quarta-feira, março 04, 2009

Livro de Reclamações - Salários em Atraso e Inovações na Arbitragem

1 - "O presidente do Sindicato prognostica que Estrela da Amadora, Vitória de Setúbal e Boavista, vão acabar no final da presente temporada." - in Rádio Renascença.
Esta será, talvez, a primeira sentença de morte do futebol português proferida com desassombro, mas com uma elevada dose de realismo.
Infelizmente, dirão alguns.
Felizmente, direi eu.
O actual estado de coisas é, absolutamente, insustentável.
Urge expurgar das competições profissionais aqueles clubes que, sucessiva e reiteradamente, se revelam incapazes de cumprir as suas obrigações salariais e/ou fiscais.
É a chamada "ventilação assistida".
Quem não apresenta viabilidade financeira não pode sobreviver à conta de expedientes regulamentares, melhor ou pior urdidos.

2 - Os incumprimentos salariais ofendem a verdade desportiva e fazem perigar a sã e leal concorrência entre os diferentes competidores.
Esta temporada a profusão de clubes incumpridores impõe, mais do que nunca, a tomada de medidas.
No ano passado, de uma forma completamente oportunista, vozes houve que se ergueram clamando que os clubes relapsos relativamente às remunerações dos seus profissionais de futebol, deviam ser punidos com a despromoção!

3 - Mas, alguém, para lá destes gritos mudos de ocasião, se preocupou em tipificar tal comportamento como infracção disciplinar?
Ninguém!
Perante o pretenso caldo de insatisfação popular artificialmente criado no ano passado, mais rápido do que a própria sombra, Hermínio Loureiro prometeu elaborar uma proposta de alteração aos regulamentos contemplando a punição dos clubes que não cumpram com as suas obrigações salariais.
Fê-lo?
Obviamente, que não!

4 - E porquê?
Porque os regulamentos da Liga se assumem como um sistema de auto-regulação e, como diz o povo e com razão, quem tem cú, tem medo!
O Regulamento Disciplinar da Liga sistematiza um conjunto de salvaguardas para os clubes, das quais estes não cogitam sequer abdicar.

5 - Hermínio Loureiro, como homem de consensos que é, leia-se político na mais abjecta acepção do termo, anunciou que o incumprimento seria aferido no início de cada época desportiva, numa solução que se aproximava do licenciamento, e que a sanção prevista para os prevaricadores seria a despromoção.
Sucede, porém, que acossado por uma larga franja dos seus apoiantes, recuou nos seus propósitos e abdicou da despromoção em favor da perda de pontos.
Mas, mesmo esta solução conheceu letra de lei?
Não!

6 - A criação de um tipo disciplinar punindo as situações de incumprimento salarial com despromoção parecia-me uma solução adequada à gravidade do problema e às suas implicações na lisura da competição.
Não um mero incumprimento, mas um incumprimento reiterado e sindicado ao longo da temporada.
Verificado que fosse o incumprimento por 2 ou mais meses ou 3 incumprimentos por período inferior, o clube faltoso seria, automaticamente, despromovido.
Esta arquitectura típica pressuporia uma monitorização trimestral da fiscalização dos cumprimentos salariais e não uma avaliação "post-morten" como sustentava o Presidente da Liga.
A averiguação no início de cada época desportiva premeia os incumpridores e não responde às exigências de verdade desportiva e de sã e leal concorrência entre os diferentes competidores que um tipo disciplinar punindo as situações de incumprimento salarial visa acautelar.
Na verdade, ao optar-se por uma solução desta natureza permitir-se-ia aos clubes incorrerem em situações de incumprimento das obrigações salariais durante a temporada sem daí decorrerem quaisquer sanções.
Bastar-lhes-ia satisfazer as suas obrigações até ao dealbar da época seguinte para que fossem licenciados para a competição.

7 - Mas, mais do que remediar, há que prevenir!
A par da adopção de um tipo disciplinar punindo as situações de incumprimento salarial com despromoção, há que evitar a sua ocorrência.
Para tal, necessário se torna consignar mecanismos de controlo orçamental, que garantam a existência dos proventos suficientes para assegurar o pagamento dos encargos assumidos.
Aqui sim, se compreende e estimula a implementação de soluções de licenciamento.
No início de cada época desportiva, os clubes que pretendessem participar nas competições profissionais teriam que apresentar na Liga os respectivos orçamentos acompanhados dos documentos comprovativos das receitas e despesas aí previstos, em ordem à sua habilitação.
Assim se caucionaria a inexistência futura de situações de incumprimento salarial, com a evidente e natural ressalva dos casos excepcionais e imprevistos.
E para estes funcionaria o tipo disciplinar que, assim, assumiria a feição de extrema ratio punitiva.
Não me parece é que os clubes estejam dispostos a avocar tamanho risco!

8 - A partir de 2010, entrará em fase de testes a introdução de dois árbitros de área, para além dos três elementos tradicionais da equipa de arbitragem.
Não posso deixar de concordar com o princípio, mas penso que os custos desta medida não cobrem os seus benefícios.
Se, por um lado, se limitam os erros de julgamento nas zonas onde verdadeiramente se decidem os jogos, por outro, o financiamento e o recrutamento afiguram-se-me de difícil satisfação.
Não há nem dinheiro para pagar a tantos árbitros, nem tão pouco árbitros em número suficiente.

9 - Pelo contrário, a utilização das novas tecnologias redundaria numa solução mais eficaz e mais barata.
Os equívocos decresceriam ainda mais, não seriam necessários mais árbitros (bastariam alargar o âmbito de competências do 4º árbitro) e a médio-longo prazo os custos seriam bem menores.

10 - A reunião do International Board defraudou as expectativas não tanto neste aspecto (penso que poucos esperavam que se avançasse mais), mas ao desprezar a possibilidade de criar sanções disciplinares intermédias.
As exclusões temporárias são uma inevitabilidade como forma de combate sério e eficiente ao jogo faltoso e como meio de salvaguarda da integridade física dos jogadores.
Actualmente, os árbitros não dispõem do expediente disciplinar adequado para punir as situações que designaria de "alaranjadas", isto é, aquelas para as quais um amarelo é quase um prémio, mas que um vermelho é um castigo demasiado severo.

6 comentários:

ÀBenfica disse...

bom post. Gostaria de acrescentar a falta de profissionalismo do estrela no ano passado, quando também teve uma atitude destas.Contra o Benfica comeram a relva toda como se naquela jornada se jogava o campeonato inteiro, e na semana seguinte quando ia jogar com o guimarães que naquela altura (infelizmente) disputava a mesma posição que o ENORME, passaram a semana inteira sem fazer um único treino levando 5 na pá. Não seria de esperar outra coisa de um clube que tem "tu sabes quem" como presidente.

Força Benfica

VermelhoNunca disse...

Quanto à questão das dívidas, na minha opinião há que parar para pensar. Todos os clubes, todas as instâncias. Definir , definitivamente, regras que comtemplem os que não cumprem. A escalada salarial é enorme, mas nos clubes que aqui se fala, nem é esse o caso. Não sei se é apenas má gestão, ou se não será de colocar a questão directamente: será que o Estrela da Amadora tem razão de existir como clube profissional? O Vitória de Setúbal, sim, quanto a mim. Representa uma região, com grandes tradições na modalidade. O Estrela não passa de um bastião lampião, dos arredores de Lisboa, onde muitos adeptos do Benfica afogam as suas mágoas, perante os fracassos da equipa de futebol do Benfica.
Quanto à questão dos árbitros: contra! Aumentar o número de árbitros, pouco ou nada resolve. Soluções tecnológicas para determinados lances ( bola dentro ou fora da baliza). Mais árbitros não. Seria dar de mamar a mais incompetentes.

Jimmy Jump disse...

É verdadeiramente dramática a situação dos ordenados em atraso em Portugal.
O fim de instituições com história e tradição no nosso futebol será uma inevitabilidade.
Fica mais pobre o futebol nacional.
Esta conjuntura só é possível pela falta de competência, honestidade e hombridade da maioria dos dirigentes e responsáveis desportivos em Portugal (leia-se presidentes dos clubes e liga).
Se assim está na primeira liga, imaginemos nós a situação nas restantes.

Relativamente à introdução de dois árbitros de área, dizer que acho uma verdadeira parvoíce por dois motivos essenciais:
1- Não será a presença de árbitros residentes nas áreas que eliminará as situações dúbias naquele espaço. Como bem sabemos não há nem pode haver unanimismos na hora de interpretar e dissecar lances polémicos. Porque são polémicos e polémicos hão de permanecer. Como dizes e bem amigo Vermelho, poderão limitar a existência daqueles mas a formação de árbitros de maior nível técnico, capacidade de leitura de jogo e psicologicamente aptos também limitaria e muito.
2- Consequentemente, tal medida implicaria um dispêndio de recursos sobretudo financeiros que poderiam ser investidos na formação de árbitros.

Deste modo concordo na íntegra com aquilo que referes no ponto 9.
Relativamente ao ponto 10, pergunto-te o seguinte:
Dois cartões “alaranjados” implicariam o avermelhado, assim como sucede com a admoestação do amarelo?

Vermelho disse...

Amigo Jimmy:
Caso fosse introduzida a suspensão temporária, penso que se podia caminhar para uma solução inspirada no andebol:

2 amarelos = suspensão temporária
3 amarelos = exclusão definitiva
1 laranja = suspensão temporária
2 laranja = exclusão definitiva

Quanto à duração da suspensão temporária, penso que se podia seguir o futsal - 15 minutos (no futsal são 5) ou um golo do adversário.

Aquele abraço.

Jimmy Jump disse...

Parece-me sem dúvida alguma, um sistema correctivo interessante.
Todavia, os termos da utilização de cada um dos cartões teria de ficar bem definido sob pena de a cacofonia semanal ver elevada os seus decibéis para níveis acima daquilo que a lei permite.
Mais importante que tudo é aquele qualquer outro sistema de admoestações ajudasse verdadeiramente a proteger aquilo que é a verdadeira essência do desporto-rei: o futebol ofensivo e os golos.

Amigo Vermelho, alguma coisa digna de registo da acta do Trio d´Ataque?

Vermelho disse...

Amigo Jimmy:
Claro que a premissa base deste sistema sancionatório é a definição o mais clara possível do conjunto de situações que merecem uma ou outra sanção.

Quanto ao Trio d´Ataque dizer que não vi.