Decidi publicar alguns excertos do livro “Golpe de Estádio”, no qual o jornalista Marinho Neves de forma romanceada e sob a capa de personagens ficcionais descreve o “modus operandi” do tão famigerado sistema.
Nos excertos que irei publicar, os nomes referidos foram já, previamente, “descodificados”.
Trata-se de uma obra de qualidade literária duvidosa, mas cujo interesse para o conhecimento dos meandros da bola lusa é inegável.
A similitude com o trazido à estampa em relação ao denominado “caso apito dourado” é impressionante.
"José Guímaro estava no centro do estádio. Apitava. E o povo aplaudia. Os jogadores choravam de emoção. As principais estações de TV tinham para ali destacado os seus melhores repórteres, grande parte deles ainda imberbe. E ele, no centro do terreno,apitava, o povo aplaudia, os jogadores choravam e as televisões filmavam sem pausas para a publicidade.
Disputava-se a final do campeonato do mundo de futebol. E o melhor em campo só podia ser ele, o árbitro. Ele, José Guímaro.
Trrrrrriiiiiiiiim! Não, não era o apito. Era a campainha da porta.
O povo já não aplaudia, os jogadores não choravam e as TV´s não gravavam.
Ao acordar, num sobressalto, José não conseguiu mesmo evitar o penico, que se derramou sobre as pilosidades generosas da carpete comprada há duas semanas na Feira de Espinho.
O dia começava mal para José e, que soubesse, não se previa nenhuma final mundial.
No quarto, ainda na penumbra, um peixe vermelho nadava no aquário e um Buda jazia numa floresta de bibelôs.
Num canto, as pantufas azuis de José brilhavam, com as lantejoulas a reflectirem o emblema do clube que mais ganhos lhe tinha dado.
- Quem é? - perguntou, já na sala, agarrado a um galgo de louça que tinha compradohá um ano numa viagem a Barcelos.
- Polícia! Judite! - ouviu do outro lado.
José beliscou-se. Seria um pesadelo? Não era.
O relógio do vídeo piscava,anunciando que faltavam cinco minutos para as sete horas.
- Abra. Temos um mandado de busca! - voltou a ouvir.
- Provavelmente, bebi de mais a noite passada - ainda pensou José.
- Polícia? Não pode ser, eles disseram-me que...
A porta caiu ao segundo pontapé, abrindo uma série de comentários que ainda hoje ninguém sabe a quem atribuir.
- Mas o que é isto?- Que cheiro...
- Que fazem aqui estes homens, Zé?- Estou feito...- Calma, Zé, isto só pode ser brincadeira...- Brincadeira? Só se for de mau gosto.
- Meus senhores, isto é muito sério.- Mas eu estou inocente...- É o que vamos ver...Aqui, as luzes acenderam-se.
E também se fez luz na cabeça de José. Alguém o denunciara à polícia. E foi então que desmaiou, urinando pelas pernas abaixo.
O cheiro da urina impregnava o ambiente. José arribou um pouco mas continuava no mesmo pesadelo. Voltou a desmaiar e cagou-se. Um polícia vomitou e o outro pediu uma cerveja.
Iniciava-se a investigação.Quando bebia o segundo gole de cerveja, o agente Marques descobriu a garrafa de leite. Que não tinha leite, mas dólares.
E no meio dos dólares, lá estava A PROVA. Um cheque!
Guímaro voltou a recuperar os sentidos. Mais calmo, mas sempre a cheirar mal,começou a responder às perguntas dos polícias sentado num sofá de pele de camelo que comprara em Marraquexe, ao que disse, embora desde logo um dos agentes desconfiasse que tal mastodonte tivesse viajado mais de mil quilómetros até ali estacionar.
- Porra, quantas vezes tenho de dizer que não se pode dar comida a mais ao animal,minha besta! - berrou Reinaldo, entornando o café nas calças de linho, o que o levou a mais um movimento de pernas que a idade já não lhe consentiu, pois terminou estatelado no tapete de Arraiolos que tinha à entrada da casa de banho.- Puta de vida - gemeu, com um bolbo já a crescer-lhe na canela.
A polícia tinha colocado em marcha uma operação de grande envergadura.
O objectivo era claro: apanhar a rede de corruptores e corrompidos envolvidos no mundo da arbitragem portuguesa.
A operação nascera há vários meses, após algumas denúncias.
Os jornais desportivos tinham-se mesmo antecipado à investigação policial.
E, no meio futebolístico, as histórias sucediam-se. A polícia não podia ignorar mais o que se passava nos bastidores da bola.
A organização tinha quatro anos de histórias de malandrice. A rede era já um polvo.
Do artesanato dos primeiros tempos, passara-se ao mais refinado profissionalismo.
A empresa, altamente lucrativa, mas sem nome ou registo comercial, movimentava, porsemana, milhares de contos. Isentos de tributação, o que ainda dava mais gozo...Reinaldo era o operacional.
O patrão era, obviamente, Pinto da Costa. E Jorge Gomes nunca se importava de sujar as mãos e de dar a cara.
Não era necessáriomais ninguém nas operações especiais.
Era tudo muito claro: metade de cada aposta para eles, outra metade para os árbitros.
Os «patos» estavam sempre dispostos a entrar com muita massa, principalmente na recta final do campeonato.
Quando as provas principais se iniciavam, o estado-maior decidia logo quem subia e quem descia, na certeza de que era nos escalões mais baixos que mais alto se ganhava.
Eis um bom exemplo do sucesso desta empresa sem nome: um clube da I Divisão investiu no final do campeonato, 50 mil contos para evitar a descida.
O dinheiro foi entregue a Jorge Gomes. Mas o clube desceu, pois por vezes a bola teimava em ser mesmo redonda. Ou, se calhar, foi o Jorge que se esqueceu dos pagamentos.
Quando a polícia começou a investigar, pensou que seria fácil apanhar os tubarões.
Mas rapidamente percebeu que tinha de usar um isco de alta qualidade. Não chegava armadilhar um cheque. Aliás, essa tinha sido uma táctica que o advogado (LourençoPinto) do patrão tinha usado para fazer o seu show-off, apanhando assim um juiz de campo que estava mais que chamuscado..."
2 comentários:
amigo zex:
noto que preferiu ignorar o teor do post...
Amigo Zex
O teor zex,o teor.
Nada tem a dizer?
O Luis Filipe Vieira também estava lá?
Escatologias?
Seja sério.
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