Quando o Benfica apareceu na primeira linha dos apoiantes do novo presidente da Liga, um ex-vice-presidente fundamental nos anos de sucesso desportivo e crescimento social do FC Porto, houve duas leituras díspares e grande perplexidade pela incoerência. Uns consideraram, com estupefação, um erro estratégico histórico, por tornar a águia refém para sempre do dragão predador. Outros acharam, em surdina, que a confiança inerente à conquista do título permitia ao Benfica arvorar-se em fautor da reconciliação nacional.
Todavia, como se depreende da algazarra profissional que anima as televisões a que o insuspeito Artur Agostinho chamou de “pirómanos” – ontem, neste espaço, cometendo um crime pela jurisprudência dos tribunais cíveis do Porto –, a bipolarização nunca esteve tão acesa. Tão perigosamente acesa.
De um lado, resguardando de confrontos menores o presidente peso-pesado, na linha do que já acontecera com o técnico dos anos apertados do Apito Dourado, é um treinador de cartão e cachecol que aguenta o primeiro embate, criando lastro para a entrada em cena, em momento mais oportuno, do último chefe do atual presidente da Liga e declarado inimigo dos “caceteiros”. Do outro, é a própria nomenclatura a envolver-se, com generais e almirantes precipitados em cavaqueiras de sargentos e praças, exteriorizando má avaliação da frente de batalha.
Ocaso do boicote aos jogos fora de casa é paradigmático. Nunca uma diretiva terá sido recebida pelos adeptos com tanto desdém como esta absurda intenção de pressionar outros clubes a desalinharem-se do pretenso “pacto” com o “atual estado do futebol português”, castigando-os onde mais dói.
Sem ter tido o cuidado de identificar claramente que pretendia isolar o FC Porto, enquanto espécie de “eixo do Mal”, e sem ter contado espingardas antes de tomar uma decisão impopular, o Benfica veio depois aumentar a confusão requisitando milhares de bilhetes para o clássico do Dragão, com a alegação de com isso apenas querer dar uma resposta à letra ao porta-voz designado, o perigosíssimo André Villas-Boas.
Atrapalhados pela inesperada derrapagem da equipa de futebol, única face benfiquista que recentemente, por escassas semanas, respirou os ares do poder, os gabinetes de estratégia e de comunicação da Luz e seus assessores externos sofreram uma crise de ideias e arriscam despertar a animosidade dos clubes pequenos, que nada têm a ver com esta guerra, a começar pelo Portimonense, e terminarem como na fábula do caçador caçado.
Ao menos, o silêncio perturbador do atual presidente da Liga, em linha com o de Pinto da Costa, relativamente à escalada de violência verbal e à iminência de uma guerra urbana, ajudará o Benfica a subentender o posicionamento, sem ambiguidades, do FC Porto e seus aliados quanto à candidatura de um benfiquista à presidência seja do que for. Contra!
Pretendendo ser visto e seguido como um líder esclarecido, fiável e aglutinador, o Benfica segue em ziguezague sem respostas coerentes para tantas frentes de combate, à medida que se aproxima o momento de revalidar os contratos televisivos com os parceiros de sempre – provavelmente a próxima “desilusão” no horizonte encarnado.
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