As constantes notícias sobre salários em atraso e consequentes rescisoes dos contratos de trabalho desportivo, fizeram o País desportivo despertar para a dura realidade financeira dos clubes lusos.
Com efeito, nunca como na presente época desportiva se assistiu á denúncia de tantas situações de incumprimento contratual dos clubes portugueses - Setúbal, Maia, Marco, Estoril, entre tantos outros que permanecem na penumbra do anominato.
Este quadro se não era uma evidencia, era, pelo menos, previsível.
Quando em meados dos anos 90, uma crise semelhante se começou a desenhar, o Poder Político, através da Lei de Bases do Sistema Desportivo, institucionalizou as Sad´s por forma a propiciar aos clubes um fluxo de dinheiro capaz de os capitalizar.
As Sad´s ao "legalizarem" a entrada dos donativos camarários nos cofres dos clubes, através da participação das Camaras Municipais no capital social, permitiram que a saúde financeira dos clubes fosse mascarada, mas não constitui mais do que um paleativo.
Consumidos que foram os capitais assim entrados, regressou a crise num estado ainda mais agudo.
Aliás, muitos foram os que se entregaram nas mãos de investidores portugueses e estrangeiros, quais mecenas, e morreram - vide Farense e Académico de Viseu.
Então, as agremiações desportivas procuraram na antecipação de receitas a cura dos males financeiros de que padeciam, mormente através da alienação dos direitos televisivos.
Novo erro, pois apenas se adiou o inevitável e, concomitantemente, conferiu-se á inevitabilidade um sentido mais próximo e doloroso.
Depois, buscou-se o milagre do merchandising.
Se em Inglaterra, Itália e Espanha tal poderá constituir uma importante fonte de receita, quer pela dimensão do mercado, quer pelo nível de vida dos adeptos e simpatizantes, em Portugal, com excepção dos tres grandes, nenhum outro clube logrou obter receitas visíveis.
Com os clubes assim hipotecados, em finais de 90, a Liga alcandorou-se á condição de mecenas, realizando empréstimos aos clubes em situações mais gravosas.
A par da Liga, a Olivedesportos, vendo na depauperada situação dos clubes um maná a explorar, prosseguiu na sua política monopolista, adquirindo os direitos de transmissão televisiva das partidas a disputar em épocas vindouras a preços ridiculos.
Os clubes sufocados de dividas e sem receitas para lhes fazer face, viram-se na contingencia de antecipar a venda dos direitos televisivos e, como se não achavam em posição negocial de discutir o preço, fizeram-no por valores muito inferiores aos praticados no dealbar da década de 90.
Chegados ao inicio do século, a crise era uma realidade nua e crua, mas apenas discutida em surdina.
O advento do Euro-2004 surgiu, então, como mais uma tábua de salvação - modernizava-se o parque desportivo, garantiam-se mais e melhores condições de conforto para os espectadores, alienavam-se os terrenos nos quais se achavam edificados os antigos estádios, urbanizavam-se as parcelas remanescentes, edificavam-se superficies comerciais, criavam-se novas formas de receitas, a renumeração de sócios, os cativos, os lugares anuais, enfim, toda uma panóplia de novas formas de financiamento das tesourarias.
Todavia, ainda que tais receitas tenham sido reforços substanciais para os clubes "participantes" no Euro, certo é que todo o restante País desportivo permaneceu intocado, imóvel.
Por outro lado, continuou sem existir uma visão estratégica para o futebol portugues, que a Liga devia dinamizar.
A mediocridade dos nossos dirigentes desportivos mostra-se incapaz de pensar o futebol como negócio, conservando modelos de gestão herdados do passado, os quais redundaram na situação actual.
Veja-se o exemplo dos bilhetes - cada vez o seu preço é mais elevado e o número de vendas mais reduzido.
Não seria de pensar em campanhas promocionais que atraissem mais pessoas ao futebol, novos nichos de mercado. Por que não pensar em bilhetes família, a Pack´s de conjunto de jogos (um grande juntamente com dois ou tres pequenos). O investimento de hoje seria a rentabilidade de amanhã. Pensa-se curto e pequeno.
Aliás, esta é a imagem do empresariado portugues.
Discute-se muito o horário dos jogos como sendo, a par do preço dos bilhetes, uma das razões para a desertificação dos estádios nacionais.
Contudo, tal revela-se uma discussão estéril. Com os direitos televisivos já vendidos há muito, quem determina os horários dos jogos são os detentores de tais direitos. É virtualmente impossível impor outros horários. A ditadura das televisões condiciona os dias e horas das partidas. É a face mais mercantil do futebol.
Com as receitas dos direitos televisivos há muito utilizadas, com as receitas de bilheteira a serem cada vez mais insignificantes, com as receitas provenientes das quotizações a serem cada vez mais escassas, com a recessão económica do País, com o decrescimo das receitas dos bingos e das apostas mútuas, com os subsídios autárquicos a serem cada vez menores, o volume global dos proventos desceu consideravelmente.
Por outro lado, as despesas essas mantém-se ao nível de anos anteriores e em alguns casos situam-se mesmo num patamar superior.
Assim, tudo conflui para o agravar da crise financeira.
É urgente criar um sistema de licenciamento para participação nas Ligas profissionais, dotando-se a Liga de mecanismo rigorosos de sindicancia da verdade orçamental.
Obrigar os clubes a demonstrarem as receitas que suportam cada rubrica orçamental e exigir-lhes a prestação de uma garantia bancária no valor de 20 a 30% do orçamento, accionável em caso de incumprimento.
Quando no inicio da época se determinou o encurtamento das Ligas profissionais, que de tal só tem o nome, muitas foram as vozes que se ergueram repudiando tal medida.
Todavia, face ao panorama actual do futebol portugues o encurtamento será natural - decorrerá da extinção de um conjunto alargado de clubes. Quem demonstrar saúde financeira permanece, quem não o provar cingir-se-á ás competições não profissionais ou ás camadas jovens.
Assim será o destino Darwiniano do futebol portugues.
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