tremenda hegemonia das mulheres na escola de magistrados é o reflexo de uma tendência geral na sociedade portuguesa "À excepção de pouquíssimos cursos, a maioria dos estudantes universitários são mulheres", recorda. "Elas são o grupo social que depois do 25 de Abril melhor aproveitou a democratização do ensino e a escola enquanto veículo de mobilidade social." Boaventura sublinha que a população feminina luta ainda em Portugal com uma organização muito patriarcal da sociedade, com preconceitos e inércias ainda não há salários iguais (em média, no sector privado, as mulheres ganham 75% dos salários masculinos quando desempenham as mesmas tarefas), as oportunidades profissionais não são as mesmas. "É natural que as mulheres aproveitem as competições em que estão mais em igualdade de circunstâncias, como a escola e os serviços públicos, para se distinguirem".Num inquérito aos portugueses sobre crimes sexuais encontrou-se nas mulheres - embora os resultados não sejam inequívocos - posições mais favoráveis às vítimas dos crimes de assédio, abuso e violação. Significará isso que um aumento do número de magistradas levará a uma diferente aplicação da lei? "É muito difícil responder à pergunta", confessa Boaventura de Sousa Santos. "Uma coisa é ter uma sensibilidade diferente para as matérias, outra é esperar que essa sensibilidade se instale na nossa jurisprudência." Fazer hoje esse prognóstico seria, para ele, "pura especulação". Mais produtivas. António Cluny, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), também concede que não haja uma grande diferença entre o tipo de justiça produzido por homens e por mulheres "Não se nota no sentido das decisões", refere. Mas é o primeiro admitir algumas vantagens femininas: "Eu acho que as mulheres são mais produtivas. Têm, em termos estatísticos, ritmos de trabalho mais constantes e mais produtivos."O que António Cluny ainda não observou até agora foram mudanças de comportamento no meio judicial. "Enquanto nas forças policiais o aumento de mulheres alterou bastante o ambiente e o próprio modo de funcionamento das esquadras, eu não noto essa mudança nos tribunais", observa, acrescentando logo a seguir que a taxa de feminização da justiça deveria fazer pensar em diferentes formas de funcionamento dos tribunais, com horários mais adequados à maioria dos seus trabalhadores (trabalhadoras, neste caso) e aos papéis familiares que estas desempenham.E quanto à tão reclamada proximidade da justiça dos cidadãos o aumento de mulheres tornou o conjunto dos magistrados mais disponível para o atendimento ao público? O presidente do SMMP não acha: "Talvez devido às tarefas que impendem sobre eles, creio que sucede exactamente o contrário. Mas não consigo determinar se o aumento das mulheres tem alguma coisa a ver com isso, não tenho a certeza..." O que Cluny sabe é que "hoje está a perder-se muito a cultura de ligação dos magistrados ao público, aos cidadãos". Mais, acrescenta: "Corremos o risco de ter magistrados que produzem muito papel mas que percebem pouco o que se passa à sua volta!" Rogério Alves, bastonário dos Advogados, concorda com ele "Mais importante do que saber se são homens ou mulheres é, juntamente com uma boa preparação técnica, adicionarmos outra preparação com mais elementos de ordem prática e de conhecimento da realidade." Segundo Rogério Alves, a formação dos magistrados deveria também incluir períodos de estágio em escritórios de advogados e em empresas.

1 comentário:

Anónimo disse...

Acho que já consegui entrar na engrenagem (dos comentários).
Antes de mais, quero felicitar o autor do blog pela iniciativa e pela produtividade que demonstra, não só nesta matéria dos blogs como em muitas mais áreas da sua vida.
Os temas trazidos a debate revelam inegável interesse (que pode ter mais interesse que futebol e política? Só faltam as mulheres!!) e forma como discorre sobre os mesmos demonstram a forma aberta, arejada, inteligente e moderna como sabe estar na vida.
Apelo aos seus verdadeiros amigos a mostrarem o seu interesse por este fantástico blog, fazendo os pertinentes comentários.