Já se vai tornando repetitivo, mas tenho de o dizer - o debate de ontem foi mais do mesmo.
No entanto, algumas notas se impõe referir.
Desde logo, a postura de Cavaco Silva - num modelo em que as suas debilidades ao nível da retórica argumentativa surgem mais esbatidas, Cavaco tem vindo a aparecer mais solto, procurando dar de si uma imagem mais arejada, menos tecnocrática.
Ontem, Cavaco demonstrou que, em matéria de economia, se sente como peixe na água. Este é o seu habitat natural e aí o Professor revela conhecimentos profundos.
Assim, como o debate se centrou, na sua esmagadora maioria, em questões económicas, Cavaco não teve dificuldades de maior em abordá-lo.
Apenas num segmento económico Cavaco foi surpreendido pelo seu oponente, qual seja as privatizações.
Nesse particular, Cavaco viu-se forçado a reconhecer que a sua posição não era mais do que meramente retórica, mostrando-se impossível de concretizar a primeira das premissas que enunciou em relação ás privatizações - a manutenção das empresas em mãos nacionais.
Se, por um lado, normas europeias a isso obstam, por outro a experiencia anterior, mormente dos seus governos, demonstrou precisamente o contrário - ainda que, num primeiro momento, se tenha conseguido alienar empresas públicas a privado nacionais, em pouco tempo estes venderam-nas a estrangeiros.
No que concerne ás privatizações, restou por saber o essencial - se Cavaco dará o seu aval à alienação de empresas públicas de sectores estratégicos do Estado e da economia, designadamente das águas e das energias.
Aliás, esta constatação parece-me sintomática do paradigma de abordagem dos debates por parte de Cavaco - refugiar-se em generalidades, pouco aprofundando as matérias para, deste modo, se colocar a salvo de ataques dos seus adversários e, consequentemente, conservar a margem de distancia de que dispõe.
Não obstante, Cavaco procurou conquistar votos á esquerda - focalizou o seu discurso em preocupações sociais, não tendo sido dispiciendas as duas referencias que fez a Setúbal.
Quando o debate navegou em matérias não económicas, Cavaco, uma vez mais, revelou uma incomodidade gritante.
No momento em que se falou da legalização da prostituição e dos direitos das mulheres, Cavaco tremeu, apenas tendo conseguido balbuciar algumas palavras sobre a matéria.
Aqui, o recurso ao exemplo familiar demonstrou bem a sua impreparação e inabilidade para abordar tais assuntos.
Jerónimo, continuou na senda do debate anterior, se bem que não tenha conseguido atingir o seu principal desiderato - desmontar o discurso de Cavaco.
Jerónimo surpreendeu ao mostrar-se favorável ao TGV, ao choque tecnológico e ao investimento privado estrangeiro, revelando o seu esforço de aggiornamento do seu pensamento e do seu discurso políticos.
Jerónimo preocupou-se em apresentar uma postura de Estado, própria de um candidato a PR, que se lhe permite capitalizar votos e granjear simpatias, de igual forma o agrilhoa, impossibilitando o confronto directo com os seus oponentes.
Foi visível a sua tentativa de não hostilizar deliberadamente Cavaco, fugindo do estilo sindicalista e adoptando uma postura de regime.
Diga-se que tal ficou bem patente quando chamado a pronunciar-se sobre a "verdade" do discurso social de Cavaco se socorreu de uma citação filosófica que serviu, plenamente, os objectivos que se propunha atingir - a verdade da mentira - sem que tenha tido necessidade de recorrer a um discurso de comício ou de plenário de trabalhadores.
Contudo, dessa forma, auto-coarctou as suas possibilidades de embaraçar e desmontar o discurso de Cavaco de forma mais evidente e eficaz.
No computo geral, Jerónimo apenas nas privatizações e no enfatizar do discurso omissivo de Cavaco em relação aos direitos das mulheres logrou, verdadeiramente, perturbar Cavaco.
Referencia final para a péssima prestação de Rodrigo Guedes de Carvalho - não pareceu estar lá, tendo distorcido uma intervenção de Cavaco - pelo menos reconheceu a má interpretação - e atribuído uma posição política a Jerónimo sobre a legalização da prostituição diametralmente oposta à do candidato - a favor quando se sabe que é contra.
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