Esta enorme dor de corno, espalhada por muitos mais clubes, será uma motivação extra para a rapaziada que apoia o Benfica
O que há de comum nas bancadas dos estádios do Sporting de Braga, Sporting Clube de Portugal e Futebol Clube do Porto? Há que, nas bancadas dos mesmos, é possível ouvir cânticos anti-Benfica em todo e qualquer jogo que se dispute nos seus relvados.
O Braga pode estar a jogar contra o Belenenses, mas aquilo que os adeptos cantam várias vezes durante os noventa minutos é a versão ressabiada e hardcore 1º escalão do "glorioso SLB", onde a palavra "glorioso" é substituída por um adjectivo muito pouco abonatório para as mamãs dos benfiquistas. Esta enorme dor de corno, espalhada por muito mais clubes do que aqueles acima referidos, será uma motivação extra para a rapaziada que apoia o Benfica, reafirmando inequivocamente aquilo que todos nós já sabemos: que o Glorioso é grande como nenhum outro será neste país.
A situação está longe de ser pacífica e quando este estranho fenómeno acontece fico chateado e feliz a um tempo. Chateado porque obviamente não gosto que chamem nomes à minha querida mãe, e feliz porque não posso deixar de me regozijar com a tacanhez medíocre de muitos daqueles que mais que apoiar outros emblemas, odeiam o benfas. Já os benfiquistas são um pouco diferentes e no dia em que nas bancadas do Estádio da Luz se passar uma quantidade absurda de tempo a difamar uma equipa que nem sequer por ali anda vai ser o dia em que não há corrupção na política, por exemplo.
Claro que as claques terão algumas palavras para os adversários, mas quer-me parecer que a malta guarda isso para as ocasiões em que com eles se confronta. A verdade disto tudo é que nós somos muitos e indefectíveis no amor que dedicamos ao nosso clube, maior do que quaisquer ódios de estimação que possamos ter.
No último jogo, para a Liga Europa, tivemos mais de trinta mil na Luz, numa terça às cinco da tarde. Muitos há que, mesmo que escancarassem as portas sem cobrar entradas, nem um terço deste número alcançariam em tal dia. Por isso, cantem à vontade.
domingo, fevereiro 28, 2010
sábado, fevereiro 27, 2010
Leixões 0 SLBenfica 4 Di Magia Show!
Di María
Noite de sonho para o internacional argentino. Realizou a melhor exibição desde que está em Portugal, justificando o louco cerco que lhe montam no estrangeiro. A jogar assim, definitivamente, será complicado ao Benfica segurá-lo, ainda por cima em ano de Mundial. Fez o primeiro «hat-trick» com a camisola encarnada e ainda viu um golo mal anulado, num lance em que apareceu rapidíssimo nas costas da defesa do Leixões. Mais rápido que a própria sombra. Tão rápido que até enganou o auxiliar. O que se pode pedir mais? Para quem ainda tem dúvidas pode-se sempre auxiliar dos dois últimos golos na partida, duas autênticas obras de arte. Roubou o protagonismo esta noite. Todos os outros destaques parecerão efémeros, comparados à noite de Di María.
Eder Luis
Estreia a marcar na Liga, num lance em que gozou de alguma sorte, mas teve o mérito de arriscar, quando os caminhos pareciam tapados. Em abono da verdade, não fez muito mais que isso, ressalvando-se que estava a jogar numa posição que não costuma ser a sua.
Airton
Na estreia na Liga deu para notar que ainda não tem o desembaraço e dinamismo de Javi García, mas sai do encontro com nota positiva. Não parece ser exímio na arte de construir jogo, mas compensou com disciplina táctica e abnegação. Um caso a rever em jogos de maior grau de dificuldade. Saiu lesionado, num lance em que caiu mal após uma bola dividida nas alturas.
Carlos Martins
Mostra vontade a cada toque na bola. Entrou apenas no segundo tempo, ainda muito a tempo de participar na festa. Primeiro, num remate potente que passou junto ao poste. Depois com a assistência para o golaço de Di María. Um dos principais rostos da avalanche ofensiva que foi o futebol do Benfica no segundo tempo.
Jean Sony
Algumas iniciativas com moderado sucesso animaram as hostes da casa. Pela primeira vez titular com Castro Santos, o haitiano colou-se à linha na direita e deu que fazer a Fábio Coentrão. O mais agitado do Leixões, apesar da segunda parte mais comedida.
Pouga
Se bater a defesa encarnada não é tarefa fácil, fazê-lo sozinho é hercúleo. O Leixões foi sempre uma equipa mais preocupada em fechar os caminhos para a sua baliza do que em tentar marcar, mesmo depois de se apanhar em desvantagem. E, por isso, Pouga ficou sozinho no ataque a maior parte do tempo, à frente de duas linhas bem definidas. Lutou muito, mas só isso não chega. Com João Paulo ao lado, o rendimento não subiu muito. A culpa não será dele, mas fica como o símbolo na impotência do Leixões.
Artigo de Opinião de Ricardo Araújo Pereira
Deus os livre dos castigos, que do ridículo é mais difícil
INDIGNADO com certas falcatruas, Rui Moreira deu o braço a Fernando Madureira, dos Super-Dragões, e foi manifestar-se para a sede da Liga de Clubes com o intuito de moralizar o futebol português. Os dois adeptos do clube cujo presidente cumpre neste momento uma pena de suspensão de dois anos por tentativa de corrupção estão compreensivelmente preocupados com determinadas injustiças. Sabemos todos que os sócios do clube que pagou uma viagem ao Brasil a Carlos José Amorim Calheiros são particularmente sensíveis aos atentados à verdade desportiva. Não admira: os adeptos do clube cujos dirigentes foram escutados a providenciar o fornecimento de rebuçadinhos, café com leite e fruta para dormir a certas equipas de arbitragem sempre foram extremamente exigentes no que toca à lisura e à honradez. Por isso, Rui Moreira não podia ter deixado de fazer ouvir a sua voz em uníssono com a de Fernando Madureira, protagonista do livro O Líder, obra na qual relata alguns episódios curiosos ocorridos com a claque que dirige. Sobre o modo como os Super Dragões adquiriram ingressos para um Braga-Porto de 1995, por exemplo, diz Madureira, e cito: «Pelo que se comentava, muito do pessoal tinha notas falsas para comprar os bilhetes e ainda trazer troco.» A propósito de uma paragem dos Super Dragões na auto-estrada, a caminho de um Setúbal-Porto de 2002, Madureira revela: «Foi o caos! Entraram cem gajos pela área de serviço e roubaram tudo o que lhes apareceu à frente.» Foi esta mesma claque que se manifestou na companhia de Rui Moreira, e que afixou nas bancadas, no dia do Porto-Braga, uma faixa com os dizeres: «Contra… falsidade e roubalheira». Ou seja, a claque que, segundo o seu líder, pagava com notas falsas e roubava tudo o que lhe aparecia à frente, está agora precisamente contra a falsidade e a roubalheira. Enfim, toda a gente tem o direito de mudar de opinião.
No jogo contra o Braga, o Porto beneficiou da exclusão de Vandinho pela Comissão Disciplinar da Liga, e também da exclusão de Meyong por Domingos Paciência, e obteve um resultado bastante desnivelado. Na véspera, o plantel do Porto reuniu-se em torno do seu líder, o terceiro guarda-redes, para o ouvir expressar, e cito, «a indignação de que somos vítimas». O orador foi bem escolhido, na medida em que não há ninguém que compreenda melhor a situação de Hulk do que Nuno: ele também fica sempre fora dos convocados. Este é o ano em que todos os azares batem à porta da equipa portista: primeiro, Hulk e Sapunaru foram suspensos só porque espancaram quem, segundo ficou provado, não os insultou nem agrediu; agora, os portistas são, creio que em estreia mundial, «vítimas de indignação». A dura realidade é esta: sem Hulk, a equipa do Porto vê-se condenada a alinhar apenas com jogadores que trocam mesmo a bola uns com os outros, o que prejudica qualquer sistema táctico. Não são só os portistas que reclamam o regresso de Hulk. Eu, como adepto do Benfica, também. Recordo com saudade a última exibição de Hulk antes do castigo, no estádio da Luz, em que o único remate à baliza que fez saiu pela linha lateral.
Entretanto, os jogadores do Benfica, que até hoje não apareceram envolvidos em agressões em quaisquer imagens de quaisquer túneis, continuam empenhados em levar a cabo uma actividade que parece ter caído em desuso: jogar futebol. Mas, nos últimos 30 minutos do jogo contra o Hertha, o Benfica não acrescentou qualquer golo aos quatro que marcou na primeira hora — o que parece indicar que, como dizem os críticos, a equipa está cansada. Às goleadas exuberantes do início da época, sucedem-se agora vitórias tangenciais por magros 4-0. A gestão que Jorge Jesus fez do plantel produziu esta triste equipa exausta que lidera o campeonato isolada com o melhor ataque e a melhor defesa. É triste, este cansaço. Quem me dera estar em terceiro, cheio de força, com o plantel correctamente gerido, a seis pontos do primeiro e a cinco do segundo. Mas não se pode ter tudo.
INDIGNADO com certas falcatruas, Rui Moreira deu o braço a Fernando Madureira, dos Super-Dragões, e foi manifestar-se para a sede da Liga de Clubes com o intuito de moralizar o futebol português. Os dois adeptos do clube cujo presidente cumpre neste momento uma pena de suspensão de dois anos por tentativa de corrupção estão compreensivelmente preocupados com determinadas injustiças. Sabemos todos que os sócios do clube que pagou uma viagem ao Brasil a Carlos José Amorim Calheiros são particularmente sensíveis aos atentados à verdade desportiva. Não admira: os adeptos do clube cujos dirigentes foram escutados a providenciar o fornecimento de rebuçadinhos, café com leite e fruta para dormir a certas equipas de arbitragem sempre foram extremamente exigentes no que toca à lisura e à honradez. Por isso, Rui Moreira não podia ter deixado de fazer ouvir a sua voz em uníssono com a de Fernando Madureira, protagonista do livro O Líder, obra na qual relata alguns episódios curiosos ocorridos com a claque que dirige. Sobre o modo como os Super Dragões adquiriram ingressos para um Braga-Porto de 1995, por exemplo, diz Madureira, e cito: «Pelo que se comentava, muito do pessoal tinha notas falsas para comprar os bilhetes e ainda trazer troco.» A propósito de uma paragem dos Super Dragões na auto-estrada, a caminho de um Setúbal-Porto de 2002, Madureira revela: «Foi o caos! Entraram cem gajos pela área de serviço e roubaram tudo o que lhes apareceu à frente.» Foi esta mesma claque que se manifestou na companhia de Rui Moreira, e que afixou nas bancadas, no dia do Porto-Braga, uma faixa com os dizeres: «Contra… falsidade e roubalheira». Ou seja, a claque que, segundo o seu líder, pagava com notas falsas e roubava tudo o que lhe aparecia à frente, está agora precisamente contra a falsidade e a roubalheira. Enfim, toda a gente tem o direito de mudar de opinião.
No jogo contra o Braga, o Porto beneficiou da exclusão de Vandinho pela Comissão Disciplinar da Liga, e também da exclusão de Meyong por Domingos Paciência, e obteve um resultado bastante desnivelado. Na véspera, o plantel do Porto reuniu-se em torno do seu líder, o terceiro guarda-redes, para o ouvir expressar, e cito, «a indignação de que somos vítimas». O orador foi bem escolhido, na medida em que não há ninguém que compreenda melhor a situação de Hulk do que Nuno: ele também fica sempre fora dos convocados. Este é o ano em que todos os azares batem à porta da equipa portista: primeiro, Hulk e Sapunaru foram suspensos só porque espancaram quem, segundo ficou provado, não os insultou nem agrediu; agora, os portistas são, creio que em estreia mundial, «vítimas de indignação». A dura realidade é esta: sem Hulk, a equipa do Porto vê-se condenada a alinhar apenas com jogadores que trocam mesmo a bola uns com os outros, o que prejudica qualquer sistema táctico. Não são só os portistas que reclamam o regresso de Hulk. Eu, como adepto do Benfica, também. Recordo com saudade a última exibição de Hulk antes do castigo, no estádio da Luz, em que o único remate à baliza que fez saiu pela linha lateral.
Entretanto, os jogadores do Benfica, que até hoje não apareceram envolvidos em agressões em quaisquer imagens de quaisquer túneis, continuam empenhados em levar a cabo uma actividade que parece ter caído em desuso: jogar futebol. Mas, nos últimos 30 minutos do jogo contra o Hertha, o Benfica não acrescentou qualquer golo aos quatro que marcou na primeira hora — o que parece indicar que, como dizem os críticos, a equipa está cansada. Às goleadas exuberantes do início da época, sucedem-se agora vitórias tangenciais por magros 4-0. A gestão que Jorge Jesus fez do plantel produziu esta triste equipa exausta que lidera o campeonato isolada com o melhor ataque e a melhor defesa. É triste, este cansaço. Quem me dera estar em terceiro, cheio de força, com o plantel correctamente gerido, a seis pontos do primeiro e a cinco do segundo. Mas não se pode ter tudo.
quinta-feira, fevereiro 25, 2010
Artigo de Opinião de Leonor Pinhão
Seguiu-se a vigília do Sport Lisboa e PJ
Menos de 24 horas depois da vigília pela verdade desportiva encabeçada por Rui Moreira, presidente da Associação Comercial do Porto, e por Fernando Madureira, presidente dos Super Dragões, a brigada de crimes económicos da Polícia Judiciária iniciou, de forma bem mais discreta, uma vigília por uma outra verdade qualquer nos gabinetes da SAD portista, nas instalações do Estádio do Dragão.
De acordo com as primeiras informações sobre as referidas buscas, esta operação foi executada a pedido da Interpol e da polícia belga, isto é, da Bélgica, e os agentes portugueses que a efectuaram pertencem aos quadros da PJ da cidade do Porto. Será, portanto, relativamente difícil para os lamentáveis ideólogos da teoria dos «túneis» e das «toupeiras» acusar o Benfica de estar por trás de mais esta manobra conspirativa para impedir o FC Porto de se sagrar pela quinta vez consecutiva campeão nacional.
A não ser que a conspiração tenha atingido um nível internacional, o que já parece grande exagero. Mas, mesmo assim, nunca fiando…
Na tarde de terça-feira, à mesma hora que o Benfica, no Estádio da Luz, jogava bom futebol e despachava os alemães do Hertha com uma goleada limpa, o presidente da Associação Comercial do Porto, em boa ainda que diminuta companhia, manifestava-se à porta da Liga de Clubes contra a Comissão Disciplinar da Liga em função da «injustiça» dos castigos a Hulk e a Sapunaru. «O que estão a fazer ao FC Porto é indigno», concluiu Rui Moreira. E, neste ponto, tem muita razão. A começar por ele próprio, se quiser reflectir melhor sobre o assunto.
Tal como muitos que sempre se recusaram a escrever ou a falar objectivamente sobre o conteúdo das escutas do processo Apito Dourado, optando pela fácil e pouco corajosa solução «técnica» de considerar as mesmas escutas ilegais, os mesmos, e outros mais, vêm agora considerar que a suspensão dos dois jogadores do FC Porto é uma grande injustiça porque, tecnicamente, os funcionários das empresas de segurança não são «agentes desportivos», portanto podem levar pancada à vontade como, no passado, já levaram jornalistas e outros miseráveis afins.
É de facto indigno do FC Porto ter pessoal que, desta maneira, o pretende estar a defender, lavando com uma esponja notórios pecadilhos e óbvios pecados que já nem constituem escândalo, antes fazem parte do anedotário nacional.
Passa-se no FC Porto um problema que, com o andar do tempo, teria inevitavelmente de surgir.
Trata-se, porque ninguém vai para novo, da questão da sucessão de Pinto da Costa. Acrescente-se a este facto outro facto importante: o presidente do FC Porto foi sujeito a uma levíssima pena disciplinar, uma suspensão, que, no entanto, o impede de entrar em acção através dos jornais e das televisões com o ênfase e o sentido de oportunidade que sempre o caracterizaram.
Órfãos dos discurso presidencial, logo se perfilaram os seus pretensos substitutos para preencher o vazio, dar uma satisfação aos caríssimos ouvintes e marcar pontos na corrida que, mais cedo ou mais tarde, se avizinhará.
E é nisto que estamos.
Quanto à Liga, pois continua a trabalhar em prol do Benfica a todo o vapor.
Basta atentar no calendário das provas nacionais desenhado na sua sede, palco de vigílias, para se concluir como é manobra de mais uma «toupeira» vermelhusca o facto de o Benfica ter de jogar a final da Taça da Liga com o FC Porto dois dias depois de jogar com o Marselha a primeira-eliminatória dos oitavos-de-final da Liga Europa.
De acordo com os jornais, os organizadores da vigília à porta da Liga convocaram também, por via postal e electrónica, os adeptos do Sporting de Braga a comparecer a manifestação de revolta e desagrado pelo facto de andar o Benfica a ser levado ao colo.
Aparentemente, os adeptos do Sporting de Braga não compareceram. Viu-se um cachecol do Beira-Mar e uns quantos adeptos do Boavista, um histórico do futebol português que foi relegado para divisões secundárias na sequência do processo Apito Dourado em benefício directo do Benfica, como entra pelos olhos dentro. Aliás, sempre que os sócios e adeptos do Boavista dizem - e dizem-no tantas vezes - que foram «os bodes expiatórios» do Apito Dourado, é, precisamente, ao Benfica que se estão a referir porque é pelo Benfica e no lugar do Benfica que estão a expiar culpas.
Voltemos aos adeptos do Sporting de Braga que não compareceram à vigília. Fizeram bem.
Em primeiro lugar, porque, por mais que terceiros tentem, o seu emblema não é sucursal de ninguém.
Em segundo lugar porque ainda devem estar indignados com o tom paternalista dos elogios que a exibição da sua equipa no Dragão mereceu do aliviadíssimo treinador do FC Porto - «o Braga provou aqui a razão de ser líder» - e mesmo de adeptos do FC Porto, como Manuela Aguiar que até imaginou «o que seria este FC Porto a jogar numa Liga a sério contra equipas que jogassem de igual para igual como o Braga fez».
Isto não se diz de ninguém.
Contam os jornais que o Chelsea abandonou Lisboa de mãos a abanar. Os ingleses vieram à Luz para negociar a transferência de Angel Di María e não terão tido sucesso. Talvez tenha sido apenas um primeiro passo falhado porque não é de prever que o Chelsea, que José Mourinho transformou num dos grandes da Europa, desista facilmente do jovem extremo argentino.
Também o Manchester United já se mostrou interessado no jogador. E o Manchester City também, para não ficar atrás. É normal. Para muitos especialistas, o futebol inglês, por ser limpo e directo, seria o palco ideal para o talentoso jogador. Já para os benfiquistas que são especialistas em futebol internacional e que viram, em duas épocas seguidas, como Di María joga sempre incrivelmente bem contra o Hertha de Berlim, o melhor campeonato para o argentino brilhar seria o campeonato alemão.
Mas para os benfiquistas, que não são nem querem ser especialistas em assuntos externos, o palco ideal para Di María só pode continuar ser o do Estádio da Luz.
E, de um ponto de vista egoísta, têm toda a razão.
Menos de 24 horas depois da vigília pela verdade desportiva encabeçada por Rui Moreira, presidente da Associação Comercial do Porto, e por Fernando Madureira, presidente dos Super Dragões, a brigada de crimes económicos da Polícia Judiciária iniciou, de forma bem mais discreta, uma vigília por uma outra verdade qualquer nos gabinetes da SAD portista, nas instalações do Estádio do Dragão.
De acordo com as primeiras informações sobre as referidas buscas, esta operação foi executada a pedido da Interpol e da polícia belga, isto é, da Bélgica, e os agentes portugueses que a efectuaram pertencem aos quadros da PJ da cidade do Porto. Será, portanto, relativamente difícil para os lamentáveis ideólogos da teoria dos «túneis» e das «toupeiras» acusar o Benfica de estar por trás de mais esta manobra conspirativa para impedir o FC Porto de se sagrar pela quinta vez consecutiva campeão nacional.
A não ser que a conspiração tenha atingido um nível internacional, o que já parece grande exagero. Mas, mesmo assim, nunca fiando…
Na tarde de terça-feira, à mesma hora que o Benfica, no Estádio da Luz, jogava bom futebol e despachava os alemães do Hertha com uma goleada limpa, o presidente da Associação Comercial do Porto, em boa ainda que diminuta companhia, manifestava-se à porta da Liga de Clubes contra a Comissão Disciplinar da Liga em função da «injustiça» dos castigos a Hulk e a Sapunaru. «O que estão a fazer ao FC Porto é indigno», concluiu Rui Moreira. E, neste ponto, tem muita razão. A começar por ele próprio, se quiser reflectir melhor sobre o assunto.
Tal como muitos que sempre se recusaram a escrever ou a falar objectivamente sobre o conteúdo das escutas do processo Apito Dourado, optando pela fácil e pouco corajosa solução «técnica» de considerar as mesmas escutas ilegais, os mesmos, e outros mais, vêm agora considerar que a suspensão dos dois jogadores do FC Porto é uma grande injustiça porque, tecnicamente, os funcionários das empresas de segurança não são «agentes desportivos», portanto podem levar pancada à vontade como, no passado, já levaram jornalistas e outros miseráveis afins.
É de facto indigno do FC Porto ter pessoal que, desta maneira, o pretende estar a defender, lavando com uma esponja notórios pecadilhos e óbvios pecados que já nem constituem escândalo, antes fazem parte do anedotário nacional.
Passa-se no FC Porto um problema que, com o andar do tempo, teria inevitavelmente de surgir.
Trata-se, porque ninguém vai para novo, da questão da sucessão de Pinto da Costa. Acrescente-se a este facto outro facto importante: o presidente do FC Porto foi sujeito a uma levíssima pena disciplinar, uma suspensão, que, no entanto, o impede de entrar em acção através dos jornais e das televisões com o ênfase e o sentido de oportunidade que sempre o caracterizaram.
Órfãos dos discurso presidencial, logo se perfilaram os seus pretensos substitutos para preencher o vazio, dar uma satisfação aos caríssimos ouvintes e marcar pontos na corrida que, mais cedo ou mais tarde, se avizinhará.
E é nisto que estamos.
Quanto à Liga, pois continua a trabalhar em prol do Benfica a todo o vapor.
Basta atentar no calendário das provas nacionais desenhado na sua sede, palco de vigílias, para se concluir como é manobra de mais uma «toupeira» vermelhusca o facto de o Benfica ter de jogar a final da Taça da Liga com o FC Porto dois dias depois de jogar com o Marselha a primeira-eliminatória dos oitavos-de-final da Liga Europa.
De acordo com os jornais, os organizadores da vigília à porta da Liga convocaram também, por via postal e electrónica, os adeptos do Sporting de Braga a comparecer a manifestação de revolta e desagrado pelo facto de andar o Benfica a ser levado ao colo.
Aparentemente, os adeptos do Sporting de Braga não compareceram. Viu-se um cachecol do Beira-Mar e uns quantos adeptos do Boavista, um histórico do futebol português que foi relegado para divisões secundárias na sequência do processo Apito Dourado em benefício directo do Benfica, como entra pelos olhos dentro. Aliás, sempre que os sócios e adeptos do Boavista dizem - e dizem-no tantas vezes - que foram «os bodes expiatórios» do Apito Dourado, é, precisamente, ao Benfica que se estão a referir porque é pelo Benfica e no lugar do Benfica que estão a expiar culpas.
Voltemos aos adeptos do Sporting de Braga que não compareceram à vigília. Fizeram bem.
Em primeiro lugar, porque, por mais que terceiros tentem, o seu emblema não é sucursal de ninguém.
Em segundo lugar porque ainda devem estar indignados com o tom paternalista dos elogios que a exibição da sua equipa no Dragão mereceu do aliviadíssimo treinador do FC Porto - «o Braga provou aqui a razão de ser líder» - e mesmo de adeptos do FC Porto, como Manuela Aguiar que até imaginou «o que seria este FC Porto a jogar numa Liga a sério contra equipas que jogassem de igual para igual como o Braga fez».
Isto não se diz de ninguém.
Contam os jornais que o Chelsea abandonou Lisboa de mãos a abanar. Os ingleses vieram à Luz para negociar a transferência de Angel Di María e não terão tido sucesso. Talvez tenha sido apenas um primeiro passo falhado porque não é de prever que o Chelsea, que José Mourinho transformou num dos grandes da Europa, desista facilmente do jovem extremo argentino.
Também o Manchester United já se mostrou interessado no jogador. E o Manchester City também, para não ficar atrás. É normal. Para muitos especialistas, o futebol inglês, por ser limpo e directo, seria o palco ideal para o talentoso jogador. Já para os benfiquistas que são especialistas em futebol internacional e que viram, em duas épocas seguidas, como Di María joga sempre incrivelmente bem contra o Hertha de Berlim, o melhor campeonato para o argentino brilhar seria o campeonato alemão.
Mas para os benfiquistas, que não são nem querem ser especialistas em assuntos externos, o palco ideal para Di María só pode continuar ser o do Estádio da Luz.
E, de um ponto de vista egoísta, têm toda a razão.
Espaço Prof. Karamba
Sporting - FC Porto
Leixões - Benfica
Sp. Braga - Olhanense
Nacional - Belenenses
Académica - Rio Ave
P. Ferreira - V. Setúbal
Naval - Marítimo
U. Leiria - V. Guimarães
Leixões - Benfica
Sp. Braga - Olhanense
Nacional - Belenenses
Académica - Rio Ave
P. Ferreira - V. Setúbal
Naval - Marítimo
U. Leiria - V. Guimarães
quarta-feira, fevereiro 24, 2010
Frase da Semana
“Não quero que os lagartos desçam de divisão porque depois eles ganhavam a 2ª liga e vinham dizer que tinham mais um titulo que Nós!”
Jorge Máximo
Jorge Máximo
terça-feira, fevereiro 23, 2010
O Escândalo da Falsificação de Idades no Futebol Nigeriano
A idade oficial de Nwankwo Kanu é de 33 anos, mas a sua idade real é 42. Obafemi Martins não tem 25 anos mas sim 32. Jay-Jay Okocha era dez anos mais velho que a sua idade "oficial" ao longo da carreira. E Taribo West, que terminou a carreira há dois anos, está na casa dos 50 anos. Quem o diz? Uma corrente de bloggers em alguns dos mais famosos sites da Nigéria, em resposta aos comentários feitos depois do esforço tímido da selecção na última Taça das Nações Africanas.
Falhar na tentativa de ganhar a competição é sempre considerado um escândalo na nação mais populosa do continente, mas o último fracasso da Nigéria no torneio fez com que acontecesse uma condenação explosiva no regresso a casa.
Tudo começou quando um antigo treinador de um clube nigeriano disse: "o que aconteceu em Angola é a confirmação do que tem acontecido no passado, onde a maioria dos nossos jogadores falsificaram a idade durante a competição. A maioria dos jogadores estão para lá da idade que garantem ter, e isso tornou impossível para eles contrariar a velocidade de equipas como a Zâmbia ou o Benin".
Isso também conduziu a uma entretida discussão que não mostrou sinal de ter abatido os nigerianos, que têm apenas três meses para preparar o Campeonato do Mundo, e reagiram às criticas com um despedimento do treinador. "Os nossos rapazes são velhos, estamos a pagar o preço de alterar as idades", disse Ken Anugweje, um antigo médico e membro da direcção da Federação Nigeriana de Futebol.
Suspeitas acerca das idades reais dos futebolistas nigerianos vem de há 20 anos. FIFA baniu a Nigéria de todos os jogos internacionais por dois anos, depois de descobrir que três dos seus jogadores nos Jogos Olímpicos de 1988 tinham idades diferentes das usadas pelos mesmos jogadores em torneios anteriores.
Um ano depois, Pelé proclamou ao Mundo que "uma equipa africana vai ganhar um Campeonato do Mundo no virar do século" depois de observar a prometedora Nigéria a levantar a Taça do Mundo de Sub-17 e chegar à final do Campeonato de Sub-20. Como poderia Pelé prever que os então chamados Sub-20 de 1989 era tão velhos que, nas palavras de George Onmonya, "a maioria dos nossos jogadores estão agora retirados ou são avôs"?
A Nigéria tem uma tradição rica de jogadores promissores que misteriosamente falharam ao provar o seu potencial. Phillip Osondu foi o melhor jogador no Campeonato do Mundo de Sub-17 de 1987, a seguir ao qual foi contratado pelo Anderlecht, apenas para sair do jogo e fazer trabalho de porteiro depois de serem levantadas questões acerca da sua idade real.
A estrela dos finalistas da Nigéria na competição de Sub-17 em 2001 tornou-se oficialmente o terceiro jogador mais jovem de sempre a marcar presença num Campeonato do Mundo sénior em 2002, no empate inicial com a Inglaterra em 2002. Mas isso foi o máximo que Femi Opabunmi conseguiu, e em 2005 jogava futebol em part-time nas divisões mais baixas do campeonato francês.
Uma viajem pela blogosfera faz com que haja leituras intrigantes. "Um amigo meu, que jogou na liga nigeriana disse-me que a sua idade real era 34 mas no futebol tinha 21", escreveu Onmonya. "Podes entrar em qualquer escritório de imigração na Nigéria hoje, e falsificar documentos, mudar o nome, local de nascimento, data de nascimento, pagar sete a dez mil naira em vez dos habituais 5500 por um passaporte internacional, e em poucas horas completa-se o processo". Um novo passaporte, uma nova pessoa - e se for um futebolista, um mais novo.
Um antigo trabalhador da embaixada britânica na Nigéria, disse ao que quando os candidatos a um visto protestavam acerca dos seus processos rejeitados, ele sempre respondia: "Não me falem a mim acerca disso, estou morto". Ele respondia para as pessoas olharem para um papel nas suas costas, onde estava pendurado um certificado de óbito, comprado por uma quantia insignificante em Lagos. A FIFA reconhece reconheceu que finalmente conseguiu um sistema de determinar a idade sem falhas. Antes do Campeonato do Mundo de Sub-17 do ano passado, na Nigéria, o corpo governativo anunciou que os jogadores estiveram sujeitos a exames ao pulso, através de ressonâncias magnéticas , e que isto ia determinar as suas reais idades.
Isso levou alguns países a fazer exames de prevenção antes da prova. Os resultados nunca foram anunciados, mas a Nigéria misteriosamente descartou 15 jogadores, enquanto o Gâmbia escondeu 11 dos 18 atletas que os ajudaram a vencer o Campeonato Africano de Sub-17 poucos meses antes. Relatórios dizem que análises retrospectivas dos anteriores três Campeonatos do Mundo de Sub-17, mostraram que mais de um terço dos jogadores eram mais velhos.
Texto: Redacção Academia de Talentos.
Fonte: www.guardian.co.uk
Falhar na tentativa de ganhar a competição é sempre considerado um escândalo na nação mais populosa do continente, mas o último fracasso da Nigéria no torneio fez com que acontecesse uma condenação explosiva no regresso a casa.
Tudo começou quando um antigo treinador de um clube nigeriano disse: "o que aconteceu em Angola é a confirmação do que tem acontecido no passado, onde a maioria dos nossos jogadores falsificaram a idade durante a competição. A maioria dos jogadores estão para lá da idade que garantem ter, e isso tornou impossível para eles contrariar a velocidade de equipas como a Zâmbia ou o Benin".
Isso também conduziu a uma entretida discussão que não mostrou sinal de ter abatido os nigerianos, que têm apenas três meses para preparar o Campeonato do Mundo, e reagiram às criticas com um despedimento do treinador. "Os nossos rapazes são velhos, estamos a pagar o preço de alterar as idades", disse Ken Anugweje, um antigo médico e membro da direcção da Federação Nigeriana de Futebol.
Suspeitas acerca das idades reais dos futebolistas nigerianos vem de há 20 anos. FIFA baniu a Nigéria de todos os jogos internacionais por dois anos, depois de descobrir que três dos seus jogadores nos Jogos Olímpicos de 1988 tinham idades diferentes das usadas pelos mesmos jogadores em torneios anteriores.
Um ano depois, Pelé proclamou ao Mundo que "uma equipa africana vai ganhar um Campeonato do Mundo no virar do século" depois de observar a prometedora Nigéria a levantar a Taça do Mundo de Sub-17 e chegar à final do Campeonato de Sub-20. Como poderia Pelé prever que os então chamados Sub-20 de 1989 era tão velhos que, nas palavras de George Onmonya, "a maioria dos nossos jogadores estão agora retirados ou são avôs"?
A Nigéria tem uma tradição rica de jogadores promissores que misteriosamente falharam ao provar o seu potencial. Phillip Osondu foi o melhor jogador no Campeonato do Mundo de Sub-17 de 1987, a seguir ao qual foi contratado pelo Anderlecht, apenas para sair do jogo e fazer trabalho de porteiro depois de serem levantadas questões acerca da sua idade real.
A estrela dos finalistas da Nigéria na competição de Sub-17 em 2001 tornou-se oficialmente o terceiro jogador mais jovem de sempre a marcar presença num Campeonato do Mundo sénior em 2002, no empate inicial com a Inglaterra em 2002. Mas isso foi o máximo que Femi Opabunmi conseguiu, e em 2005 jogava futebol em part-time nas divisões mais baixas do campeonato francês.
Uma viajem pela blogosfera faz com que haja leituras intrigantes. "Um amigo meu, que jogou na liga nigeriana disse-me que a sua idade real era 34 mas no futebol tinha 21", escreveu Onmonya. "Podes entrar em qualquer escritório de imigração na Nigéria hoje, e falsificar documentos, mudar o nome, local de nascimento, data de nascimento, pagar sete a dez mil naira em vez dos habituais 5500 por um passaporte internacional, e em poucas horas completa-se o processo". Um novo passaporte, uma nova pessoa - e se for um futebolista, um mais novo.
Um antigo trabalhador da embaixada britânica na Nigéria, disse ao que quando os candidatos a um visto protestavam acerca dos seus processos rejeitados, ele sempre respondia: "Não me falem a mim acerca disso, estou morto". Ele respondia para as pessoas olharem para um papel nas suas costas, onde estava pendurado um certificado de óbito, comprado por uma quantia insignificante em Lagos. A FIFA reconhece reconheceu que finalmente conseguiu um sistema de determinar a idade sem falhas. Antes do Campeonato do Mundo de Sub-17 do ano passado, na Nigéria, o corpo governativo anunciou que os jogadores estiveram sujeitos a exames ao pulso, através de ressonâncias magnéticas , e que isto ia determinar as suas reais idades.
Isso levou alguns países a fazer exames de prevenção antes da prova. Os resultados nunca foram anunciados, mas a Nigéria misteriosamente descartou 15 jogadores, enquanto o Gâmbia escondeu 11 dos 18 atletas que os ajudaram a vencer o Campeonato Africano de Sub-17 poucos meses antes. Relatórios dizem que análises retrospectivas dos anteriores três Campeonatos do Mundo de Sub-17, mostraram que mais de um terço dos jogadores eram mais velhos.
Texto: Redacção Academia de Talentos.
Fonte: www.guardian.co.uk
segunda-feira, fevereiro 22, 2010
Espaço Prof. Karamba - Classificação Geral
1º Lugar: Vermelho Sempre - 490 pontos
2º Lugar: Jimmy Jump - 485 pontos
3º Lugar: Kaiserlicheagle - 440 pontos
4º Lugar: JC - 435 pontos
5º Lugar: Vermelho - 425 pontos
6º Lugar: J. Lobo e Fura-Redes - 405 pontos
7º Lugar: Samsalameh e Sócio - 385 pontos
8º Lugar: Gui - 355 pontos
9º Lugar. Cuto - 315 pontos
10º Lugar: Chico - 245 pontos
11º Lugar: Vermelho Nunca - 225 pontos
12º Lugar: Agarredinhos e Filipe - 70 pontos
13º Lugar: Luís Rosário - 55 pontos
14º Lugar: Lion Heart - 50 pontos
15º Lugar: Pachulico - 35 pontos
2º Lugar: Jimmy Jump - 485 pontos
3º Lugar: Kaiserlicheagle - 440 pontos
4º Lugar: JC - 435 pontos
5º Lugar: Vermelho - 425 pontos
6º Lugar: J. Lobo e Fura-Redes - 405 pontos
7º Lugar: Samsalameh e Sócio - 385 pontos
8º Lugar: Gui - 355 pontos
9º Lugar. Cuto - 315 pontos
10º Lugar: Chico - 245 pontos
11º Lugar: Vermelho Nunca - 225 pontos
12º Lugar: Agarredinhos e Filipe - 70 pontos
13º Lugar: Luís Rosário - 55 pontos
14º Lugar: Lion Heart - 50 pontos
15º Lugar: Pachulico - 35 pontos
domingo, fevereiro 21, 2010
Uma Fabulosa Entrevista
Andar atrás de um matulão que mede 1,93 metros, calça 47 e gosta de fazer rir os portugueses não deixa de ser uma aventura enquanto a crise económica e política abala Portugal. Era essa a tarefa e todos os esforços foram feitos para espremer o humorista Ricardo Araújo Pereira de modo a fazer-se, finalmente, um perfil seu mais aproximado da realidade. A dificuldade em retirar o sumo – poucas vezes com sabor a limão – do humorista foi um desafio, nem que para isso se ficasse a saber que as suas filhas pretendiam chamar Brincos de Princesa a uma das cadelas, que não comenta qual a beldade da Playboy que mais apreciou na edição em que foi capa da revista e que faz questão de confessar a ausência de talento para a representação. A situação que ficou mais clara é que a etnia viva com que menos quer conviver é a classe dos jornalistas, mesmo tendo sido um deles, há 15 anos.
A primeira certeza sobre Ricardo Araújo Pereira (a partir de agora referido como R.A.P.) é que é um ser virtual. R.A.P. não existe, não está, não atende, não comenta, não revela, não aparece e é sempre não numa quantidade de situações. Por isso quando se quer marcar um encontro, R.A.P. anuncia que se teletransportou para outros universos e não revela a data de materialização: «Estou em Cabo Verde... Estou em Londres... Estou em Israel... Estou em Roma...» Ou seja, o que ele quer realmente dizer é: Não estou! E, quando está, garante que do que gosta mesmo é de se fechar em casa.
É esta a ideia que a maioria dos portugueses têm de R.A.P.? Não, ninguém acreditará quando diz que não tira prazer de festas, feiras e romarias. Também se desconfiará quando revela que é dominado pelas três mulheres lá de casa ou que desconfia do poder de influência dos Gato Fedorento. Ou seja, para descodificar R.A.P. é preciso uma grande paciência, pois a primeira nega ao escrutínio que lhe queria fazer já veio por msg há mais de dois anos. Depois de várias tentativas, houve uma brecha e iniciaram-se as negociações para a conversa. Entretanto, meteram-se a fazer o programa Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios e o tempo escasseou. Depois, foi a vez de cumprir um exílio sabático enquanto dava mais umas negas. Finalmente, a brecha alargou-se e houve datas marcadas. Acenou com responder por escrito a umas perguntas iniciais enviadas a meio de Dezembro e, por fim, aceitou sentar-se à mesa para almoçar devido à justificação de que era preciso a sua presença física para tirar as fotografias que ilustram a entrevista.
O prato prometido era para ser lagosta mas acabou por ser substituído por um dim-sum num restaurante chinês. A razão era estratégica, encafuar R.A.P. num espaço que não lhe permitisse a fuga. O Mandarim, no rés do chão do Casino Estoril, era o ideal pois tem umas salas reservadas onde se pode ter uma conversa à vontade e evitar que os fãs deste Gato interrompessem a audição. R.A.P. aceitou a troca da ementa mas, quando viu que tinha sido atraído a uma armadilha, suspirou como se fosse um membro de uma triade apanhado num beco e à mercê dos seus carrascos. A sala só tinha uma porta, no meio uma mesa de interrogatório e, se tentasse fugir pela janela, teria que partir cinematograficamente o vidro. A reacção foi rápida, falar ao telemóvel durante 27 minutos e olhar para o relógio repetidamente até informar que tinha de ir buscar as filhas ao colégio às 15h30.
O drama que expôs, de que as filhas quase ficariam numa rua esconsa à sua espera, deu a entender que só teríamos uma hora e 44 minutos para estar no confessionário. Em desespero de causa, usou um último estratagema, o de falar pausadamente e responder a cada pergunta como se fossem as suas últimas palavras. Foram precisas duas cervejas chinesas para o distrair, enquanto o subchefe Ferreira ia trazendo os pratos a conta-gotas, como lhe tinha sido pedido, e explicar-lhe que só iria poder salvar as miúdas de um destino trágico se dissesse algo interessante na confissão que se segue.
Uma coisa ficou esclarecida enquanto a tortura chinesa ia avançando. Que quando se apanha finalmente R.A.P. para uma entrevista, vem-nos à mente aquela frase mítica dos primeiros tempos dos Gato Fedorento: «Quando vejo que há aí palhaços, pá, que falam falam falam falam, pá, e eu não os vejo a fazer nada, com certeza que fico chateado.» R.A.P. fala fala mas diz muito com substância, mesmo que a música lounge chinesa que acompanhou o almoço o pudesse perturbar. Cada resposta é como as crónicas que escreve – com princípio, meio e fim, faz um ar de surpresa (apesar de dizer que não é actor) de quando em vez se não se revê na pergunta, sabe aproveitar as deixas e gosta de controlar a situação. Ou seja, «há por aí palhaços» mas não me incluam no grupo; se não me vêem a «fazer nada» é porque me toparam e, por fim, «fico chateado» se me obrigam a ser o que não pretendo.
R.A.P. é virtual sim, apouca as suas virtudes sempre que pode e aprecia introduzir ironia no que diz. É a resposta para estes tempos de crise, porque, sendo um humorista que fez questão de ficar no desemprego após o último programa na televisão, a sua perfeita imitação de José Sócrates sempre lhe pode garantir uns cobres ao substituir o primeiro-ministro em situações com menos graça. O único embaraço que se pode atravessar à sua frente é Pinto da Costa continuar a fazer aparições públicas onde faz questão de exibir um talento comparável ao dos Gato Fedorento (a partir de agora referidos como os Gato). Entre uns crepes e umas coisas gelatinosas e esbranquiçadas com camarões no interior, pergunta-se-lhe se isso poderá acontecer.
Pinto da Costa ameaçou-o com um processo e fez uma rábula onde imitava os Gato. Pegou num dicionário e leu o significado das palavras fedorento, fétido e pútrido?
Embora ele diga putrido, com acento no i. De facto, a pedido de Miguel Sousa Tavares, Pinto da Costa processou o Zé Diogo Quintela. Já não é a primeira vez que nos processa e, apesar de ter perdido sempre, continua a fazê-lo. É um direito que lhe assiste, mas temo que esteja a gastar dinheiro que seria mais proveitosamente aplicado na compra de um dicionário que acentuasse correctamente as palavras esdrúxulas.
Porquê a pedido de M.S.T.?
Porque M.S.T. pediu, numa crónica, que o FC Porto abandonasse a sua postura pouco litigante e processasse o Zé Diogo. E Pinto da Costa assim fez. Essa declaração pública foi curiosa, porque Pinto da Costa quis inteirar-se do que significava ser um gato fedorento. Foi pesquisar a palavra fedorento, e daí foi para fétido. Viu o significado de fétido e foi para pútrido. E disse que, quando viu que um dos significados de pútrido era corrupto, parou e não pesquisou mais. Quem acompanha o futebol português não deve admirar-se com o facto de Pinto da Costa necessitar de ajuda para saber o que quer dizer a palavra fedorento, mas não precisar de ir ao dicionário para saber o significado da palavra corrupto.
Sentiram-se lesados com a apropriação de um estilo naquele sketch?
Nunca me sinto lesado quando Pinto da Costa afirma que não gosta de mim. Faz-me lembrar aquela tira de banda desenhada da Mafalda, que detesta sopa, e por isso anseia que o Fidel Castro diga que a sopa é óptima para que as pessoas passem a dizer que a sopa é má. É isso que me acontece com Pinto da Costa: quanto mais disser que sou mau, mais o país dirá «se calhar estes gajos até têm graça».
Rapidamente a polémica Pinto da Costa sai de cena quando chega mais um prato chinês à mesa. Afinal, falar de futebol com R.A.P. só tem um sentido: Benfica. Antes de abandonar o tema, é-lhe perguntado se gosta de ouvir os comentários futebolísticos do dr. Rui Santos. R.A.P. não esperava por esta importante questão mas não se desmancha: «Sempre que vejo, divirto-me.» Ver televisão não é importante para ele, que segue o lema do actor Nicolau Breyner quando este diz: «Para fazer televisão é um preço, mas para a ver é mais caro.» Ambos os actores, refere, aplicam essa tese aos programas que fazem na televisão. Antes que o subchefe Ferreira interrompa o lote de perguntas sobre televisão com outra chinesice, tenta-se saber o porquê dos Gato circularem por vários canais.
A SIC não vos larga, mesmo cobrando cachets muito caros. Porquê?
Só pode ser pela mesma razão que a PT nos quer a fazer anúncios: por sermos muito lindos.
A RTP largou. Foi por cobrarem cachets muito caros?
Não. A RTP pagava o mesmo que a SIC. Simplesmente, na hora de escolher, a RTP não tinha director de programas, e a SIC tinha aquele com quem já tínhamos trabalhado na RTP.
A TVI ainda não vos caçou por cobrarem cachets muito caros?
Acho que a TVI nunca mostrou grande interesse em nós. O que só lhe fica bem, aliás.
Depois de uma entrada mais profissional para relaxar o entrevistado, avança-se para áreas de que menos gosta. A vida privada é uma delas, por isso apetitosa para os leitores mais curiosos mas que desagrada a R.A.P.. Garante que não gosta de dar entrevistas porque não é a sua actividade favorita e porque não tem muita coisa para dizer. Acrescenta logo: «Como, aliás, creio que se nota.» R.A.P. desmerece-se frequentemente. À primeira, passa, à segunda, o chá quente queima a língua e diminui a reacção, mas há sempre aquela vez em que não se escapa, como no caso da aversão a entrevistas: «Não faz sentido estar a responder a todos os pedidos.» Mas não é só essa a razão: «Não é muito importante que as minhas palavras apareçam vertidas nos jornais exactamente como foram proferidas, mas aborrece-me quando inventam.» E, face ao rol de queixas, o assunto fica por aqui mesmo ou para a ERC tratar.
Há muita pressão para dar entrevistas?
Não é bem pressão. As pessoas pedem e eu recuso.
Para manter um low profile?
Não, não é uma estratégia. É só uma maneira de ser.
Sabe-se onde a maior parte dos artistas moram, mas no seu caso não. Na Wikipédia ainda está que mora na Margem Sul; não se vêem fotos suas num evento público...
Eu não sou muito dado a festas, feiras e romarias.
E revela também o nome das suas cadelas.
Não sei quem é o inventor desse verbete, mas está cheio de erros. Mas também, se os jornais estão sempre a imprimir informações erradas, porque é que a Wikipédia seria diferente?
São cadelas ou cães?
Cadelas. Chamam-se Lola e Flor, a propósito. Aproveito para fornecer essa interessantíssima informação. O nome da Flor já foi posto pelas minhas filhas. Elas propuseram duas hipóteses de nome: Flor ou Brincos de Princesa. Eu achei que teria alguma dificuldade em estar na rua a chamar Brincos de Princesa a um cão e por isso, apesar de ser um nome um pouco átono, optei por chamar Flor ao bicho.
Há quem não goste de ser fotografado a passear os cães. Isso incomoda-o?
Incomoda-me sempre que vêm emboscar-se para me fotografar quando estou em privado. Ninguém tem nada que ver com o que eu faço quando não estou a trabalhar.
E o que é que faz quando não está a fazer os Gato?
Tenho duas crónicas semanais para escrever – na Visão e n'A Bola –, o programa Governo Sombra, na TSF, e leio. Inscrevi-me num mestrado em Teoria da Literatura, na Faculdade de Letras. Repare que digo «inscrevi-me» e não «frequento», porque entretanto começou o programa e, com muita pena, deixei de conseguir lá ir. Antes, já me tinha inscrito no curso de Estudos Portugueses, na Universidade Nova, e fiz duas cadeiras. Fiz Introdução aos Estudos Literários, com o prof. Gustavo Rubim, e Literatura Portuguesa I, com o professor Fernando Cabral Martins. Tive 19 nas duas, o que significa que tenho média de 19 no curso. O facto de me faltarem umas 83 cadeiras para o acabar é, evidentemente, lateral.
Estudou em vários colégios de padres. Por castigo ou para lhe darem uma educação decente?
A razão deve ter sido a última, mas foi um plano que fracassou clamorosamente mesmo sendo os educadores freiras vicentinas e padres franciscanos e jesuítas. Eu não gosto nada de padrecas, pá. Mas gosto bastante de padres. E tive a sorte de, nesses colégios, ter encontrado sempre mais padres do que padrecas. Eu nem sou baptizado, mas nenhuma dessas pessoas alguma vez disse «o rapaz tem de ser baptizado». Nunca pretenderam converter-me. Claro que há uma perspectiva mais cínica sobre isso: a razão pela qual nunca tentaram converter-me não tem que ver com tolerância, mas com o facto de terem constatado que eu não tinha salvação possível.
Muda de vida quando se torna argumentista das Produções Fícticias. É amor ou humor à primeira vista?
Foi uma sucessão de acasos e de sorte, como quase tudo o que acontece na minha vida. A meio da faculdade fiz um curso de escrita criativa com o Rui Zink, que é amigo do Nuno Artur Silva, dono das Produções Fictícias (PF). Por sugestão do Rui, comecei a escrever, nas PF, textos para o Herman. Hoje, as Produções Fictícias são os nossos agentes e fazem a gestão do orçamento dos nossos programas, que são produzidos e escritos por nós. Mas na altura quis escrever textos humorísticos porque a capacidade de provocar o riso me interessava imenso. É quase absurdo que um ser humano se ria. O único animal que sabe que vai morrer é também o único que ri. Acho, aliás, que é disso que rimos: do facto de estarmos condenados à morte. Cada gargalhada que damos é uma manifestação de superioridade nossa em relação à morte. Provocar o riso é uma tarefa muito nobre. Ah, é verdade, e os textos humorísticos são mais bem pagos que os outros. Caso contrário, mandava a nobreza às malvas.
Se há que destacar um bom resultado nesta investida à vida mais privada de R.A.P., a resposta do nome não posto à cadela – Brincos de Princesa – é a grande revelação. Mas, para quem não desiste, lá se ouvirão mais meia dúzia delas. Nem mais uma, seis apenas: está casado há 12 anos; as filhas têm 4 e 6 anos e é do signo Touro. Esta não vale muito porque era fácil de saber, mas tem dois picantes: «Não acredito em signos, e seria mau se fosse uma influência, porque Salazar nasceu no mesmo dia e Hitler anda por perto.» As três importantes revelações em falta são: o pai era piloto e a mãe hospedeira – «Na altura era muito bom ser da TAP porque as estadas no estrangeiro duravam uma semana no Rio de Janeiro ou em Nova Iorque» – mas já estão reformados. E a última: «Sou ateu.» Há, no entanto, uma novidade a dar e que não é conhecida de todos os portugueses, que em privado existem poucas diferenças entre R.A.P. e Paul Newman. Já lá chegamos, depois de se saber porque é que usou tantas vezes como desculpa estar em viagem para adiar esta entrevista. A pergunta não é directa, para evitar ferir susceptibilidades…
Gosta de viajar. Portugal é um destino ou opta pelo estrangeiro, onde pode estar mais à vontade?
Gosto de estar à vontade, mas não fico embaraçado com o público que me aborda na rua a pedir autógrafos ou para tirar fotografias. É uma situação que não me causa qualquer espécie de engulho.
Por isso prefere o estrangeiro?
Não, eu gosto de viajar, mas o que gosto mesmo é de estar em casa.
Tem feito imensas viagens. Ninguém viaja tanto se não for por prazer
Sim. Gosto.
Quem prepara as viagens?
Eu não faço nada a esse respeito. O Paul Newman dizia uma coisa engraçada: «Em minha casa, eu decido sobre as grandes questões e a minha mulher sobre as pequenas. Ela decide se vivemos na costa leste ou oeste, que tipo de casa temos, em que colégio é que os filhos andam. E eu sou responsável pelas grandes questões: como é que se resolve o conflito israelo-árabe, qual deve ser a nossa posição sobre energia nuclear…» Comigo, é a mesma coisa. Não mando nada nem tenho responsabilidades práticas.
São as suas mulheres que decidem os destinos?
Escolhem tudo. Eu só mando no destino da viagem quando vou ver o Benfica ao estrangeiro. Pensando bem, quem decide isso é a UEFA. Confirma-se, eu nunca decido nada.
Tem medo de viajar de avião?
Tenho. No princípio dos Versículos Satânicos (de Salman Rushdie) o avião dos protagonistas explode e eles vêm em queda livre a rir à gargalhada. Pelo vistos é muito giro, mas mesmo assim não gostaria de experimentar.
Receia ataques terroristas?
Quando estou em Portugal não, porque os terroristas têm a inteligência de nos ignorar. No avião, também não. O meu terror é mesmo que aquilo caia.
Não há dúvida de que é um verdadeiro actor. R.A.P. adiou esta conversa justificando que estava em Cabo Verde, duas vezes em Londres, Egipto, Israel e Roma e evita falar de qualquer um destes destinos. A única abébia que dá aos leitores é ceder uma foto de uma destas terriolas, para fazer inveja. Castiguemo-lo, então, com questões sobre a profissão, para não o deixar provar os bolinhos de sésamo.
Já representou numa peça.
Não se pode chamar àquilo representar. O Pedro Mexia pensou em pegar nos textos do John Austin do livro Como Fazer Coisas com Palavras e fazer uma peça de teatro. Então, pensámos os dois nisso e achámos que era capaz de dar um espectáculo muito interessante, o que não veio a verificar-se. Foi divertido enquanto o preparámos, mas as actuações foram penosas.
Prefere fazer televisão ou teatro?
Não tenho especial interesse em representar em qualquer desses meios.
Nem pensa em fazer como a Rita Pereira e ir estudar para Nova Iorque ou ter sucesso nos EUA como a Daniela Ruah?
Não. Elas são actrizes e fico mesmo contente que a carreira da Daniela Ruah, por exemplo, esteja a correr bem. Foi muito corajosa, a decisão dela. Mas o meu interesse não é representar, não sou um actor. Recebo muitos convites para entrar em filmes, séries e peças, mas respondo sempre com a verdade: não sou actor. Às vezes dizem: «Mas é um trabalho tão giro!» E é, mas para actores. É a mesma coisa que dizerem que querem dar-me a oportunidade de arranjar a canalização do Taj Mahal. Para um canalizador deve ser óptimo, mas eu não percebo nada de canalização.
Vai continuar a recusar convites?
Sim. Não sou actor.
Mas nos Gato tem de compor personagens e representar!
Ali ninguém é actor, faz-se o melhor que se pode. Do ponto de vista da representação não temos nenhum talento criativo. Se houver alguma coisa é talento imitativo. Quando tenho de imitar uma personalidade pública, esforço-me para ver o que é que ela faz para sair igual, quando é uma personagem qualquer, escolho um tio ao calhas e imito-o.
Mas são imitações perfeitas. Treina muito?
Faço aquilo o maior número de vezes que consigo. Se for o Marcelo, passo a semana toda a falar como ele e a aborrecer toda a gente à minha volta. É uma questão de treino, de repetição. Não é talento.
Mesmo que não queiram, os Gato sucedem a uma linha de humoristas como Vasco Santana, António Silva, Raul Solnado e Herman José.
Gosto muito dos filmes deles, mas não me sinto herdeiro do Vasco Santana ou do António Silva. Nem continuador da sua tradição. Eles são de outro campeonato.
Não é o que os portugueses pensam.
É óbvio que todos vêem que há uma diferença clara entre mim e a Maria Rueff, por exemplo. Ela será a herdeira deles, eu não. Não sinto que esteja a continuar o que fizeram porque não estamos no mesmo ofício. Estarei mais perto de quem escrevia os seus guiões do que deles.
Quando foi a eleição dos grandes portugueses, ficou em 74.º lugar e António Lobo Antunes em 82.º?
A minha coroa de glória é Jorge Sampaio ter ficado atrás de mim.
Mas Eusébio ficou muito à frente.
Se dependesse de mim, o Eusébio teria ficado em primeiro. Mas essa lista era uma palhaçada. Havia dois lugares que eram claramente absurdos: o meu e o de um gajo chamado Oliveira qualquer coisa. Salazar, parece que era.
Temos sempre a ideia de que está ligado ao PCP e que foi membro da JCP...
Na verdade, é mais uma invenção. Nunca militei na JCP. Fiz-me militante do PCP aos 24 anos, após ter acabado a faculdade. Fui um militante muito pouco empenhado – mais uma característica adorável da minha personalidade –, e a minha militância resumiu-se a pagar as quotas durante algum tempo. O Mário Castrim tem um poema em que diz: «Realizo-me quando pago as quotas do partido.» Nunca me aconteceu, devo confessar. Mas paguei-as e, além disso, cheguei a servir sandes de panado e imperiais numa Festa do Avante! – que foi, creio, o ponto mais alto da minha militância. Fiquei colocado no café concerto, um sítio muito giro onde assisti a um espectáculo fabuloso do Manuel Freire. Ele cantou aquelas canções todas – as dele, as do Zeca Afonso, as do padre Fanhais, as do Adriano… Há pessoas que se comovem com histórias de amor, ou perante fotografias de gatinhos. Eu choro quando oiço o Portugal Ressuscitado. A sério. Aquela parte do «Agora, o povo unido nunca mais será vencido» dá sempre cabo de mim. Eu ainda sou do tempo em que o povo existia, sabe? Entretanto, foi extinto. Agora já o expulsaram da Constituição e tudo. Substituíram o povo pela expressão «pessoas». «As pessoas, unidas, jamais serão vencidas» não tem o mesmo encanto. E o Manuel Freire ainda fez aquilo a que poderíamos chamar um stand-up revolucionário. A meio da actuação disse: «O que eu gosto mais na Festa do Avante! é ver estes camaradas que daqui a dois anos vão ser secretários de Estado do PS. Assim, podemos despedir-nos deles já aqui.» Foi muito engraçado. Mas só eu é que achei graça.
Por isso, abandonou a vida partidária?
Já não sou militante do PCP e, na altura em que saí, comecei a escrever uma carta para me desfiliar, mas a carta foi ficando progressivamente mais pequena porque cada vez que voltava a escrevê-la tinha menos coisas para lhes dizer. Eles também devem ter cá um interesse em ouvir-me… Até que não escrevi carta nenhuma.
Não é filiado em algum partido?
Não. Não tenho nenhum interesse na política partidária. Inscrevi-me no PCP dez anos após a queda do Muro de Berlim. O partido vinha de uma derrota autárquica muito forte, e eu achei que era importante inscrever-me porque pensava – e penso ainda – que o Partido Comunista desempenha um papel importante na sociedade. Sou eu e o Melo Antunes. Acreditei mesmo que, naquela altura, o partido já tinha repudiado o regime soviético e o dos países do Leste. Houve dois ou três sinais de que essa crítica tinha sido feita. Mas, de repente, o líder da bancada parlamentar, que é um rapaz da minha idade, disse que não sabia bem se a Coreia do Norte era ou não uma democracia. E o Carlos Brito, o Luís Sá, o João Amaral e outros foram sendo empurrados para fora. E um senhor chamado Manoel de Lencastre escreveu no Avante! um artigo a dizer que o Estaline era um doce de ser humano. E… Portanto eu achei que, se calhar, ia andando. Sou um marxista não-leninista e o PCP nunca deixou de ser um partido marxista-leninista, o que dificulta a minha integração. Se eu pudesse, seria militante do PCP do Mário de Carvalho, do Luís Sá, do João Amaral. O problema é que esse PCP não existe. É uma pena.
Hoje revê-se em algum partido?
Não exactamente, mas isso não me causa transtornos de maior. Isso de uma pessoa ter de se rever inteiramente num partido para votar nele é uma mariquice. Voto em quem tenho de votar e acabou-se. Nunca votei à direita do PC. Ou voto no Bloco ou no PC. E nunca fiz segredo disso. Volta e meia dizem-me que é muito grave eu não ser imparcial. Eu quero que a imparcialidade se foda, sabe? A última foi uma jornalista que concorre a eleições – integrada num partido, obviamente. Acha que eu devia ser imparcial. Uma jornalista, note. Com actividade partidária activa. Nada contra, mas não me venha chatear. Eu não gosto de humoristas imparciais – aliás, tenho até dificuldade de me lembrar de algum. Prefiro pessoas que tenham… como é que se chama aquilo? Opiniões, é isso. O humor parte de um ponto de vista sobre a realidade, e cada humorista tem o seu. Não tem o seu e o dos outros. Quando vou ler o Woody Allen, o que me interessa é saber o que ele pensa sobre as coisas. Não quero que diga que é ateu e depois escreva que é muito religioso porque a ERC o obriga a dar uma no cravo e outra na ferradura.
O Bloco de Esquerda também não é uma opção fácil actualmente! Até Sócrates desmascarou Louçã...
Porque ele diz que os PPR não são vantajosos e tem um, não é? O mais surpreendente nisso é um deputado subscrever um Plano Poupança Reforma. As reformas deles são tão boas…
A nível ideológico, acha que estamos um pouco perdidos em Portugal?
Os partidos que ganham eleições não têm ideologia nenhuma. É por isso, aliás, que ganham as eleições. Os chamados catch-all party captam uma fatia de eleitorado muito larga justamente porque não se comprometem com coisa nenhuma. Curiosamente, nas europeias, o PS fez o contrário: em vez de não defender ideologia nenhuma, defendeu todas – menos a socialista, claro, que tradicionalmente é pouco popular entre os socialistas.
R.A.P. publicou, no fim de 2009, o seu segundo best seller: Novas Crónicas da Boca do Inferno. O índice onomástico revela os protagonistas preferenciais dos textos: José Sócrates e Manuela Ferreira Leite. A razão é simples, um exerce o poder e o outro é «a presidente do outro partido de poder. Em Portugal só há esses dois». Há um texto, A Importância de Ser Alegre, que nos liga às próximas eleições.
O que acha do candidato Manuel Alegre?
Acho que é um candidato que, sendo um socialista, como é óbvio, pode recolher o apoio dos partidos de esquerda. Se conseguir também o apoio do PS, pode ganhar as eleições. O Alexandre O’Neill tinha uma designação divertida para um certo tipo de poeta: o «baladeiro audaz». Confesso que Alegre me parece encaixar no perfil de baladeiro audaz. Mas creio que não terei outro remédio senão votar nele.
Não vai votar em Cavaco Silva porque não aceitou participar no Esmiúça os Sufrágios?
O Alegre também não aceitou...
Quando chega a sobremesa de maçã fá-si e bolinhos de leite, R.A.P. já está à beira de uma apoplexia porque, adverte, a estas horas as filhas já foram postas na rua. É possível acreditar num pai, mas num humorista dificilmente... Mesmo assim, abre-se-lhe a porta do reservado e deixa-se vestir o sobretudo da moda. Coloca os óculos escuros e parte a falar ao telemóvel. Uma funcionária diz para outra: «É muito mais alto do que parece na televisão.» Retém-se uma resposta sua: «Aquilo era televisão, não há nada de espontâneos. Foi surpreendente que aceitassem o convite para o Esmiúça, porque não era evidente que aquelas pessoas lá fossem e quisessem ser vistos na minha companhia.»
Retrato de um Gato
«Já era um arrogantezeco armado em bom antes de ser conhecido»
Ainda se lembra de quando não era um humorista famoso?
Sim. Não foi assim há tanto tempo. Mas posso garantir que a fama não me mudou. Eu já era um arrogantezeco armado em bom antes de ser conhecido.
Tem saudades desses tempos de ignorado?
Nem por isso. Saio pouco à rua, e em casa toda a gente me ignora. Não mudou assim tanto para provocar saudades.
Diz que inventam muito sobre a sua vida privada. Pensa nisso enquanto joga golfe?
Isso. Ponha-se com brincadeiras. A partir de agora, para todos os efeitos, passo a ser jogador de golfe. A imprensa censura a pouca sofisticação dos meus gostos, e por isso entretém-se a inventar outros, mais requintados. Só posso agradecer.
No outro dia, uma amiga viu-o no transiberiano.
Também nunca estive no transiberiano. Mas esse não é o único tipo de invenção. Há outros, também giros. Um que tem estado muito na moda tem que ver com os anúncios da PT. Já vi escrito nos jornais que os anúncios são escritos por nós. Pelos vistos, quem faz o anúncio é quem o escreve. Especialistas em publicidade parecem ignorar a existência de uma entidade chamada «agência de publicidade». Mas só funciona connosco. A Bárbara Guimarães não é responsável pelos diálogos daquele jantar sobre contas bancárias. Enfim, o que interessa é andarem entretidos. Tudo o que os afaste da droga…
E um amigo descobriu-o disfarçado a um canto do estádio do Sporting a ver o jogo com o FCP. Gosta de passar despercebido?
Essa, toda a gente vê que é mentira. O estádio de Alvalade tem estado tão vazio que ninguém consegue passar despercebido.
Depois de se ter visto naquele vídeo da RTP quando era novo cortou o cabelo quase à escovinha. Essa história é verdadeira ou foi uma invenção?
Foi invenção. Já rapo o cabelo há muito tempo. Três semanas sem cortar e fico com o penteado que o Pietra tinha nos anos oitenta.
Anda quase sempre de fato porque os Hugo Boss assentam-lhe bem?
A mim tudo me assenta bem. Quando se tem este porte físico tão elegante e proporcionado, até um fato de treino parece um smoking.
Qual foi a modelo ? não vale a pena dizer que nem a leu ? com quem mais gostou de contracenar na revista Playboy?
Eu não contracenei com nenhuma, meu amigo. Fui colocado na capa da Playboy à revelia. Um dia, quando me fui deitar, era um cidadão normal, no dia seguinte, quando acordei, era a Miss Dezembro. Sou uma espécie de Gregor Samsa da pouca-vergonha.
Alguma lhe telefonou a dizer que o queria ver como ela?
Quando a Playboy saiu, fui abordado por senhoras que confessavam alguma frustração por eu não estar nu na revista. Garanti-lhes que, se eu estivesse nu, a sua frustração seria bem maior. Há um passo do Manifesto Anti-Dantas em que o Almada diz que o Dantas, nu, é horroroso. Eu coro sempre que leio essa parte.
As meninas que contracenam com os Gato são normais. Não conseguem miúdas de espantar porquê?
Tem de me mostrar o seu caixote do lixo. As nossas actrizes são sempre muito bonitas. Pois se as mulheres só entram nos nossos sketches para serem objectificadas!...
As suas cadelas devem ser as únicas que gostam de um Gato e, ainda por cima, Fedorento?
Os meus cães nutrem por mim uma admiração extraordinária. Não é por acaso que lhes chamam animais irracionais, sabe?
O Gato literato
«Nenhum farmacêutico é Tolstoi, com excepção do que escreveu a posologia do Ben-U-Ron»
É coordenador de uma colecção de livros. É verdade que gosta mesmo de um triste como Charles Dickens?
É. Uma vez, durante o período em que os Pickwick Papers estavam a ser publicados em fascículos, um padre foi consolar um moribundo e falou-lhe longamente do que o esperava na vida eterna. No fim, o moribundo suspirou e disse: «Bom, o que interessa é que amanhã já sai mais um número dos Pickwick Papers.» Um homem cujos textos são aguardados com mais expectativa do que o paraíso merece a nossa admiração.
Os livros não tinham lombada por originalidade ou porque faltou dinheiro para os encadernar completamente?
A ausência de lombada é, em si, um manifesto, um modo de transmitir a ideia de que a comédia é o género que capta mais profundamente o ser humano, que o apresenta despojado de máscaras, de adereços, de maquilhagens. Estou a gozar, claro. Os livros não têm lombada porque fica bonitinho.
Já apresentou um livro de António Lobo Antunes. Teve paciência para o ler?
Não preciso de paciência para ler o Lobo Antunes. É sempre um prazer. Mas, na apresentação, a professora Maria Alzira Seixo estava mesmo à minha frente, na plateia, claramente a olhar para mim e a pensar: «Quem será este gajo?» Por isso, para mim, aquilo acabou por não ser bem uma apresentação de um livro. Foi uma oral sobre a obra do Lobo Antunes.
Já publicou dois livros de crónicas e vendeu mais do que qualquer jovem esperança da nossa literatura. Tem explicação para esse facto?
Sim. Quando as jovens esperanças da nossa literatura aparecerem na televisão a fazer momices passamos a vender o mesmo.
Escreveu que em grande queria ser escritor e futebolista.
Escritor e futebolista do Benfica. Não tinha interesse em ser futebolista. Descobri isso quando a minha avó morreu e fomos a sua casa arrumar as coisas. Encontrei esse livro guardado, daqueles da escola onde se pergunta o que queres ser quando fores grande e eu escrevi isso. Um facto que revela o discernimento de uma criança porque, como sabe, são duas profissões que normalmente vão a par. Os futebolistas são donos de um domínio da língua muito assinalável. No entanto, falhei nos dois desejos.
Mesmo escrevendo crónicas que o próprio Saramago disse que o obrigavam a começar a ler a Visão pelo fim?
Isso é muito simpático da parte dele, mas não faz de mim um escritor. Todos lêem a bula dos medicamentos mas nenhum farmacêutico é o Tolstoi. Com excepção, talvez, do que escreveu a posologia do Ben-U-Ron. Magistral, aquilo.
Tem vontade de escrever algo com mais fôlego do que a crónica?
Não sinto necessidade nem tenho intenção.
O Gato no futebol
«Meninas, se não forem do Benfica, caem-vos os dentes e o cabelo»
Vale e Azevedo faz-lhe falta para as rábulas?
Não, não. Vale e Azevedo não me faz falta para nada. Há um livro que reúne as crónicas de uma personagem que o Miguel Góis e eu escrevíamos para A Bola e aquilo é quase tudo a fazer pouco do Vale e Azevedo. Deu-nos muito material, mas não lhe agradeço. O que acontece no Benfica é que, quando há um presidente que tem, digamos, uma má relação com a honestidade, boa parte dos benfiquistas critica-o. Quem dera a todos poderem dizer o mesmo, não é? Estive três horas numa fila para votar no Vilarinho, para ver se as rábulas acabavam. Quero lá saber das rábulas.
Escolheu o Benfica porquê?
Essa é que é a grande pergunta. Não posso reclamar os louros dessa decisão porque, apesar de gostar muito de a poder reivindicar – muito embora ela demonstre um discernimento superior às minhas capacidades –, foi o meu primo António que me deu a catequese. Eu era muito pequeno e ele ia buscar-me a casa para me levar ao estádio porque os meus pais não ligavam a futebol. Nos últimos tempos, ele moderou um pouco (coisa que não lhe perdoo, aliás), mas naquela altura o meu primo tinha uma postura admirável, porque via o jogo a fumar um cigarro atrás de outro, a tremer, e torturado por tiques muito estranhos desde o princípio ao fim – coçava a nuca no colarinho, fazia sons com a boca... E eu lembro-me de estar a ver os jogos, observar aquele farrapo humano que era o meu primo durante noventa minutos e pensar: é isto que eu quero ser quando for grande.
Leva as suas filhas ao futebol?
Sim.
Gostam?
Claro. Como são pequeninas, é evidente que não exerço sobre elas uma pressão inadequada e adapto o discurso proselitista. Não me passa pela cabeça oprimi-las com a ideia de que têm de ser benfiquistas. O que lhes digo é: «Meninas, se não forem do Benfica, caem-vos os dentes todos e o cabelo também. E podem mesmo falecer.» Sem pressões.
Vê-se que confiam no pai?
Sim. Porque faço tudo com a maior consideração pela liberdade de escolha delas. Eu só as fiz sócias desde que nasceram e comprei-lhes as camisolas do Benfica para elas vestirem. Mas o número que se estampa nas costas é escolhido por elas. Acima de tudo, a democracia.
E a sua mulher é do Benfica?
Quando nos conhecemos tinha uma simpatia pelo Belenenses. Hoje, o meu sofrimento e o das filhas fazem que deseje ardentemente que o Benfica ganhe sempre.
Esmiuçar os Gato
«Daquela vez não falaram do Mário Crespo»
Os nomes que inventam para os vossos programas são um pouco estúpidos mas pegam. Os portugueses são assim tão fáceis de enganar?
Fico um pouco magoado com a observação de que os nomes são um pouco estúpidos. Tentamos que sejam muito estúpidos. O momento em que comunicamos ao director de programas o nome que escolhemos é sempre divertido. Desta vez, havia duas ou três pessoas da estrutura da SIC (do marketing, ou assim) que diziam que esmiúça era uma escolha trágica porque ninguém sabia o que era esmiuçar. Pumba, hoje esmiúça-se por tudo e por nada. O segredo é nunca supor que o público sabe menos do que nós.
Entrevistar muitos políticos foi fácil?
Foi. Na altura, os jornais disseram que as perguntas eram combinadas com os convidados, o que não faz sentido. Para quê? Seria tempo perdido. Toda a gente sabe que uma pessoa pode perguntar o que quiser a um político, que ele arranja sempre maneira de responder o que lhe apetece.
Qual o que deu mais trabalho?
O professor Marcelo. Senti que devia ter bebido trinta cafés antes do programa para poder rivalizar com a energia do professor.
Quando foi a vez de Mário Soares não lhe conseguiu cortar o pio. Respeitinho?
Nunca cortei a palavra a ninguém. Se eu apressasse as entrevistas, o programa ficaria com menos tempo e nós teríamos de escrever mais texto.
Acha que deixou a Joana Amaral Dias nervosa?
Se há facto da vida de que tenho conhecimento há muito é que um rapaz como eu não deixa nervosa uma rapariga como Joana Amaral Dias.
Foi fácil entrevistar Sócrates no Esmiúça?
A dificuldade principal foi convencê-lo a ir lá. O programa exigiu um esforço criativo maior do que é costume, por ser um programa diário, escrito por quatro gajos entre as 9h00 da manhã e a hora de o apresentar, e que tratava dos assuntos de que se tinha falado no próprio dia. Mas também exigiu um esforço, digamos, diplomático.
Para não espantar a caça?
Isso também. Se tivéssemos sido muito acintosos com o primeiro convidado já não teríamos ninguém a seguir. Mas o esforço diplomático principal foi conseguir convencer o primeiro-ministro e a líder da oposição a irem ao programa, o que ocupou muito tempo em reuniões com assessores para lhes explicar o que não ia acontecer. Foi um processo muito demorado, até porque houve um duelo táctico exasperante entre o primeiro-ministro e a líder da oposição: um só iria se o outro fosse. Esse jogo era muito perigoso para nós porque podia prolongar-se eternamente. Só na véspera da estreia do programa é que o PM confirmou que estaria presente no dia seguinte. E, mesmo assim, não deixava de ser uma promessa do primeiro-ministro, não é? Continuei a não dormir descansado nessa noite.
Como é que o convenceram?
Estávamos os quatro a almoçar com o Nuno Santos e a discutir o que seria o programa, e nisto entram no restaurante José Sócrates, Pedro Silva Pereira e o ministro da Justiça. Era uma boa oportunidade para o abordar e o Nuno Santos tomou a iniciativa de falar com o primeiro-ministro, logo ali. Excepcionalmente, daquela vez não falaram do Mário Crespo.
A primeira certeza sobre Ricardo Araújo Pereira (a partir de agora referido como R.A.P.) é que é um ser virtual. R.A.P. não existe, não está, não atende, não comenta, não revela, não aparece e é sempre não numa quantidade de situações. Por isso quando se quer marcar um encontro, R.A.P. anuncia que se teletransportou para outros universos e não revela a data de materialização: «Estou em Cabo Verde... Estou em Londres... Estou em Israel... Estou em Roma...» Ou seja, o que ele quer realmente dizer é: Não estou! E, quando está, garante que do que gosta mesmo é de se fechar em casa.
É esta a ideia que a maioria dos portugueses têm de R.A.P.? Não, ninguém acreditará quando diz que não tira prazer de festas, feiras e romarias. Também se desconfiará quando revela que é dominado pelas três mulheres lá de casa ou que desconfia do poder de influência dos Gato Fedorento. Ou seja, para descodificar R.A.P. é preciso uma grande paciência, pois a primeira nega ao escrutínio que lhe queria fazer já veio por msg há mais de dois anos. Depois de várias tentativas, houve uma brecha e iniciaram-se as negociações para a conversa. Entretanto, meteram-se a fazer o programa Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios e o tempo escasseou. Depois, foi a vez de cumprir um exílio sabático enquanto dava mais umas negas. Finalmente, a brecha alargou-se e houve datas marcadas. Acenou com responder por escrito a umas perguntas iniciais enviadas a meio de Dezembro e, por fim, aceitou sentar-se à mesa para almoçar devido à justificação de que era preciso a sua presença física para tirar as fotografias que ilustram a entrevista.
O prato prometido era para ser lagosta mas acabou por ser substituído por um dim-sum num restaurante chinês. A razão era estratégica, encafuar R.A.P. num espaço que não lhe permitisse a fuga. O Mandarim, no rés do chão do Casino Estoril, era o ideal pois tem umas salas reservadas onde se pode ter uma conversa à vontade e evitar que os fãs deste Gato interrompessem a audição. R.A.P. aceitou a troca da ementa mas, quando viu que tinha sido atraído a uma armadilha, suspirou como se fosse um membro de uma triade apanhado num beco e à mercê dos seus carrascos. A sala só tinha uma porta, no meio uma mesa de interrogatório e, se tentasse fugir pela janela, teria que partir cinematograficamente o vidro. A reacção foi rápida, falar ao telemóvel durante 27 minutos e olhar para o relógio repetidamente até informar que tinha de ir buscar as filhas ao colégio às 15h30.
O drama que expôs, de que as filhas quase ficariam numa rua esconsa à sua espera, deu a entender que só teríamos uma hora e 44 minutos para estar no confessionário. Em desespero de causa, usou um último estratagema, o de falar pausadamente e responder a cada pergunta como se fossem as suas últimas palavras. Foram precisas duas cervejas chinesas para o distrair, enquanto o subchefe Ferreira ia trazendo os pratos a conta-gotas, como lhe tinha sido pedido, e explicar-lhe que só iria poder salvar as miúdas de um destino trágico se dissesse algo interessante na confissão que se segue.
Uma coisa ficou esclarecida enquanto a tortura chinesa ia avançando. Que quando se apanha finalmente R.A.P. para uma entrevista, vem-nos à mente aquela frase mítica dos primeiros tempos dos Gato Fedorento: «Quando vejo que há aí palhaços, pá, que falam falam falam falam, pá, e eu não os vejo a fazer nada, com certeza que fico chateado.» R.A.P. fala fala mas diz muito com substância, mesmo que a música lounge chinesa que acompanhou o almoço o pudesse perturbar. Cada resposta é como as crónicas que escreve – com princípio, meio e fim, faz um ar de surpresa (apesar de dizer que não é actor) de quando em vez se não se revê na pergunta, sabe aproveitar as deixas e gosta de controlar a situação. Ou seja, «há por aí palhaços» mas não me incluam no grupo; se não me vêem a «fazer nada» é porque me toparam e, por fim, «fico chateado» se me obrigam a ser o que não pretendo.
R.A.P. é virtual sim, apouca as suas virtudes sempre que pode e aprecia introduzir ironia no que diz. É a resposta para estes tempos de crise, porque, sendo um humorista que fez questão de ficar no desemprego após o último programa na televisão, a sua perfeita imitação de José Sócrates sempre lhe pode garantir uns cobres ao substituir o primeiro-ministro em situações com menos graça. O único embaraço que se pode atravessar à sua frente é Pinto da Costa continuar a fazer aparições públicas onde faz questão de exibir um talento comparável ao dos Gato Fedorento (a partir de agora referidos como os Gato). Entre uns crepes e umas coisas gelatinosas e esbranquiçadas com camarões no interior, pergunta-se-lhe se isso poderá acontecer.
Pinto da Costa ameaçou-o com um processo e fez uma rábula onde imitava os Gato. Pegou num dicionário e leu o significado das palavras fedorento, fétido e pútrido?
Embora ele diga putrido, com acento no i. De facto, a pedido de Miguel Sousa Tavares, Pinto da Costa processou o Zé Diogo Quintela. Já não é a primeira vez que nos processa e, apesar de ter perdido sempre, continua a fazê-lo. É um direito que lhe assiste, mas temo que esteja a gastar dinheiro que seria mais proveitosamente aplicado na compra de um dicionário que acentuasse correctamente as palavras esdrúxulas.
Porquê a pedido de M.S.T.?
Porque M.S.T. pediu, numa crónica, que o FC Porto abandonasse a sua postura pouco litigante e processasse o Zé Diogo. E Pinto da Costa assim fez. Essa declaração pública foi curiosa, porque Pinto da Costa quis inteirar-se do que significava ser um gato fedorento. Foi pesquisar a palavra fedorento, e daí foi para fétido. Viu o significado de fétido e foi para pútrido. E disse que, quando viu que um dos significados de pútrido era corrupto, parou e não pesquisou mais. Quem acompanha o futebol português não deve admirar-se com o facto de Pinto da Costa necessitar de ajuda para saber o que quer dizer a palavra fedorento, mas não precisar de ir ao dicionário para saber o significado da palavra corrupto.
Sentiram-se lesados com a apropriação de um estilo naquele sketch?
Nunca me sinto lesado quando Pinto da Costa afirma que não gosta de mim. Faz-me lembrar aquela tira de banda desenhada da Mafalda, que detesta sopa, e por isso anseia que o Fidel Castro diga que a sopa é óptima para que as pessoas passem a dizer que a sopa é má. É isso que me acontece com Pinto da Costa: quanto mais disser que sou mau, mais o país dirá «se calhar estes gajos até têm graça».
Rapidamente a polémica Pinto da Costa sai de cena quando chega mais um prato chinês à mesa. Afinal, falar de futebol com R.A.P. só tem um sentido: Benfica. Antes de abandonar o tema, é-lhe perguntado se gosta de ouvir os comentários futebolísticos do dr. Rui Santos. R.A.P. não esperava por esta importante questão mas não se desmancha: «Sempre que vejo, divirto-me.» Ver televisão não é importante para ele, que segue o lema do actor Nicolau Breyner quando este diz: «Para fazer televisão é um preço, mas para a ver é mais caro.» Ambos os actores, refere, aplicam essa tese aos programas que fazem na televisão. Antes que o subchefe Ferreira interrompa o lote de perguntas sobre televisão com outra chinesice, tenta-se saber o porquê dos Gato circularem por vários canais.
A SIC não vos larga, mesmo cobrando cachets muito caros. Porquê?
Só pode ser pela mesma razão que a PT nos quer a fazer anúncios: por sermos muito lindos.
A RTP largou. Foi por cobrarem cachets muito caros?
Não. A RTP pagava o mesmo que a SIC. Simplesmente, na hora de escolher, a RTP não tinha director de programas, e a SIC tinha aquele com quem já tínhamos trabalhado na RTP.
A TVI ainda não vos caçou por cobrarem cachets muito caros?
Acho que a TVI nunca mostrou grande interesse em nós. O que só lhe fica bem, aliás.
Depois de uma entrada mais profissional para relaxar o entrevistado, avança-se para áreas de que menos gosta. A vida privada é uma delas, por isso apetitosa para os leitores mais curiosos mas que desagrada a R.A.P.. Garante que não gosta de dar entrevistas porque não é a sua actividade favorita e porque não tem muita coisa para dizer. Acrescenta logo: «Como, aliás, creio que se nota.» R.A.P. desmerece-se frequentemente. À primeira, passa, à segunda, o chá quente queima a língua e diminui a reacção, mas há sempre aquela vez em que não se escapa, como no caso da aversão a entrevistas: «Não faz sentido estar a responder a todos os pedidos.» Mas não é só essa a razão: «Não é muito importante que as minhas palavras apareçam vertidas nos jornais exactamente como foram proferidas, mas aborrece-me quando inventam.» E, face ao rol de queixas, o assunto fica por aqui mesmo ou para a ERC tratar.
Há muita pressão para dar entrevistas?
Não é bem pressão. As pessoas pedem e eu recuso.
Para manter um low profile?
Não, não é uma estratégia. É só uma maneira de ser.
Sabe-se onde a maior parte dos artistas moram, mas no seu caso não. Na Wikipédia ainda está que mora na Margem Sul; não se vêem fotos suas num evento público...
Eu não sou muito dado a festas, feiras e romarias.
E revela também o nome das suas cadelas.
Não sei quem é o inventor desse verbete, mas está cheio de erros. Mas também, se os jornais estão sempre a imprimir informações erradas, porque é que a Wikipédia seria diferente?
São cadelas ou cães?
Cadelas. Chamam-se Lola e Flor, a propósito. Aproveito para fornecer essa interessantíssima informação. O nome da Flor já foi posto pelas minhas filhas. Elas propuseram duas hipóteses de nome: Flor ou Brincos de Princesa. Eu achei que teria alguma dificuldade em estar na rua a chamar Brincos de Princesa a um cão e por isso, apesar de ser um nome um pouco átono, optei por chamar Flor ao bicho.
Há quem não goste de ser fotografado a passear os cães. Isso incomoda-o?
Incomoda-me sempre que vêm emboscar-se para me fotografar quando estou em privado. Ninguém tem nada que ver com o que eu faço quando não estou a trabalhar.
E o que é que faz quando não está a fazer os Gato?
Tenho duas crónicas semanais para escrever – na Visão e n'A Bola –, o programa Governo Sombra, na TSF, e leio. Inscrevi-me num mestrado em Teoria da Literatura, na Faculdade de Letras. Repare que digo «inscrevi-me» e não «frequento», porque entretanto começou o programa e, com muita pena, deixei de conseguir lá ir. Antes, já me tinha inscrito no curso de Estudos Portugueses, na Universidade Nova, e fiz duas cadeiras. Fiz Introdução aos Estudos Literários, com o prof. Gustavo Rubim, e Literatura Portuguesa I, com o professor Fernando Cabral Martins. Tive 19 nas duas, o que significa que tenho média de 19 no curso. O facto de me faltarem umas 83 cadeiras para o acabar é, evidentemente, lateral.
Estudou em vários colégios de padres. Por castigo ou para lhe darem uma educação decente?
A razão deve ter sido a última, mas foi um plano que fracassou clamorosamente mesmo sendo os educadores freiras vicentinas e padres franciscanos e jesuítas. Eu não gosto nada de padrecas, pá. Mas gosto bastante de padres. E tive a sorte de, nesses colégios, ter encontrado sempre mais padres do que padrecas. Eu nem sou baptizado, mas nenhuma dessas pessoas alguma vez disse «o rapaz tem de ser baptizado». Nunca pretenderam converter-me. Claro que há uma perspectiva mais cínica sobre isso: a razão pela qual nunca tentaram converter-me não tem que ver com tolerância, mas com o facto de terem constatado que eu não tinha salvação possível.
Muda de vida quando se torna argumentista das Produções Fícticias. É amor ou humor à primeira vista?
Foi uma sucessão de acasos e de sorte, como quase tudo o que acontece na minha vida. A meio da faculdade fiz um curso de escrita criativa com o Rui Zink, que é amigo do Nuno Artur Silva, dono das Produções Fictícias (PF). Por sugestão do Rui, comecei a escrever, nas PF, textos para o Herman. Hoje, as Produções Fictícias são os nossos agentes e fazem a gestão do orçamento dos nossos programas, que são produzidos e escritos por nós. Mas na altura quis escrever textos humorísticos porque a capacidade de provocar o riso me interessava imenso. É quase absurdo que um ser humano se ria. O único animal que sabe que vai morrer é também o único que ri. Acho, aliás, que é disso que rimos: do facto de estarmos condenados à morte. Cada gargalhada que damos é uma manifestação de superioridade nossa em relação à morte. Provocar o riso é uma tarefa muito nobre. Ah, é verdade, e os textos humorísticos são mais bem pagos que os outros. Caso contrário, mandava a nobreza às malvas.
Se há que destacar um bom resultado nesta investida à vida mais privada de R.A.P., a resposta do nome não posto à cadela – Brincos de Princesa – é a grande revelação. Mas, para quem não desiste, lá se ouvirão mais meia dúzia delas. Nem mais uma, seis apenas: está casado há 12 anos; as filhas têm 4 e 6 anos e é do signo Touro. Esta não vale muito porque era fácil de saber, mas tem dois picantes: «Não acredito em signos, e seria mau se fosse uma influência, porque Salazar nasceu no mesmo dia e Hitler anda por perto.» As três importantes revelações em falta são: o pai era piloto e a mãe hospedeira – «Na altura era muito bom ser da TAP porque as estadas no estrangeiro duravam uma semana no Rio de Janeiro ou em Nova Iorque» – mas já estão reformados. E a última: «Sou ateu.» Há, no entanto, uma novidade a dar e que não é conhecida de todos os portugueses, que em privado existem poucas diferenças entre R.A.P. e Paul Newman. Já lá chegamos, depois de se saber porque é que usou tantas vezes como desculpa estar em viagem para adiar esta entrevista. A pergunta não é directa, para evitar ferir susceptibilidades…
Gosta de viajar. Portugal é um destino ou opta pelo estrangeiro, onde pode estar mais à vontade?
Gosto de estar à vontade, mas não fico embaraçado com o público que me aborda na rua a pedir autógrafos ou para tirar fotografias. É uma situação que não me causa qualquer espécie de engulho.
Por isso prefere o estrangeiro?
Não, eu gosto de viajar, mas o que gosto mesmo é de estar em casa.
Tem feito imensas viagens. Ninguém viaja tanto se não for por prazer
Sim. Gosto.
Quem prepara as viagens?
Eu não faço nada a esse respeito. O Paul Newman dizia uma coisa engraçada: «Em minha casa, eu decido sobre as grandes questões e a minha mulher sobre as pequenas. Ela decide se vivemos na costa leste ou oeste, que tipo de casa temos, em que colégio é que os filhos andam. E eu sou responsável pelas grandes questões: como é que se resolve o conflito israelo-árabe, qual deve ser a nossa posição sobre energia nuclear…» Comigo, é a mesma coisa. Não mando nada nem tenho responsabilidades práticas.
São as suas mulheres que decidem os destinos?
Escolhem tudo. Eu só mando no destino da viagem quando vou ver o Benfica ao estrangeiro. Pensando bem, quem decide isso é a UEFA. Confirma-se, eu nunca decido nada.
Tem medo de viajar de avião?
Tenho. No princípio dos Versículos Satânicos (de Salman Rushdie) o avião dos protagonistas explode e eles vêm em queda livre a rir à gargalhada. Pelo vistos é muito giro, mas mesmo assim não gostaria de experimentar.
Receia ataques terroristas?
Quando estou em Portugal não, porque os terroristas têm a inteligência de nos ignorar. No avião, também não. O meu terror é mesmo que aquilo caia.
Não há dúvida de que é um verdadeiro actor. R.A.P. adiou esta conversa justificando que estava em Cabo Verde, duas vezes em Londres, Egipto, Israel e Roma e evita falar de qualquer um destes destinos. A única abébia que dá aos leitores é ceder uma foto de uma destas terriolas, para fazer inveja. Castiguemo-lo, então, com questões sobre a profissão, para não o deixar provar os bolinhos de sésamo.
Já representou numa peça.
Não se pode chamar àquilo representar. O Pedro Mexia pensou em pegar nos textos do John Austin do livro Como Fazer Coisas com Palavras e fazer uma peça de teatro. Então, pensámos os dois nisso e achámos que era capaz de dar um espectáculo muito interessante, o que não veio a verificar-se. Foi divertido enquanto o preparámos, mas as actuações foram penosas.
Prefere fazer televisão ou teatro?
Não tenho especial interesse em representar em qualquer desses meios.
Nem pensa em fazer como a Rita Pereira e ir estudar para Nova Iorque ou ter sucesso nos EUA como a Daniela Ruah?
Não. Elas são actrizes e fico mesmo contente que a carreira da Daniela Ruah, por exemplo, esteja a correr bem. Foi muito corajosa, a decisão dela. Mas o meu interesse não é representar, não sou um actor. Recebo muitos convites para entrar em filmes, séries e peças, mas respondo sempre com a verdade: não sou actor. Às vezes dizem: «Mas é um trabalho tão giro!» E é, mas para actores. É a mesma coisa que dizerem que querem dar-me a oportunidade de arranjar a canalização do Taj Mahal. Para um canalizador deve ser óptimo, mas eu não percebo nada de canalização.
Vai continuar a recusar convites?
Sim. Não sou actor.
Mas nos Gato tem de compor personagens e representar!
Ali ninguém é actor, faz-se o melhor que se pode. Do ponto de vista da representação não temos nenhum talento criativo. Se houver alguma coisa é talento imitativo. Quando tenho de imitar uma personalidade pública, esforço-me para ver o que é que ela faz para sair igual, quando é uma personagem qualquer, escolho um tio ao calhas e imito-o.
Mas são imitações perfeitas. Treina muito?
Faço aquilo o maior número de vezes que consigo. Se for o Marcelo, passo a semana toda a falar como ele e a aborrecer toda a gente à minha volta. É uma questão de treino, de repetição. Não é talento.
Mesmo que não queiram, os Gato sucedem a uma linha de humoristas como Vasco Santana, António Silva, Raul Solnado e Herman José.
Gosto muito dos filmes deles, mas não me sinto herdeiro do Vasco Santana ou do António Silva. Nem continuador da sua tradição. Eles são de outro campeonato.
Não é o que os portugueses pensam.
É óbvio que todos vêem que há uma diferença clara entre mim e a Maria Rueff, por exemplo. Ela será a herdeira deles, eu não. Não sinto que esteja a continuar o que fizeram porque não estamos no mesmo ofício. Estarei mais perto de quem escrevia os seus guiões do que deles.
Quando foi a eleição dos grandes portugueses, ficou em 74.º lugar e António Lobo Antunes em 82.º?
A minha coroa de glória é Jorge Sampaio ter ficado atrás de mim.
Mas Eusébio ficou muito à frente.
Se dependesse de mim, o Eusébio teria ficado em primeiro. Mas essa lista era uma palhaçada. Havia dois lugares que eram claramente absurdos: o meu e o de um gajo chamado Oliveira qualquer coisa. Salazar, parece que era.
Temos sempre a ideia de que está ligado ao PCP e que foi membro da JCP...
Na verdade, é mais uma invenção. Nunca militei na JCP. Fiz-me militante do PCP aos 24 anos, após ter acabado a faculdade. Fui um militante muito pouco empenhado – mais uma característica adorável da minha personalidade –, e a minha militância resumiu-se a pagar as quotas durante algum tempo. O Mário Castrim tem um poema em que diz: «Realizo-me quando pago as quotas do partido.» Nunca me aconteceu, devo confessar. Mas paguei-as e, além disso, cheguei a servir sandes de panado e imperiais numa Festa do Avante! – que foi, creio, o ponto mais alto da minha militância. Fiquei colocado no café concerto, um sítio muito giro onde assisti a um espectáculo fabuloso do Manuel Freire. Ele cantou aquelas canções todas – as dele, as do Zeca Afonso, as do padre Fanhais, as do Adriano… Há pessoas que se comovem com histórias de amor, ou perante fotografias de gatinhos. Eu choro quando oiço o Portugal Ressuscitado. A sério. Aquela parte do «Agora, o povo unido nunca mais será vencido» dá sempre cabo de mim. Eu ainda sou do tempo em que o povo existia, sabe? Entretanto, foi extinto. Agora já o expulsaram da Constituição e tudo. Substituíram o povo pela expressão «pessoas». «As pessoas, unidas, jamais serão vencidas» não tem o mesmo encanto. E o Manuel Freire ainda fez aquilo a que poderíamos chamar um stand-up revolucionário. A meio da actuação disse: «O que eu gosto mais na Festa do Avante! é ver estes camaradas que daqui a dois anos vão ser secretários de Estado do PS. Assim, podemos despedir-nos deles já aqui.» Foi muito engraçado. Mas só eu é que achei graça.
Por isso, abandonou a vida partidária?
Já não sou militante do PCP e, na altura em que saí, comecei a escrever uma carta para me desfiliar, mas a carta foi ficando progressivamente mais pequena porque cada vez que voltava a escrevê-la tinha menos coisas para lhes dizer. Eles também devem ter cá um interesse em ouvir-me… Até que não escrevi carta nenhuma.
Não é filiado em algum partido?
Não. Não tenho nenhum interesse na política partidária. Inscrevi-me no PCP dez anos após a queda do Muro de Berlim. O partido vinha de uma derrota autárquica muito forte, e eu achei que era importante inscrever-me porque pensava – e penso ainda – que o Partido Comunista desempenha um papel importante na sociedade. Sou eu e o Melo Antunes. Acreditei mesmo que, naquela altura, o partido já tinha repudiado o regime soviético e o dos países do Leste. Houve dois ou três sinais de que essa crítica tinha sido feita. Mas, de repente, o líder da bancada parlamentar, que é um rapaz da minha idade, disse que não sabia bem se a Coreia do Norte era ou não uma democracia. E o Carlos Brito, o Luís Sá, o João Amaral e outros foram sendo empurrados para fora. E um senhor chamado Manoel de Lencastre escreveu no Avante! um artigo a dizer que o Estaline era um doce de ser humano. E… Portanto eu achei que, se calhar, ia andando. Sou um marxista não-leninista e o PCP nunca deixou de ser um partido marxista-leninista, o que dificulta a minha integração. Se eu pudesse, seria militante do PCP do Mário de Carvalho, do Luís Sá, do João Amaral. O problema é que esse PCP não existe. É uma pena.
Hoje revê-se em algum partido?
Não exactamente, mas isso não me causa transtornos de maior. Isso de uma pessoa ter de se rever inteiramente num partido para votar nele é uma mariquice. Voto em quem tenho de votar e acabou-se. Nunca votei à direita do PC. Ou voto no Bloco ou no PC. E nunca fiz segredo disso. Volta e meia dizem-me que é muito grave eu não ser imparcial. Eu quero que a imparcialidade se foda, sabe? A última foi uma jornalista que concorre a eleições – integrada num partido, obviamente. Acha que eu devia ser imparcial. Uma jornalista, note. Com actividade partidária activa. Nada contra, mas não me venha chatear. Eu não gosto de humoristas imparciais – aliás, tenho até dificuldade de me lembrar de algum. Prefiro pessoas que tenham… como é que se chama aquilo? Opiniões, é isso. O humor parte de um ponto de vista sobre a realidade, e cada humorista tem o seu. Não tem o seu e o dos outros. Quando vou ler o Woody Allen, o que me interessa é saber o que ele pensa sobre as coisas. Não quero que diga que é ateu e depois escreva que é muito religioso porque a ERC o obriga a dar uma no cravo e outra na ferradura.
O Bloco de Esquerda também não é uma opção fácil actualmente! Até Sócrates desmascarou Louçã...
Porque ele diz que os PPR não são vantajosos e tem um, não é? O mais surpreendente nisso é um deputado subscrever um Plano Poupança Reforma. As reformas deles são tão boas…
A nível ideológico, acha que estamos um pouco perdidos em Portugal?
Os partidos que ganham eleições não têm ideologia nenhuma. É por isso, aliás, que ganham as eleições. Os chamados catch-all party captam uma fatia de eleitorado muito larga justamente porque não se comprometem com coisa nenhuma. Curiosamente, nas europeias, o PS fez o contrário: em vez de não defender ideologia nenhuma, defendeu todas – menos a socialista, claro, que tradicionalmente é pouco popular entre os socialistas.
R.A.P. publicou, no fim de 2009, o seu segundo best seller: Novas Crónicas da Boca do Inferno. O índice onomástico revela os protagonistas preferenciais dos textos: José Sócrates e Manuela Ferreira Leite. A razão é simples, um exerce o poder e o outro é «a presidente do outro partido de poder. Em Portugal só há esses dois». Há um texto, A Importância de Ser Alegre, que nos liga às próximas eleições.
O que acha do candidato Manuel Alegre?
Acho que é um candidato que, sendo um socialista, como é óbvio, pode recolher o apoio dos partidos de esquerda. Se conseguir também o apoio do PS, pode ganhar as eleições. O Alexandre O’Neill tinha uma designação divertida para um certo tipo de poeta: o «baladeiro audaz». Confesso que Alegre me parece encaixar no perfil de baladeiro audaz. Mas creio que não terei outro remédio senão votar nele.
Não vai votar em Cavaco Silva porque não aceitou participar no Esmiúça os Sufrágios?
O Alegre também não aceitou...
Quando chega a sobremesa de maçã fá-si e bolinhos de leite, R.A.P. já está à beira de uma apoplexia porque, adverte, a estas horas as filhas já foram postas na rua. É possível acreditar num pai, mas num humorista dificilmente... Mesmo assim, abre-se-lhe a porta do reservado e deixa-se vestir o sobretudo da moda. Coloca os óculos escuros e parte a falar ao telemóvel. Uma funcionária diz para outra: «É muito mais alto do que parece na televisão.» Retém-se uma resposta sua: «Aquilo era televisão, não há nada de espontâneos. Foi surpreendente que aceitassem o convite para o Esmiúça, porque não era evidente que aquelas pessoas lá fossem e quisessem ser vistos na minha companhia.»
Retrato de um Gato
«Já era um arrogantezeco armado em bom antes de ser conhecido»
Ainda se lembra de quando não era um humorista famoso?
Sim. Não foi assim há tanto tempo. Mas posso garantir que a fama não me mudou. Eu já era um arrogantezeco armado em bom antes de ser conhecido.
Tem saudades desses tempos de ignorado?
Nem por isso. Saio pouco à rua, e em casa toda a gente me ignora. Não mudou assim tanto para provocar saudades.
Diz que inventam muito sobre a sua vida privada. Pensa nisso enquanto joga golfe?
Isso. Ponha-se com brincadeiras. A partir de agora, para todos os efeitos, passo a ser jogador de golfe. A imprensa censura a pouca sofisticação dos meus gostos, e por isso entretém-se a inventar outros, mais requintados. Só posso agradecer.
No outro dia, uma amiga viu-o no transiberiano.
Também nunca estive no transiberiano. Mas esse não é o único tipo de invenção. Há outros, também giros. Um que tem estado muito na moda tem que ver com os anúncios da PT. Já vi escrito nos jornais que os anúncios são escritos por nós. Pelos vistos, quem faz o anúncio é quem o escreve. Especialistas em publicidade parecem ignorar a existência de uma entidade chamada «agência de publicidade». Mas só funciona connosco. A Bárbara Guimarães não é responsável pelos diálogos daquele jantar sobre contas bancárias. Enfim, o que interessa é andarem entretidos. Tudo o que os afaste da droga…
E um amigo descobriu-o disfarçado a um canto do estádio do Sporting a ver o jogo com o FCP. Gosta de passar despercebido?
Essa, toda a gente vê que é mentira. O estádio de Alvalade tem estado tão vazio que ninguém consegue passar despercebido.
Depois de se ter visto naquele vídeo da RTP quando era novo cortou o cabelo quase à escovinha. Essa história é verdadeira ou foi uma invenção?
Foi invenção. Já rapo o cabelo há muito tempo. Três semanas sem cortar e fico com o penteado que o Pietra tinha nos anos oitenta.
Anda quase sempre de fato porque os Hugo Boss assentam-lhe bem?
A mim tudo me assenta bem. Quando se tem este porte físico tão elegante e proporcionado, até um fato de treino parece um smoking.
Qual foi a modelo ? não vale a pena dizer que nem a leu ? com quem mais gostou de contracenar na revista Playboy?
Eu não contracenei com nenhuma, meu amigo. Fui colocado na capa da Playboy à revelia. Um dia, quando me fui deitar, era um cidadão normal, no dia seguinte, quando acordei, era a Miss Dezembro. Sou uma espécie de Gregor Samsa da pouca-vergonha.
Alguma lhe telefonou a dizer que o queria ver como ela?
Quando a Playboy saiu, fui abordado por senhoras que confessavam alguma frustração por eu não estar nu na revista. Garanti-lhes que, se eu estivesse nu, a sua frustração seria bem maior. Há um passo do Manifesto Anti-Dantas em que o Almada diz que o Dantas, nu, é horroroso. Eu coro sempre que leio essa parte.
As meninas que contracenam com os Gato são normais. Não conseguem miúdas de espantar porquê?
Tem de me mostrar o seu caixote do lixo. As nossas actrizes são sempre muito bonitas. Pois se as mulheres só entram nos nossos sketches para serem objectificadas!...
As suas cadelas devem ser as únicas que gostam de um Gato e, ainda por cima, Fedorento?
Os meus cães nutrem por mim uma admiração extraordinária. Não é por acaso que lhes chamam animais irracionais, sabe?
O Gato literato
«Nenhum farmacêutico é Tolstoi, com excepção do que escreveu a posologia do Ben-U-Ron»
É coordenador de uma colecção de livros. É verdade que gosta mesmo de um triste como Charles Dickens?
É. Uma vez, durante o período em que os Pickwick Papers estavam a ser publicados em fascículos, um padre foi consolar um moribundo e falou-lhe longamente do que o esperava na vida eterna. No fim, o moribundo suspirou e disse: «Bom, o que interessa é que amanhã já sai mais um número dos Pickwick Papers.» Um homem cujos textos são aguardados com mais expectativa do que o paraíso merece a nossa admiração.
Os livros não tinham lombada por originalidade ou porque faltou dinheiro para os encadernar completamente?
A ausência de lombada é, em si, um manifesto, um modo de transmitir a ideia de que a comédia é o género que capta mais profundamente o ser humano, que o apresenta despojado de máscaras, de adereços, de maquilhagens. Estou a gozar, claro. Os livros não têm lombada porque fica bonitinho.
Já apresentou um livro de António Lobo Antunes. Teve paciência para o ler?
Não preciso de paciência para ler o Lobo Antunes. É sempre um prazer. Mas, na apresentação, a professora Maria Alzira Seixo estava mesmo à minha frente, na plateia, claramente a olhar para mim e a pensar: «Quem será este gajo?» Por isso, para mim, aquilo acabou por não ser bem uma apresentação de um livro. Foi uma oral sobre a obra do Lobo Antunes.
Já publicou dois livros de crónicas e vendeu mais do que qualquer jovem esperança da nossa literatura. Tem explicação para esse facto?
Sim. Quando as jovens esperanças da nossa literatura aparecerem na televisão a fazer momices passamos a vender o mesmo.
Escreveu que em grande queria ser escritor e futebolista.
Escritor e futebolista do Benfica. Não tinha interesse em ser futebolista. Descobri isso quando a minha avó morreu e fomos a sua casa arrumar as coisas. Encontrei esse livro guardado, daqueles da escola onde se pergunta o que queres ser quando fores grande e eu escrevi isso. Um facto que revela o discernimento de uma criança porque, como sabe, são duas profissões que normalmente vão a par. Os futebolistas são donos de um domínio da língua muito assinalável. No entanto, falhei nos dois desejos.
Mesmo escrevendo crónicas que o próprio Saramago disse que o obrigavam a começar a ler a Visão pelo fim?
Isso é muito simpático da parte dele, mas não faz de mim um escritor. Todos lêem a bula dos medicamentos mas nenhum farmacêutico é o Tolstoi. Com excepção, talvez, do que escreveu a posologia do Ben-U-Ron. Magistral, aquilo.
Tem vontade de escrever algo com mais fôlego do que a crónica?
Não sinto necessidade nem tenho intenção.
O Gato no futebol
«Meninas, se não forem do Benfica, caem-vos os dentes e o cabelo»
Vale e Azevedo faz-lhe falta para as rábulas?
Não, não. Vale e Azevedo não me faz falta para nada. Há um livro que reúne as crónicas de uma personagem que o Miguel Góis e eu escrevíamos para A Bola e aquilo é quase tudo a fazer pouco do Vale e Azevedo. Deu-nos muito material, mas não lhe agradeço. O que acontece no Benfica é que, quando há um presidente que tem, digamos, uma má relação com a honestidade, boa parte dos benfiquistas critica-o. Quem dera a todos poderem dizer o mesmo, não é? Estive três horas numa fila para votar no Vilarinho, para ver se as rábulas acabavam. Quero lá saber das rábulas.
Escolheu o Benfica porquê?
Essa é que é a grande pergunta. Não posso reclamar os louros dessa decisão porque, apesar de gostar muito de a poder reivindicar – muito embora ela demonstre um discernimento superior às minhas capacidades –, foi o meu primo António que me deu a catequese. Eu era muito pequeno e ele ia buscar-me a casa para me levar ao estádio porque os meus pais não ligavam a futebol. Nos últimos tempos, ele moderou um pouco (coisa que não lhe perdoo, aliás), mas naquela altura o meu primo tinha uma postura admirável, porque via o jogo a fumar um cigarro atrás de outro, a tremer, e torturado por tiques muito estranhos desde o princípio ao fim – coçava a nuca no colarinho, fazia sons com a boca... E eu lembro-me de estar a ver os jogos, observar aquele farrapo humano que era o meu primo durante noventa minutos e pensar: é isto que eu quero ser quando for grande.
Leva as suas filhas ao futebol?
Sim.
Gostam?
Claro. Como são pequeninas, é evidente que não exerço sobre elas uma pressão inadequada e adapto o discurso proselitista. Não me passa pela cabeça oprimi-las com a ideia de que têm de ser benfiquistas. O que lhes digo é: «Meninas, se não forem do Benfica, caem-vos os dentes todos e o cabelo também. E podem mesmo falecer.» Sem pressões.
Vê-se que confiam no pai?
Sim. Porque faço tudo com a maior consideração pela liberdade de escolha delas. Eu só as fiz sócias desde que nasceram e comprei-lhes as camisolas do Benfica para elas vestirem. Mas o número que se estampa nas costas é escolhido por elas. Acima de tudo, a democracia.
E a sua mulher é do Benfica?
Quando nos conhecemos tinha uma simpatia pelo Belenenses. Hoje, o meu sofrimento e o das filhas fazem que deseje ardentemente que o Benfica ganhe sempre.
Esmiuçar os Gato
«Daquela vez não falaram do Mário Crespo»
Os nomes que inventam para os vossos programas são um pouco estúpidos mas pegam. Os portugueses são assim tão fáceis de enganar?
Fico um pouco magoado com a observação de que os nomes são um pouco estúpidos. Tentamos que sejam muito estúpidos. O momento em que comunicamos ao director de programas o nome que escolhemos é sempre divertido. Desta vez, havia duas ou três pessoas da estrutura da SIC (do marketing, ou assim) que diziam que esmiúça era uma escolha trágica porque ninguém sabia o que era esmiuçar. Pumba, hoje esmiúça-se por tudo e por nada. O segredo é nunca supor que o público sabe menos do que nós.
Entrevistar muitos políticos foi fácil?
Foi. Na altura, os jornais disseram que as perguntas eram combinadas com os convidados, o que não faz sentido. Para quê? Seria tempo perdido. Toda a gente sabe que uma pessoa pode perguntar o que quiser a um político, que ele arranja sempre maneira de responder o que lhe apetece.
Qual o que deu mais trabalho?
O professor Marcelo. Senti que devia ter bebido trinta cafés antes do programa para poder rivalizar com a energia do professor.
Quando foi a vez de Mário Soares não lhe conseguiu cortar o pio. Respeitinho?
Nunca cortei a palavra a ninguém. Se eu apressasse as entrevistas, o programa ficaria com menos tempo e nós teríamos de escrever mais texto.
Acha que deixou a Joana Amaral Dias nervosa?
Se há facto da vida de que tenho conhecimento há muito é que um rapaz como eu não deixa nervosa uma rapariga como Joana Amaral Dias.
Foi fácil entrevistar Sócrates no Esmiúça?
A dificuldade principal foi convencê-lo a ir lá. O programa exigiu um esforço criativo maior do que é costume, por ser um programa diário, escrito por quatro gajos entre as 9h00 da manhã e a hora de o apresentar, e que tratava dos assuntos de que se tinha falado no próprio dia. Mas também exigiu um esforço, digamos, diplomático.
Para não espantar a caça?
Isso também. Se tivéssemos sido muito acintosos com o primeiro convidado já não teríamos ninguém a seguir. Mas o esforço diplomático principal foi conseguir convencer o primeiro-ministro e a líder da oposição a irem ao programa, o que ocupou muito tempo em reuniões com assessores para lhes explicar o que não ia acontecer. Foi um processo muito demorado, até porque houve um duelo táctico exasperante entre o primeiro-ministro e a líder da oposição: um só iria se o outro fosse. Esse jogo era muito perigoso para nós porque podia prolongar-se eternamente. Só na véspera da estreia do programa é que o PM confirmou que estaria presente no dia seguinte. E, mesmo assim, não deixava de ser uma promessa do primeiro-ministro, não é? Continuei a não dormir descansado nessa noite.
Como é que o convenceram?
Estávamos os quatro a almoçar com o Nuno Santos e a discutir o que seria o programa, e nisto entram no restaurante José Sócrates, Pedro Silva Pereira e o ministro da Justiça. Era uma boa oportunidade para o abordar e o Nuno Santos tomou a iniciativa de falar com o primeiro-ministro, logo ali. Excepcionalmente, daquela vez não falaram do Mário Crespo.
sábado, fevereiro 20, 2010
Artigo de Opinião de Ricardo Araújo Pereira
Vamos contar mentiras
HÁ duas alturas em que uma equipa consegue fazer uma época mítica.
Uma é quando os seus jogadores praticam bom futebol, despacham os adversários com goleadas, enchem os estádios.
Outra é quando os seus adeptos se entretêm a inventar mitos. Na impossibilidade de verem a sua equipa cumprir os requisitos da primeira, há colunistas que se vêem forçados a optar pela segunda. É o caso de Miguel Sousa Tavares. A sua última crónica era um soberbo monumento de mistificação. Dizia ele sobre o Benfica: «[n]o último campeonato ganho, o do Trapattoni, (…) nos últimos dez jogos todos os golos dos encarnados aconteceram de penalty e livres inventados ou duvidosos à entrada da área». Ou seja: no ano em que o Porto teve três treinadores, e na mesma época em que obteve o recorde de maior derrota caseira da liga (os célebres 0-4 frente ao Nacional), como conseguiu o Benfica ganhar o campeonato? Como é óbvio, com o auxílio da arbitragem. De outro modo, não se concebe como teria podido superiorizar-se ao fortíssimo Porto de Del Neri, Fernandez e Couceiro. Não houve presidentes do Benfica a receber árbitros em casa, nem vice-presidentes apanhados a oferecer quinhentinhos, nem viagens pagas ao Brasil — mas foi demasiado evidente que os árbitros beneficiaram o Benfica naqueles «últimos dez jogos», em que «todos os golos dos encarnados aconteceram de penalty e livres inventados ou duvidosos à entrada da área». Só há um pequeníssimo problema. É que isto é mentira (lamento, mas não há outra palavra). Nos últimos dez jogos desse campeonato, o Benfica jogou, por exemplo, com o Gil Vicente. Ganhou por 2-0, com um golo de Mantorras de bola corrida, a passe de Manuel Fernandes, e outro de Miguel, também de bola corrida, a passe de João Pereira. Depois, jogou com o Setúbal. Voltou a ganhar por 2-0, com um golo de Manuel Fernandes de bola corrida (belo remate de fora da área) e outro de Geovanni, também de bola corrida, na sequência de jogada pela direita. A seguir, jogou com o Marítimo. Ganhou por 4-3, com dois belos golos de Nuno Gomes, ambos de bola corrida (um a passe de Miguel e outro após centro de Geovanni), outro de Mantorras, em lance de (talvez o leitor já tenha adivinhado) bola corrida, e ainda um de Miguel, em remate de fora da área, na sequência de livre de Simão. E ainda jogou com o Estoril. Ganhou por 2-1, com um golo de Mantorras, após um canto (não um penalty), e outro de Luisão, depois de um livre junto à bandeirola (não à entrada da área). Claro que houve jogos que o Benfica venceu com um golo de penalty, como o Benfica-Belenenses, curiosamente na mesma jornada em que o Porto ganhou por 1-0 ao Marítimo com um golo de McCarthy em fora-de-jogo. Mas, a menos que dez jogos tenham deixado de ser dez jogos, ou que a expressão «todos os golos dos encarnados» tenha deixado de significar «todos os golos dos encarnados», Sousa Tavares inventou um mito.
No entanto, o atraso de uma equipa no campeonato é directamente proporcional à capacidade de efabulação dos seus adeptos. Não se estranha, portanto, que Sousa Tavares tenha prosseguido: «lembro-me bem do penalty decisivo, no último jogo no Bessa, que foi dos mais anedóticos que já vi assinalado». Mais uma vez, é mentira (peço desculpa, mas não há mesmo melhor palavra) que o penalty tenha sido decisivo. O Benfica terminou o campeonato três pontos à frente do Porto. Sem o ponto que aquele penalty garantiu, teria sido campeão na mesma. Resumindo: como o Porto (ainda) não consegue vencer campeonatos estando dois pontos atrás do primeiro classificado, aquele penalty não foi, de todo, decisivo.
Finalmente, a propósito do golo do Braga, diz Sousa Tavares que «entre a saída da bola e o golo decorreram uns trinta ou quarenta segundos em que a bola passou por uns seis jogadores e poderia ter sido umas três vezes definitivamente afastada pelos jogadores do Marítimo antes do belíssimo pontapé fatal de Luís Aguiar.» Permitam-me que atalhe para informar que isto é, como dizer?, mentira. Entre a saída da bola e o golo decorreram, não quarenta, não trinta, nem mesmo vinte, mas dez segundos. E a bola passou por dois jogadores do Marítimo que, no meio de sucessivos ressaltos, não conseguiram sequer tirá-la da grande área. A título de exemplo, compare-se com o golo do Benfica ao Porto. Entre o fora-de-jogo de Urreta e o belíssimo pontapé fatal de Saviola decorreram 13 segundos. E a bola é tocada por quatro jogadores do Porto que conseguem afastá-la para bem longe da área. A diferença é que o lance do Braga é uma minudência, mas o do Benfica é uma mancha que ficará para todo o sempre.
É o que costuma acontecer aos moralistas: tanto tempo a acusar o Benfica de querer ganhar fora do campo, e afinal é o Braga que faz jogadas fora das quatro linhas. Domingos Paciência, que tem historial de estar a olhar para o chão e não conseguir ver lances polémicos, compreendeu o fiscal de linha. Disse que, provavelmente, o árbitro auxiliar não viu a bola fora porque «estava muito perto». Trata-se de uma hipótese brilhante. Pessoalmente, sempre achei que isto de colocarem os fiscais de linha junto da linha era uma estupidez. Em todo o caso, quando o Braga visitar o Benfica, talvez seja bom que Jorge Jesus jogue com dois laterais de cada lado. Um do lado de dentro da linha, outro do lado de fora.
Segundo a opinião insuspeita e prestigiada de Cruz dos Santos, apesar do que por aí se berrou e dos cabelos que se arrancaram, não é certo que tenha havido penalty sobre Ruben Micael no jogo contra o Leixões. Ruben Micael protestou, mas a verdade é que Ruben Micael protesta contra todas as decisões de todos os árbitros. Aparentemente, alguém deve dinheiro a Ruben Micael, ao menos tendo em conta a superioridade chorona que ele exibe em todas as ocasiões. É muito divertida, aquela indolência sobranceira própria de quem parece estar convencido de que é o melhor jogador português. O drama de Ruben Micael é que nem sequer é o melhor jogador madeirense.
Na Luz, embora o futebol tenha sido menos bom do que é costume, o teatro foi de alto coturno. Comovente, o modo como Bruno Vale, depois de cortar a bola com a mão, tentou enganar o árbitro fingindo ter levado com ela na cara. Foi um bom momento, mas é uma estratégia que não resulta em qualquer estádio. No Dragão, por exemplo, os guarda-redes são expulsos mesmo quando levam com a bola na cara.
Hulk incorreu numa infracção punível com uma pena de seis meses a três anos. Em princípio, se houvesse circunstâncias atenuantes, seria punido com um castigo mais próximo dos seis meses. Se houvesse circunstâncias agravantes, seria punido com uma pena mais próxima dos três anos. Apanhou quatro meses. Recordo que a lei previa um mínimo de seis. A Comissão de Disciplina alega a existência de uma forte atenuante: Hulk foi provocado. Ficou provado que os stewards não insultaram nem agrediram (enfim, o equivalente ao Guarda Abel, como muito perspicazmente têm assinalado vários adeptos do quarto classificado). Mas, ainda assim, conseguiram provocar. As piores provocações são, como sabemos, as que não consistem em insultos nem em agressões. Daí constituírem as melhores atenuantes, e contribuírem para uma punição inferior ao que a lei estipula. Vamos supor que, em vez de uma atenuante, a Comissão tinha identificado uma agravante. Alguém acredita que Hulk tivesse sido punido com um castigo superior ao limite máximo
HÁ duas alturas em que uma equipa consegue fazer uma época mítica.
Uma é quando os seus jogadores praticam bom futebol, despacham os adversários com goleadas, enchem os estádios.
Outra é quando os seus adeptos se entretêm a inventar mitos. Na impossibilidade de verem a sua equipa cumprir os requisitos da primeira, há colunistas que se vêem forçados a optar pela segunda. É o caso de Miguel Sousa Tavares. A sua última crónica era um soberbo monumento de mistificação. Dizia ele sobre o Benfica: «[n]o último campeonato ganho, o do Trapattoni, (…) nos últimos dez jogos todos os golos dos encarnados aconteceram de penalty e livres inventados ou duvidosos à entrada da área». Ou seja: no ano em que o Porto teve três treinadores, e na mesma época em que obteve o recorde de maior derrota caseira da liga (os célebres 0-4 frente ao Nacional), como conseguiu o Benfica ganhar o campeonato? Como é óbvio, com o auxílio da arbitragem. De outro modo, não se concebe como teria podido superiorizar-se ao fortíssimo Porto de Del Neri, Fernandez e Couceiro. Não houve presidentes do Benfica a receber árbitros em casa, nem vice-presidentes apanhados a oferecer quinhentinhos, nem viagens pagas ao Brasil — mas foi demasiado evidente que os árbitros beneficiaram o Benfica naqueles «últimos dez jogos», em que «todos os golos dos encarnados aconteceram de penalty e livres inventados ou duvidosos à entrada da área». Só há um pequeníssimo problema. É que isto é mentira (lamento, mas não há outra palavra). Nos últimos dez jogos desse campeonato, o Benfica jogou, por exemplo, com o Gil Vicente. Ganhou por 2-0, com um golo de Mantorras de bola corrida, a passe de Manuel Fernandes, e outro de Miguel, também de bola corrida, a passe de João Pereira. Depois, jogou com o Setúbal. Voltou a ganhar por 2-0, com um golo de Manuel Fernandes de bola corrida (belo remate de fora da área) e outro de Geovanni, também de bola corrida, na sequência de jogada pela direita. A seguir, jogou com o Marítimo. Ganhou por 4-3, com dois belos golos de Nuno Gomes, ambos de bola corrida (um a passe de Miguel e outro após centro de Geovanni), outro de Mantorras, em lance de (talvez o leitor já tenha adivinhado) bola corrida, e ainda um de Miguel, em remate de fora da área, na sequência de livre de Simão. E ainda jogou com o Estoril. Ganhou por 2-1, com um golo de Mantorras, após um canto (não um penalty), e outro de Luisão, depois de um livre junto à bandeirola (não à entrada da área). Claro que houve jogos que o Benfica venceu com um golo de penalty, como o Benfica-Belenenses, curiosamente na mesma jornada em que o Porto ganhou por 1-0 ao Marítimo com um golo de McCarthy em fora-de-jogo. Mas, a menos que dez jogos tenham deixado de ser dez jogos, ou que a expressão «todos os golos dos encarnados» tenha deixado de significar «todos os golos dos encarnados», Sousa Tavares inventou um mito.
No entanto, o atraso de uma equipa no campeonato é directamente proporcional à capacidade de efabulação dos seus adeptos. Não se estranha, portanto, que Sousa Tavares tenha prosseguido: «lembro-me bem do penalty decisivo, no último jogo no Bessa, que foi dos mais anedóticos que já vi assinalado». Mais uma vez, é mentira (peço desculpa, mas não há mesmo melhor palavra) que o penalty tenha sido decisivo. O Benfica terminou o campeonato três pontos à frente do Porto. Sem o ponto que aquele penalty garantiu, teria sido campeão na mesma. Resumindo: como o Porto (ainda) não consegue vencer campeonatos estando dois pontos atrás do primeiro classificado, aquele penalty não foi, de todo, decisivo.
Finalmente, a propósito do golo do Braga, diz Sousa Tavares que «entre a saída da bola e o golo decorreram uns trinta ou quarenta segundos em que a bola passou por uns seis jogadores e poderia ter sido umas três vezes definitivamente afastada pelos jogadores do Marítimo antes do belíssimo pontapé fatal de Luís Aguiar.» Permitam-me que atalhe para informar que isto é, como dizer?, mentira. Entre a saída da bola e o golo decorreram, não quarenta, não trinta, nem mesmo vinte, mas dez segundos. E a bola passou por dois jogadores do Marítimo que, no meio de sucessivos ressaltos, não conseguiram sequer tirá-la da grande área. A título de exemplo, compare-se com o golo do Benfica ao Porto. Entre o fora-de-jogo de Urreta e o belíssimo pontapé fatal de Saviola decorreram 13 segundos. E a bola é tocada por quatro jogadores do Porto que conseguem afastá-la para bem longe da área. A diferença é que o lance do Braga é uma minudência, mas o do Benfica é uma mancha que ficará para todo o sempre.
É o que costuma acontecer aos moralistas: tanto tempo a acusar o Benfica de querer ganhar fora do campo, e afinal é o Braga que faz jogadas fora das quatro linhas. Domingos Paciência, que tem historial de estar a olhar para o chão e não conseguir ver lances polémicos, compreendeu o fiscal de linha. Disse que, provavelmente, o árbitro auxiliar não viu a bola fora porque «estava muito perto». Trata-se de uma hipótese brilhante. Pessoalmente, sempre achei que isto de colocarem os fiscais de linha junto da linha era uma estupidez. Em todo o caso, quando o Braga visitar o Benfica, talvez seja bom que Jorge Jesus jogue com dois laterais de cada lado. Um do lado de dentro da linha, outro do lado de fora.
Segundo a opinião insuspeita e prestigiada de Cruz dos Santos, apesar do que por aí se berrou e dos cabelos que se arrancaram, não é certo que tenha havido penalty sobre Ruben Micael no jogo contra o Leixões. Ruben Micael protestou, mas a verdade é que Ruben Micael protesta contra todas as decisões de todos os árbitros. Aparentemente, alguém deve dinheiro a Ruben Micael, ao menos tendo em conta a superioridade chorona que ele exibe em todas as ocasiões. É muito divertida, aquela indolência sobranceira própria de quem parece estar convencido de que é o melhor jogador português. O drama de Ruben Micael é que nem sequer é o melhor jogador madeirense.
Na Luz, embora o futebol tenha sido menos bom do que é costume, o teatro foi de alto coturno. Comovente, o modo como Bruno Vale, depois de cortar a bola com a mão, tentou enganar o árbitro fingindo ter levado com ela na cara. Foi um bom momento, mas é uma estratégia que não resulta em qualquer estádio. No Dragão, por exemplo, os guarda-redes são expulsos mesmo quando levam com a bola na cara.
Hulk incorreu numa infracção punível com uma pena de seis meses a três anos. Em princípio, se houvesse circunstâncias atenuantes, seria punido com um castigo mais próximo dos seis meses. Se houvesse circunstâncias agravantes, seria punido com uma pena mais próxima dos três anos. Apanhou quatro meses. Recordo que a lei previa um mínimo de seis. A Comissão de Disciplina alega a existência de uma forte atenuante: Hulk foi provocado. Ficou provado que os stewards não insultaram nem agrediram (enfim, o equivalente ao Guarda Abel, como muito perspicazmente têm assinalado vários adeptos do quarto classificado). Mas, ainda assim, conseguiram provocar. As piores provocações são, como sabemos, as que não consistem em insultos nem em agressões. Daí constituírem as melhores atenuantes, e contribuírem para uma punição inferior ao que a lei estipula. Vamos supor que, em vez de uma atenuante, a Comissão tinha identificado uma agravante. Alguém acredita que Hulk tivesse sido punido com um castigo superior ao limite máximo
sexta-feira, fevereiro 19, 2010
Artigo de Opinião de Luís Avelãs
Ainda não foi desta que o Benfica conseguiu regressar da Alemanha com uma vitória no bolso em embates referentes às competições europeias. E, bem vistas as coisas, não deve ter tido muitas oportunidades tão claras para, com relativa facilidade, acabar com esta longa série de 18 partidas (6 empates e 12 derrotas) a "jejuar".
É verdade que as águias empataram e que, em relação ao essencial (seguir em frente na Liga Europa), deram um passo importante, até porque marcaram em terreno alheio. No entanto, quem viu o jogo tem perfeita noção que a igualdade não pode ser encarada como um bom resultado. É que o opositor não é o Bayern Munique ou outra qualquer formação do topo da Bundesliga. Estamos a falar do "lanterna vermelha" do campeonato germânico, um conjunto com 2-3 bons elementos mas que, globalmente, é fraquinho. Isso já se tinha constatado nos duelos com o Sporting e ficou comprovado quinta-feira.
Começando o jogo logo a ganhar (Di Maria tem mesmo queda para marcar na Alemanha), o Benfica fez, de seguida, o que lhe competia: segurou a bola e o jogo. E se é verdade que os locais, numa fase de maior atrevimento, até atiraram ao poste, num lance que podia, perfeitamente, ter acabado na baliza à guarda de Júlio César, creio que o Hertha só evitou a derrota porque o Benfica conseguiu marcar na sua própria baliza.
Depois de Setúbal, também na capital alemã, foi a azelhice momentânea dos benfiquistas (desta vez envolvendo o "marcador" e o guardião) a impedir a concretização de um triunfo que, com maior ou menor dificuldade, deveria ter ocorrido. Ainda assim, reafirmo, a eliminatória está inclinada para o lado português. Objectivamente por causa do golo apontado fora e, em teoria, porque este Benfica está a léguas do Hertha no que diz respeito a potencial e qualidade futebolística. Resta, "apenas", confirmar tudo isso na próxima semana, na Luz...
PS - Se é indesmentível a superioridade dos pupilos de Jorge Jesus neste duelo luso-germânico, convém realçar que, tal como sucedeu em alguns dos embates anteriores, o Benfica voltou a não conseguir uma exibição de qualidade. A temperatura, o desgaste acumulado, a ausência de Aimar no onze, etc, etc são factores que ajudam a explicar essa quebra de rendimento, mas a verdade é que a equipa já rendeu mais. A questão é que, nesta fase da época, é preciso ter resultados positivos apesar das prestações menos conseguidas. Na Alemanha, o 1-1 serviu as pretensões, mas em Setúbal não...
É verdade que as águias empataram e que, em relação ao essencial (seguir em frente na Liga Europa), deram um passo importante, até porque marcaram em terreno alheio. No entanto, quem viu o jogo tem perfeita noção que a igualdade não pode ser encarada como um bom resultado. É que o opositor não é o Bayern Munique ou outra qualquer formação do topo da Bundesliga. Estamos a falar do "lanterna vermelha" do campeonato germânico, um conjunto com 2-3 bons elementos mas que, globalmente, é fraquinho. Isso já se tinha constatado nos duelos com o Sporting e ficou comprovado quinta-feira.
Começando o jogo logo a ganhar (Di Maria tem mesmo queda para marcar na Alemanha), o Benfica fez, de seguida, o que lhe competia: segurou a bola e o jogo. E se é verdade que os locais, numa fase de maior atrevimento, até atiraram ao poste, num lance que podia, perfeitamente, ter acabado na baliza à guarda de Júlio César, creio que o Hertha só evitou a derrota porque o Benfica conseguiu marcar na sua própria baliza.
Depois de Setúbal, também na capital alemã, foi a azelhice momentânea dos benfiquistas (desta vez envolvendo o "marcador" e o guardião) a impedir a concretização de um triunfo que, com maior ou menor dificuldade, deveria ter ocorrido. Ainda assim, reafirmo, a eliminatória está inclinada para o lado português. Objectivamente por causa do golo apontado fora e, em teoria, porque este Benfica está a léguas do Hertha no que diz respeito a potencial e qualidade futebolística. Resta, "apenas", confirmar tudo isso na próxima semana, na Luz...
PS - Se é indesmentível a superioridade dos pupilos de Jorge Jesus neste duelo luso-germânico, convém realçar que, tal como sucedeu em alguns dos embates anteriores, o Benfica voltou a não conseguir uma exibição de qualidade. A temperatura, o desgaste acumulado, a ausência de Aimar no onze, etc, etc são factores que ajudam a explicar essa quebra de rendimento, mas a verdade é que a equipa já rendeu mais. A questão é que, nesta fase da época, é preciso ter resultados positivos apesar das prestações menos conseguidas. Na Alemanha, o 1-1 serviu as pretensões, mas em Setúbal não...
quinta-feira, fevereiro 18, 2010
Espaço Prof. Karamba
V. Setúbal - Naval
Olhanense - Sporting
Belenenses - Académica
Rio Ave - P. Ferreira
Marítimo - Nacional
V. Guimarães - Leixões
FC Porto - Sp. Braga
Olhanense - Sporting
Belenenses - Académica
Rio Ave - P. Ferreira
Marítimo - Nacional
V. Guimarães - Leixões
FC Porto - Sp. Braga
David Luiz em discurso directo
Há algo de especial em David Luiz. Chegou a Portugal com apenas 19 anos e não demorou muito tempo a tornar-se num dos símbolos do actual Benfica. A raça, a alegria e o entusiasmo que deixa em campo transformaram o defesa brasileiro num ídolo para os adeptos benfiquistas, num elemento indispensável para uma equipa que entusiasma as bancadas do Estádio da Luz como há muito tempo não se via.
A idade pouco importa. Aos 22 anos, David Luiz demonstra uma maturidade bem acima da média e muita classe em todas as acções de jogo. É defesa central, mas empolga os adeptos cada vez que sobe no terreno com a bola controlada, já jogou a lateral esquerdo mas, se for preciso, está disposto a actuar como guarda-redes ou ponta-de-lança para ajudar a equipa. Sempre com a vitória em mente, o sucesso que tem tido no Benfica não é muito difícil de explicar.
“Não há muitos segredos, apenas temos que respeitar o público e a instituição que representamos para merecer vestir a camisola do Benfica. A idade representa pouco. Podemos ser jovens aos 34 e maduros aos 20. Na minha idade, julgo que cheguei a um bom compromisso. Amadureci muito desde que cheguei à Europa, gosto do que faço e tenho um tremendo respeito pelos sócios e adeptos que nos apoiam a cada fim de semana no estádio”, revela David Luiz ao FIFA.com.
O brasileiro gosta de assumir a responsabilidade. Pelo tal “respeito aos adeptos e ao clube”, pela consciência que é preciso devolver, dentro de campo, o apoio que sente por parte das bancadas do Estádio da Luz. “Um jogador tem de saber que os adeptos devem ‘cobrar’ e que tem de dar tudo o que está ao seu alcance. Sempre”, destaca o atleta que, também por isso, está disposto a todos os sacrifícios para fazer aquilo de que gosta: “A partir daí, então, podemos falar das capacidades individuais. Sou central, é nesse posto que me sinto mais à vontade, mas se for necessário jogo na baliza ou a avançado! Tenho de dar graças de ter o privilégio de fazer aquilo que amo”, afirma.
Futuro a verde e amarelo
Esta época, David Luiz só falhou jogos por castigo ou por lesão. É um indiscutível no centro da defesa, onde faz dupla com o compatriota e internacional brasileiro Luisão. Apesar de ter saído do Brasil muito novo, tem a consciência que as suas exibições não passam despercebidas no outro lado do Oceano Atlântico, como ponto de partida para um sonho que ainda não se tornou numa obsessão. “Os responsáveis da selecção brasileira estão atentos ao trabalho de muitos jogadores que jogam fora do Brasil”, começa por dizer o defensor.
“Representar a selecção brasileira é algo que qualquer jogador deseja. Mas temos de saber que há muitos e bons jogadores para dar o seu contributo à selecção. É claro que trabalho todos os dias para representar o meu clube e, se a oportunidade de vestir a camisola do meu país surgir, vou agarrá-la com toda a força. Mas sendo um sonho não é uma obsessão!”, garante o central, que já foi internacional Sub-20 com a camisola canarinha.
O Mundial de 2014, que vai ser jogado no Brasil, é, assim, um objectivo ainda distante e, para já, David Luiz tem outras prioridades. Dar seguimento à excelente época que o Benfica tem vindo a realizar, uma vez que o clube da Águia está na luta pela conquista de três competições: campeonato português, Taça da Liga e UEFA Europa League.
“Temos de fazer o máximo por conquistar esses três objectivos. Se vai ser difícil conquistar os três? Seguramente que sim, mas temos o dever de dar o nosso melhor”, destaca o central, perfeitamente consciente que os adeptos encarnados estão ávidos por uma grande festa: “Se tivesse de escolher apenas um objectivo, centrava-me na conquista do campeonato. Acho que é uma alegria que estamos a dever aos nossos adeptos”.
A idade pouco importa. Aos 22 anos, David Luiz demonstra uma maturidade bem acima da média e muita classe em todas as acções de jogo. É defesa central, mas empolga os adeptos cada vez que sobe no terreno com a bola controlada, já jogou a lateral esquerdo mas, se for preciso, está disposto a actuar como guarda-redes ou ponta-de-lança para ajudar a equipa. Sempre com a vitória em mente, o sucesso que tem tido no Benfica não é muito difícil de explicar.
“Não há muitos segredos, apenas temos que respeitar o público e a instituição que representamos para merecer vestir a camisola do Benfica. A idade representa pouco. Podemos ser jovens aos 34 e maduros aos 20. Na minha idade, julgo que cheguei a um bom compromisso. Amadureci muito desde que cheguei à Europa, gosto do que faço e tenho um tremendo respeito pelos sócios e adeptos que nos apoiam a cada fim de semana no estádio”, revela David Luiz ao FIFA.com.
O brasileiro gosta de assumir a responsabilidade. Pelo tal “respeito aos adeptos e ao clube”, pela consciência que é preciso devolver, dentro de campo, o apoio que sente por parte das bancadas do Estádio da Luz. “Um jogador tem de saber que os adeptos devem ‘cobrar’ e que tem de dar tudo o que está ao seu alcance. Sempre”, destaca o atleta que, também por isso, está disposto a todos os sacrifícios para fazer aquilo de que gosta: “A partir daí, então, podemos falar das capacidades individuais. Sou central, é nesse posto que me sinto mais à vontade, mas se for necessário jogo na baliza ou a avançado! Tenho de dar graças de ter o privilégio de fazer aquilo que amo”, afirma.
Futuro a verde e amarelo
Esta época, David Luiz só falhou jogos por castigo ou por lesão. É um indiscutível no centro da defesa, onde faz dupla com o compatriota e internacional brasileiro Luisão. Apesar de ter saído do Brasil muito novo, tem a consciência que as suas exibições não passam despercebidas no outro lado do Oceano Atlântico, como ponto de partida para um sonho que ainda não se tornou numa obsessão. “Os responsáveis da selecção brasileira estão atentos ao trabalho de muitos jogadores que jogam fora do Brasil”, começa por dizer o defensor.
“Representar a selecção brasileira é algo que qualquer jogador deseja. Mas temos de saber que há muitos e bons jogadores para dar o seu contributo à selecção. É claro que trabalho todos os dias para representar o meu clube e, se a oportunidade de vestir a camisola do meu país surgir, vou agarrá-la com toda a força. Mas sendo um sonho não é uma obsessão!”, garante o central, que já foi internacional Sub-20 com a camisola canarinha.
O Mundial de 2014, que vai ser jogado no Brasil, é, assim, um objectivo ainda distante e, para já, David Luiz tem outras prioridades. Dar seguimento à excelente época que o Benfica tem vindo a realizar, uma vez que o clube da Águia está na luta pela conquista de três competições: campeonato português, Taça da Liga e UEFA Europa League.
“Temos de fazer o máximo por conquistar esses três objectivos. Se vai ser difícil conquistar os três? Seguramente que sim, mas temos o dever de dar o nosso melhor”, destaca o central, perfeitamente consciente que os adeptos encarnados estão ávidos por uma grande festa: “Se tivesse de escolher apenas um objectivo, centrava-me na conquista do campeonato. Acho que é uma alegria que estamos a dever aos nossos adeptos”.
Artigo de Opinião de Leonor Pinhão
Agarrados à borboleta
Começaram no último fim-de-semana os Jogos Olímpicos de Inverno, na cidade de Vancouver, na costa leste do Canadá.
E perguntarão vocês, caros leitores portugueses, a que propósito é que, nesta altura do campeonato, nos vêm falar dos Jogos Olímpicos de Inverno? O que é que nos pode interessar o esqui alpino, o bobsleigh ou a patinagem em velocidade? O que é que nós, pessoal mais dado à bola, temos a ver com isso?
Por mais surpreendente que possa parecer, a resposta é que sim, que temos muito a ver com isso, como não poderão, certamente, deixar de concordar.
Conhecem, porventura, aquela máxima da Teoria Matemática do Caos: «sempre que uma borboleta bate as asas em Pequim pode vir a provocar um tufão na Califórnia.» Se não conhecem, passam a conhecer. Trata-se de um conceito aplicável às ciências exactas e pretende demonstrar que um acontecimento inócuo, como o bater de asas de uma borboleta, ocorrido numa parte do mundo pode influenciar o curso natural das coisas e provocar um importante acontecimento meteorológico do outro lado do mundo.
Foi justamente o que aconteceu com Carlos Carvalhal e com os tão longínquos Jogos Olímpicos de Inverno, em Vancouver, no Canadá.
Na noite de terça-feira da semana passada, assim que terminou o Sporting-Benfica a contar para a Taça da Liga, o treinador do Sporting deslocou-se à sala de imprensa e, durante quatro minutos, perante o pasmo geral, expôs a sua teoria comparativa entre o momento do futebol do Sporting e o clima do Canadá, socorrendo-se de imagens técnicas ilustrativas como «as experiências com balões meteorológicos», «homens com espingardas aos tiros nos balões» e agricultores desesperados com «grandes tempestades» não anunciadas.
A este bater de asas em Lisboa, um pequeno fenómeno para quem teve oportunidade de acompanhar, respondeu, do outro lado do mundo, o citado Canadá, mais propriamente a cidade de Vancouver que, de repente, se viu a braços com uma imprevista crise meteorológica que quase pôs em perigo a realização dos Jogos Olímpicos.
De acordo com a Teoria do Caos, bastou que Carlos Carvalhal, a tantos e tantos milhares de quilómetros, abordasse ligeiramente o tema do inóspito clima canadense para que as estações meteorológicas locais registassem, pela primeira vez em um século, uma média de temperaturas positivas no mês de Fevereiro em Vancouver, obrigando a organização dos Jogos a injectar água nas pistas de gelo, que estavam estaladiças, e a mandar vir das terras altas, a duzentos quilómetros de distância, camiões e camiões com a neve que faltava para que os esquiadores tivessem com que olimpicamente se ocupar.
É esta a prova que quando uma borboleta bate as asas em Pequim pode acontecer um imprevisto climático nos antípodas. Felizmente que as minudências falantes do futebol português não têm grande impacto no mundo sofisticado do desporto, porque, de outra maneira, teríamos agora o Comité Olímpico Internacional e as autoridades canadianas a mover uma aturada perseguição a Carlos Carvalhal, em particular, e ao nosso país, em geral, acusando-o a ele e a nós de termos posto em causa a realização dos Jogos.
No entanto, para a Teoria Matemática do Caos se afirmar na sua plenitude não são precisos milhares e milhares de quilómetros entre a causa e o efeito, não é preciso, de modo nenhum, ir até ao outro lado do mundo para registar as consequência. Na verdade, bastam no mínimo 4 quilómetros, a distância de Alvalade à Luz e, no máximo, 300 e poucos quilómetros, a distância da Luz ao Dragão, para se observar fenómenos idênticos ou, pelo menos, parecidos.
Vejam só como os nossos amigos do Sporting e do FC Porto têm andado, nos últimos tempos, tão agarrados à borboleta, a ver se, do mal o menos, a coisa resulta.
Da estação meteorológica de Alvalade, por exemplo, repetem-se as juras de amor ao Sporting de Braga como legítimo campeão do campeonato sem túneis. O movimento começou em surdina pelos adeptos do clube mas agora o próprio presidente, José Eduardo Bettencourt, já veio clamar publicamente que «gostava que o Braga fosse campeão». É um bater de asas legítimo, sem dúvida, mas profundamente melancólico.
Da estação meteorológica do tetracampeão, o furor tem sido mais intenso, ainda que o FC Porto esteja mais distante do Sporting de Braga do que do Benfica.
Na noite de sábado passado, depois de ter empatado sem golos com o Leixões, em Matosinhos, num jogo que antes considerou ser «determinante» para as «ambições» do emblema que defende, Jesualdo Ferreira, que tem como próximo adversário o Sporting de Braga, entendeu que o melhor que tinha a fazer era juntar portistas e bracarenses no grande saco das vítimas da arbitragem nacional na corrente época.
E, para provar o que lhe é mais conveniente, juntou às suas queixas contra a arbitragem do Leixões-FC Porto as queixas do Sporting de Braga contra o mesmo árbitro, na jornada anterior. «Recordo que este foi o mesmo árbitro que, na semana passada, marcou uma grande penalidade contra o Sporting de Braga e que lhes expulsou um jogador, Moisés, no jogo com o Beleneneses», disse o professor, para quem a possibilidade de ficar a 11 pontos do Sporting de Braga já no próximo domingo não passa de um bater de asas de uma borboleta desde que o Benfica não seja, no final da época, campeão, isto é, desde que não haja tufão em Maio.
Naturalmente, o Sporting de Braga está a gerir em seu favor este apoio moral dos adversários directos e históricos do Benfica. Aliás não há nada de ilegal ou de pecaminoso nos apoios morais. Quanto aos apoios imorais, já é outra história.
E, nesse capítulo, é, jornada a jornada, a própria história que tem vindo a absolver o Benfica das culpas ressabiadas que lhe deitam esta época, em que tem jogado um bocado melhor do que nas anteriores, de manobrar nos bastidores obscuros dos túneis e das arbitragens a troco de favores em fruta, galões claros e escuros e outros populares e imortais géneros de mercearia distribuídos, a granel, por stewards cujo fanatismo os leva à auto-mutilação e por árbitros e observadores que construíram todas as suas longas carreiras a fazer fretes ao Benfica, como tem vindo a ser provado nos tribunais.
O próprio presidente do Sporting de Braga que, pelos vistos, é apenas o segundo ou o terceiro cidadão português mais interessado em que o seu clube seja campeão, também se tem esmerado em porfiar na Teoria do Caos. E, através de comunicados sucessivos, tem vindo a cumprir com o respectivo bater de asas da borboleta, a ver no que dá. No seu último apelo electrónico aos portistas, aos sportinguistas e aos bracarenses, António Salvador insurgiu-se contra «os bastidores» que pretendem afastar o Sporting de Braga do título «com manobras fora das quatro linhas».
Foi em cheio. Uma borboleta bateu as asas no site oficial do clube da Cidade dos Arcebispos e 48 horas depois o Braga ganhava um jogo, ao Marítimo, com uma bola cruzada fora das quatro linhas. São coisas que acontecem, pois com certeza. O papa e os arcebispos ficaram todos calados. E os sacristãos deram a bênção ao lance.
A bem do futebol português, agarram-se à borboleta.
Começaram no último fim-de-semana os Jogos Olímpicos de Inverno, na cidade de Vancouver, na costa leste do Canadá.
E perguntarão vocês, caros leitores portugueses, a que propósito é que, nesta altura do campeonato, nos vêm falar dos Jogos Olímpicos de Inverno? O que é que nos pode interessar o esqui alpino, o bobsleigh ou a patinagem em velocidade? O que é que nós, pessoal mais dado à bola, temos a ver com isso?
Por mais surpreendente que possa parecer, a resposta é que sim, que temos muito a ver com isso, como não poderão, certamente, deixar de concordar.
Conhecem, porventura, aquela máxima da Teoria Matemática do Caos: «sempre que uma borboleta bate as asas em Pequim pode vir a provocar um tufão na Califórnia.» Se não conhecem, passam a conhecer. Trata-se de um conceito aplicável às ciências exactas e pretende demonstrar que um acontecimento inócuo, como o bater de asas de uma borboleta, ocorrido numa parte do mundo pode influenciar o curso natural das coisas e provocar um importante acontecimento meteorológico do outro lado do mundo.
Foi justamente o que aconteceu com Carlos Carvalhal e com os tão longínquos Jogos Olímpicos de Inverno, em Vancouver, no Canadá.
Na noite de terça-feira da semana passada, assim que terminou o Sporting-Benfica a contar para a Taça da Liga, o treinador do Sporting deslocou-se à sala de imprensa e, durante quatro minutos, perante o pasmo geral, expôs a sua teoria comparativa entre o momento do futebol do Sporting e o clima do Canadá, socorrendo-se de imagens técnicas ilustrativas como «as experiências com balões meteorológicos», «homens com espingardas aos tiros nos balões» e agricultores desesperados com «grandes tempestades» não anunciadas.
A este bater de asas em Lisboa, um pequeno fenómeno para quem teve oportunidade de acompanhar, respondeu, do outro lado do mundo, o citado Canadá, mais propriamente a cidade de Vancouver que, de repente, se viu a braços com uma imprevista crise meteorológica que quase pôs em perigo a realização dos Jogos Olímpicos.
De acordo com a Teoria do Caos, bastou que Carlos Carvalhal, a tantos e tantos milhares de quilómetros, abordasse ligeiramente o tema do inóspito clima canadense para que as estações meteorológicas locais registassem, pela primeira vez em um século, uma média de temperaturas positivas no mês de Fevereiro em Vancouver, obrigando a organização dos Jogos a injectar água nas pistas de gelo, que estavam estaladiças, e a mandar vir das terras altas, a duzentos quilómetros de distância, camiões e camiões com a neve que faltava para que os esquiadores tivessem com que olimpicamente se ocupar.
É esta a prova que quando uma borboleta bate as asas em Pequim pode acontecer um imprevisto climático nos antípodas. Felizmente que as minudências falantes do futebol português não têm grande impacto no mundo sofisticado do desporto, porque, de outra maneira, teríamos agora o Comité Olímpico Internacional e as autoridades canadianas a mover uma aturada perseguição a Carlos Carvalhal, em particular, e ao nosso país, em geral, acusando-o a ele e a nós de termos posto em causa a realização dos Jogos.
No entanto, para a Teoria Matemática do Caos se afirmar na sua plenitude não são precisos milhares e milhares de quilómetros entre a causa e o efeito, não é preciso, de modo nenhum, ir até ao outro lado do mundo para registar as consequência. Na verdade, bastam no mínimo 4 quilómetros, a distância de Alvalade à Luz e, no máximo, 300 e poucos quilómetros, a distância da Luz ao Dragão, para se observar fenómenos idênticos ou, pelo menos, parecidos.
Vejam só como os nossos amigos do Sporting e do FC Porto têm andado, nos últimos tempos, tão agarrados à borboleta, a ver se, do mal o menos, a coisa resulta.
Da estação meteorológica de Alvalade, por exemplo, repetem-se as juras de amor ao Sporting de Braga como legítimo campeão do campeonato sem túneis. O movimento começou em surdina pelos adeptos do clube mas agora o próprio presidente, José Eduardo Bettencourt, já veio clamar publicamente que «gostava que o Braga fosse campeão». É um bater de asas legítimo, sem dúvida, mas profundamente melancólico.
Da estação meteorológica do tetracampeão, o furor tem sido mais intenso, ainda que o FC Porto esteja mais distante do Sporting de Braga do que do Benfica.
Na noite de sábado passado, depois de ter empatado sem golos com o Leixões, em Matosinhos, num jogo que antes considerou ser «determinante» para as «ambições» do emblema que defende, Jesualdo Ferreira, que tem como próximo adversário o Sporting de Braga, entendeu que o melhor que tinha a fazer era juntar portistas e bracarenses no grande saco das vítimas da arbitragem nacional na corrente época.
E, para provar o que lhe é mais conveniente, juntou às suas queixas contra a arbitragem do Leixões-FC Porto as queixas do Sporting de Braga contra o mesmo árbitro, na jornada anterior. «Recordo que este foi o mesmo árbitro que, na semana passada, marcou uma grande penalidade contra o Sporting de Braga e que lhes expulsou um jogador, Moisés, no jogo com o Beleneneses», disse o professor, para quem a possibilidade de ficar a 11 pontos do Sporting de Braga já no próximo domingo não passa de um bater de asas de uma borboleta desde que o Benfica não seja, no final da época, campeão, isto é, desde que não haja tufão em Maio.
Naturalmente, o Sporting de Braga está a gerir em seu favor este apoio moral dos adversários directos e históricos do Benfica. Aliás não há nada de ilegal ou de pecaminoso nos apoios morais. Quanto aos apoios imorais, já é outra história.
E, nesse capítulo, é, jornada a jornada, a própria história que tem vindo a absolver o Benfica das culpas ressabiadas que lhe deitam esta época, em que tem jogado um bocado melhor do que nas anteriores, de manobrar nos bastidores obscuros dos túneis e das arbitragens a troco de favores em fruta, galões claros e escuros e outros populares e imortais géneros de mercearia distribuídos, a granel, por stewards cujo fanatismo os leva à auto-mutilação e por árbitros e observadores que construíram todas as suas longas carreiras a fazer fretes ao Benfica, como tem vindo a ser provado nos tribunais.
O próprio presidente do Sporting de Braga que, pelos vistos, é apenas o segundo ou o terceiro cidadão português mais interessado em que o seu clube seja campeão, também se tem esmerado em porfiar na Teoria do Caos. E, através de comunicados sucessivos, tem vindo a cumprir com o respectivo bater de asas da borboleta, a ver no que dá. No seu último apelo electrónico aos portistas, aos sportinguistas e aos bracarenses, António Salvador insurgiu-se contra «os bastidores» que pretendem afastar o Sporting de Braga do título «com manobras fora das quatro linhas».
Foi em cheio. Uma borboleta bateu as asas no site oficial do clube da Cidade dos Arcebispos e 48 horas depois o Braga ganhava um jogo, ao Marítimo, com uma bola cruzada fora das quatro linhas. São coisas que acontecem, pois com certeza. O papa e os arcebispos ficaram todos calados. E os sacristãos deram a bênção ao lance.
A bem do futebol português, agarram-se à borboleta.
quarta-feira, fevereiro 17, 2010
terça-feira, fevereiro 16, 2010
segunda-feira, fevereiro 15, 2010
Memorial Zandinga
Bayern Munich vrs. Fiorentina
Lyon vrs. Real Madrid
FC Porto vrs. Arsenal
Milan vrs. Man. United
Hertha vrs. SLBenfica
Everton vrs. Sporting
Lyon vrs. Real Madrid
FC Porto vrs. Arsenal
Milan vrs. Man. United
Hertha vrs. SLBenfica
Everton vrs. Sporting
Espaço Prof. Karamba - Classificação Geral
1º Lugar: Vermelho Sempre - 475 pontos
2º Lugar: Jimmy Jump - 470 pontos
3º Lugar: Kaiserlicheagle, Vermelho e JC - 415 pontos
4º Lugar: J. Lobo - 405 pontos
5º Lugar: Fura-Redes - 370 pontos
6º Lugar: Samsalameh - 365 pontos
7º Lugar: Sócio - 345 pontos
8º Lugar: Gui - 315 pontos
9º Lugar. Cuto - 275 pontos
10º Lugar: Chico - 245 pontos
11º Lugar: Vermelho Nunca - 225 pontos
12º Lugar: Agarredinhos e Filipe - 70 pontos
13º Lugar: Luís Rosário - 55 pontos
14º Lugar: Lion Heart - 50 pontos
15º Lugar: Pachulico - 35 pontos
2º Lugar: Jimmy Jump - 470 pontos
3º Lugar: Kaiserlicheagle, Vermelho e JC - 415 pontos
4º Lugar: J. Lobo - 405 pontos
5º Lugar: Fura-Redes - 370 pontos
6º Lugar: Samsalameh - 365 pontos
7º Lugar: Sócio - 345 pontos
8º Lugar: Gui - 315 pontos
9º Lugar. Cuto - 275 pontos
10º Lugar: Chico - 245 pontos
11º Lugar: Vermelho Nunca - 225 pontos
12º Lugar: Agarredinhos e Filipe - 70 pontos
13º Lugar: Luís Rosário - 55 pontos
14º Lugar: Lion Heart - 50 pontos
15º Lugar: Pachulico - 35 pontos
domingo, fevereiro 14, 2010
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