Toni embarcou ontem para a África do Sul, onde vai trabalhar para a Costa do Marfim, integrado na equipa técnica chefiada por Eriksson, na qualidade de “observador dos adversários”. Na prática, o antigo adjunto do treinador sueco no Benfica vai fornecer informação qualificada sobre o modo de jogar da Seleção portuguesa. E daí? Qual é o problema, se é que há problema? Na verdade, entre o Portugal que vende modernidade, não existe qualquer problema em ter um nacional (não confundir com nacionalista) a trabalhar para o adversário (não confundir com o inimigo). Questionado sobre o assunto, o próprio selecionador Carlos Queiroz não deixou dúvidas: “Trata-se de um profissional a desempenhar as suas funções. Quem sou eu para comentar isso, que já trabalhei para três seleções – Estados Unidos, Emirados Árabes Unidos e África do Sul?” Que mais poderia ter respondido um homem do seu tempo?
De resto, Portugal não teve complexos quando se tratou de buscar competência e, na ausência de um “playmaker”, naturalizou Deco; atrapalhado com a falta de centrais (duvidosa necessidade de Scolari) incorporou Pepe e, finalmente, face à secular crise de pontas de lança estendeu a passadeira vermelha a Liedson, que não foi mal agradecido e marcou 1 golo providencial na Dinamarca, fundamental para manter a Seleção nos carris do apuramento.
Este pormenor, este facto, este não-se-sabe-bem-o-quê só ganha relevo na exata medida em que foi exposto na arena pública com um cheiro bafiento ao antigamente, com Toni a ser embrulhado na personagem do “traidor à Pátria”. Até depois do jogo com a Costa do Marfim, o treinador que também já trabalhou na Seleção Nacional está condenado a ir esturricando naquele lume brando caraterístico da inveja nacional.
Mas há mais. Para a peça estar completa falta perceber por que é que foram os serviços profissionais de uma agência de comunicação a passar para alguns jornalistas a informação de que Toni estava a trabalhar para a Costa do Marfim, como se fosse um perigoso infiltrado, um agente a soldo do inimigo.
Sabe-se agora que durante algumas semanas essa informação foi trabalhada de modo a garantir que a Seleção portuguesa precisava de criar defesas que a salvaguardassem de mais um perigoso obstáculo, precisamente o Toni que passava informações. Até Carlos Queiroz ter posto um ponto final na conspiração, respondendo da única maneira que era possível.
De resto, viu-se ontem, no jogo com Moçambique, que Portugal não precisa de mobilização proporcionada por parvoíces laterais para se opor aos seus adversários mundialistas. Basta à Seleção Nacional convencer-se de que na África do Sul só vencerá o bom futebol e nunca o futebol dos complexos que tenta beliscar um dos seus como fosse criminoso. Basta à Seleção Nacional meter um bocadinho mais de velocidade e não ficar à espera que o adversário possa controlar o jogo.
Só quem não percebe os tempos que vivemos, de profunda crise, de desemprego acentuado, de nível de vida em decréscimo, pode criticar um dos seus por ter ido tratar da vidinha no estrangeiro, como aconteceu no passado, quando não havia esperança em Portugal e não havia luz, mas apenas trevas e pouca gente a querer enganar muita gente. Para esse país já muita gente deu. Passou.
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