terça-feira, janeiro 31, 2006

As finanças dos clubes portugueses

Não é que não tenha já escrito algo sobre o tema, mas os recentes desenvolvimentos em clubes de primeiro plano no futebol nacional impõem mais alguma reflexão.
Na verdade, veio à estampa que o actual e putativo futuro presidente do SCP alicerça o seu plano de saneamento financeiro da SAD de Alvalade, entre outras medidas, na alienação dos edifícios "Alvaláxia" e "Visconde de Alvalade".
É difícl compreender como um clube que, desde que José Roquette assumiu a sua presidência, apreguou um discurso de rigor financeiro extremo passa por uma descapitalização tal que o "obriga" a vender duas infra-estruturas recentemente erigidas.
Onde está o project-finance de tais investimentos? existiu? foi incumprido? por que motivo?
O SCP, de Roquette a Dias da Cunha, sempre afirmou que os investimentos desportivos que realizava se enquadravam em estritas limitações orçamentais que urgia cumprir, sob pena de falência financeira da SAD.
Volvidas que estão todas essas presidências, cujo discurso norteador de rigor impôs a saída e o não regresso de alguns profissionais de futebol que hoje fazem as delícias dos rivais, Simão e Quaresma, constata-se que a situação das contas leoninas não se mostra famosa, para não adjectivar de forma mais contundente.
As receitas da SAD do SCP são assim tão diminutas que, ainda que tenha existido rigor na gestão, a situação financeira atingiu o depauperado nível que se anuncia?
Convém não olvidar que o SCP realizou, nos últimos exercícios, receitas extraordinárias avultadas provenientes das vendas dos passes de Ronaldo e Quaresma, por exemplo.
Convém não esquecer que a administração da SAD criou um tecto salarial para os vencimentos a auferir pelos jogadores, o qual abriu a porta de saída aos jogadores mais antigos do plantel, reduzindo-se, deste modo, o peso das remunerações no orçamento.
Convém não ignorar que os investimentos nas aquisições de jogadores foram de reduzida monta, sendo o caso de Deivid a excepção que confirma a regra (ainda que os 3 milhões de Euros gastos na compra do seu passe nem se possam considerar relevantes no quadro dos principais clubes europeus).
Assim, constata-se que, aparentemente, se reduziu o nível da despesa e se aumentaram as receitas.
Terão os investimentos na construção do estádio e infra-estruturas adjacentes, bem como na academia atingido montantes assim tão consideráveis que arruinaram as finanças do clube?
Se sim faltou visão estratégica, se não difícil permanece alcançar as razões do descalabro financeiro.
Terão as remunerações de gestores, consultores e afins atingido quantitativos tais que sorveram as receitas obtidas?
Não creio.
Terão as receitas ordinárias descido vertiginosamente, retirando liquidez à SAD e empurrando-a para o recurso sucessivo e massivo à Banca?
Penso que aqui reside o busílis da questão, não só do problema do Sporting, como de outros clubes, como da sociedade portuguesa em geral.
A falta de liquidez, ainda mais do que o decréscimo do volume dos proventos auferidos pelos clubes, constitui o maior dos problemas financeiros da bola lusa.
Existindo compromissos de vencimento fixo mensal e não existindo, concomitante, entrada de fluxos de capitais com igual periodicidade, a sua solvência depende do recurso à banca.
Ou se cai no flagelo dos salários em atraso, com os consequentes perigos de rescisão dos contratos de trabalho, ou se recorre, quem pode, à banca.
O endividamento bancário atingiu dimensão tal que se entrou num ciclo vicioso - negoceiam-se as obrigações de curto e médio prazo, protelando o seu pagamento, através da subscrição de novos empréstimos mais dilatados no tempo, mas, claro está, com condições menos vantajosas, mormente juros mais elevados.
Neste quadro a cada momento surgem novos balões de oxigénio que permitem assegurar, no imediato, os compromissos estabelecidos, hipotecando-se o futuro.
Então, procuram-se receitas extraordinárias que possibilitem amortizar parte dos empréstimos contraídos para, desta forma, aliviar a pressão dos juros que se vencem (pois o capital, na esmagadora maioria das situações, permanece por solver).
Penso que as alienações prometidas por Soares Franco visam, exactamente, este propósito.
Este não é um problema singular, mas sim colectivo.
Todos os clubes portugueses, sem excepção, padecem deste mal.
Se hoje encaro o problema do ponto de vista do SCP, apenas se deve à maior visibilidade que foi dada à questão no seio daquela agremiação desportiva.
Nota final, para referir que os problemas de liquidez das sociedades anónimas deportivas portuguesas se vão acentuar e muito este ano, dado que, fruto da realização do Mundial de Futebol, os clubes irão ficar privados de receitas no período de tempo compreendido entre Maio e Agosto.
Penso que a anunciada reestruturação dos quadros competitivos se irá processar por via económico-financeira e não administrativa.
Quantos clubes irão sobreviver? e por quanto tempo?

1 comentário:

Vermelho disse...

Conforme, expressamente, referi no texto ao qual estes comentários respeitam, a situação do SCP apenas serve de mote à análise, sendo que idênticos problemas são vivenciados pelos restantes clubes portugueses. E, claro está, o SLB não foge à regra.
Posso ser ferrenho, até faccioso, mas nunca branquearei seja o que for em nome da minha paixão clubística.
Aliás, como bem sabe o meu amigo Zex, nunca fui apoiante do Dr. Vale e Azevedo, tendo sido um acérrimo crítico da sua gestão.